Luanda - Acompanhei com bastante preocupação as manifestações jubilosas e o atiçar dos ânimos resultantes do anúncio feito pelo General João Lourenço, Presidente da República e do MPLA, sobre a sua deslocação à província do Kuando Kubango, vulgarmente conhecida como “terra do progresso”, uma denominação falaciosa e grosseira que em nada conjuga com a realidade daquela província que mais ronda a terras do fim do Mundo e da maldição fruto de uma governação imposta há 46 anos que trata alguns como filhos e outros como enteados, alguns como angolanos de primeira e de gema e outros de segunda.

Fonte: Club-k.net

O tratamento do Nganguela pela superestrutura do país é deplorável, fruto do esquecimento e do ostracismo a que tem sido relegado durante quinquênio de sucessivos mandatos apenas lembrado em vésperas de campanha eleitoral.

Muito antes do ano 1975 este povo juntou-se à luta pela independência deste país, isto é, filhos deste grande grupo cultural, ofereceram – se ao sacrifício para ver salvaguardada a vida e integridade desta Angola. Os Kavumbu, os Cuenha, os Nhemba e outros subgrupos étnicos que formam a família Ngangela no mais lato senso.


António Agostinho Neto reconhecia num dos seus discursos em Maqui, leste do País, a admiração que nutria por este povo e com grande gratidão rendia homenagem aos Ngangela pelo seu carácter fiel à luta de libertação nacional,por nunca trair a revolução independentista que estava em curso, a sua firmeza e coragem bem como seu espírito altruísta e hospitaleiro.


Angola é de todos e é assombroso que o povo do Kuando Kubango desdenhado há décadas tem se mantido na margem da superestrutura do país tão pouco é tido ou achado para participar na condução dos destinos de Angola. É urgente a instauração de um governação híbrida que tenha em conta todos os valorosos filhos desta pátria.


O povo Nganguela tornou-se o grupo etnolinguístico mais atrasado e mais analfabeto do pais e tratado como gente sem capacidade de governar nem o país nem a sua província. É um povo vassalo. Foi assim tratado na era José Eduardo dos Santos e o quadro não conheceu melhorias com a chegada de João Lourenço ao poder.


De 2017 à 2021 este povo nem uma visita presidencial mereceu. João Lourenço nunca se prezou a visitar este povo, pelo menos que fosse por alguns segundos, só para vivenciar a dor, as agruras e o sofrimento deste.

Avizinha-se o termo do seu mandato e o prenúncio das eleições gerais e de forma desavergonhada virou para lá às suas bactérias, pois é a oportunidade certa para a caça de votos sendo ela uma das maiores praças eleitorais do MPLA. Com muitas mentiras à mistura levará o povo ao delírio com seduções baratas a que já estamos acostumados. E os acéfalos ovacionarão de alto e bom tom, incapazes de reivindicar os seus direitos e acorrentados no medo doentio limitar-se-ão ao culto de personalidade do todo poderoso general da nova Angola.

O povo Nganguela, do Kuando Kubango, não deve somente ser tomado como cavalo de batalha tão pouco ser tratado como o cão do caçador que participam da luta e da caça e jamais têm a oportunidade de degustar do fruto do seu labor.

Tenho a plena certeza que o círculo vicioso voltará em Agosto, pois este povo votará e, de seguida, João Lourenço e sua elite fechar-se-ão em copas formando o novo Governo , sem um único Nganguela nem para Ministro nem para Embaixador nem para Governador ou qualquer cargo que valha.

Acompanhamos com muita naturalidade filhos de outras províncias com 5 ou 7 membros no Bureau Político, 2 ou 3 Governadores, 2 ,3,4,5 todos Ministros , filhos da mesma tribo, mas os Nganguela nunca têm este privilégio.

João Lourenço desloca-se para o lançamento da agenda política, depois que decorreram estes 4 anos do seu governo sem nunca lá ter ido para constatar se o povo vive bem ou mal. O Nganguela pode fazer esforço nunca é tido nem achado. É o povo que neste país sofre discriminação a todos os níveis quer seja o político, social, económico e cultural. Portanto, é um povo que deve ser governado e não deve governar.


Kuando Kubango foi das províncias mais assoladas pela fome “relativa”, pela praga de gafanhotos e pela seca. E até ao momento não se conhece um plano emergencial para acudir as populações. De igual modo, não houve uma implementação efectiva do tão propalado PIIM.

Houve um grande retrocesso nos sectores de saúde e educação.


O pólo universitário que devia capacitar mais jovens e gerar quadros diversificados para a província foi abandonado aos escombros e está em degradação tornando-se um esconderijo de meliantes. De igual modo, o Hospital Sanatório de Menongue foi vetado ao abandono, pois as obras estão paralisadas há anos sem qualquer esclarecimento do executivo. A infraestrutura rodoviária e energética é uma verdadeira desgraça. Não há um modelo de desenvolvimento que sirva de orgulho para o seu povo mesmo sendo uma terra potencialmente turística, agrícola e hídrica.

João Lourenço vai espalhar o seu charme e cosmética política, mas a esperança em dias melhores continuará moribunda e o quadro pintado de negro pela governação do MPLA continuará o mesmo.


Está seria a oportunidade soberana de protestar a marginalização e a discriminação do povo, mas assistiremos sem dúvidas o destilar da hipocrisia, da bajulação, do silêncio e do conformismo.

GERALDO GABRIEL DALA
Filósofo, professor e activista