Joanesburgo - Durante a sua conferência de imprensa de ontem, 9 de Junho, o Presidente da República, João Manuel Gonçalves Lourenço, falou sobre o estado da comunicação social no País e sobre a presença de observadores nas eleições gerais de Agosto próximo.

Fonte: Club-k.net

Sobre a comunicação social, o Presidente reconheceu que ainda há aspetos a melhorar, mas afirmou estar orgulhoso da comunicação social que o País tem. A gafe do Presidente reside no facto de a sua avaliação ter sido feita com base nos parâmetros “público” e “privado”, ou seja, houve progressos porque antes só existia a pública, agora já há muitas entidades privadas de comunicação social. Esta avaliação seria válida há 30 anos, quando o Presidente exercia o cargo de secretário do Bureau Político do MPLA para a Informação e Propaganda e controlava diretamente a comunicação social do Estado. Não serve para o Estado democrático de direito, do qual é presidente. O presidente explicou aos angolanos, finalmente, a principal razão porque a democracia está atrasada trinta anos.


Num Estado democrático de direito, o desempenho da comunicação social é avaliado com base nos padrões de liberdade que caracterizam a liberdade de imprensa, a saber: isenção, pluralismo, igualdade, contraditório, imparcialidade, responsabilidade. Ontem, o Presidente não referiu nenhum destes parâmetros. Será que Angola de 2022 é governada por um executivo  não democrata, atrasado no tempo trinta anos?


A segunda gafe tem a ver com a observação eleitoral. O Presidente esqueceu-se, ou não foi informado, que a observação eleitoral não se limita ao acto eleitoral, no dia da eleição. Ela incide sobre o completo ciclo eleitoral, e não apenas sobre o acto eleitoral de 24 de Agosto. A observação pode ser de curto prazo ou de longo prazo. E não se faz às pressas, nem em cima da hora.

 

Em 2015, Angola subscreveu o compromisso internacional de “facilitar a observação de todo o ciclo eleitoral das suas eleições nacionais pelas Missões de Observação de Eleições da SADC, incluindo o envio de Missões de Boa Vontade, de Observadores a Longo Prazo, de Observadores a Curto Prazo, e processos de avaliação pré-eleitoral”. Porém, em 2017, Angola bloqueou a observação de longo prazo que determinadas organizações convidadas pretendiam efectuar. Ao mencionar agora que «a União Europeia não deve ter pressa», o Presidente está a insinuar novamente que Angola não está interessada na observação de longo prazo, que inclui, a observação da “liberdade, igualdade, imparcialidade e justiça” durante os actos de actualização do registo dos eleitores, a observação do comportamento da comunicação social do Estado no período pré eleitoral, a observação dos actos velados de corrupção eleitoral no período pré eleitoral, a observação da gestão do contencioso pré eleitoral pelos órgãos competentes, etc..


A observação eleitoral mais eficaz é a de longo prazo e inclui várias visitas durante o processo de organização das eleições. A avaliação da democraticidade e transparência das eleições já não se faz com base no período eleitoral e muito menos no dia da votação. Avalia-se o processo todo, e não apenas o acto eleitoral. A ênfase já não é no civismo dos eleitores, mas na igualdade de oportunidades, no acesso à informação, no tratamento igual dispensado pela comunicação social pública a todos os candidatos e na igualdade e equidade dos recursos materiais utilizados antes e durante as campanhas eleitorais, abertas ou veladas, formais ou informais. A ênfase é na independência funcional da administração eleitoral em relação ao poder político. Na sua isenção, competência, apartidarismo e profissionalismo.


O comportamento atual da comunicação social pública, que trata de modo claramente desigual e parcial o Partido do governo, não garante a realização de eleições livres e justas, segundo os padrões universais da democracia.


Naturalmente, não são os observadores que garantem a validade da eleição, são os Tribunais. Porém, é o povo soberano que deve estar confiante na integridade da Administração Eleitoral e no seu funcionamento imparcial. Para tal, a Administração eleitoral deve estar acima de suspeita, deve pautar a sua conduta com isenção, imparcialidade, probidade e transparência, prosseguindo sempre o interesse público.


Se o Presidente da República quer mesmo eleições livres e justas, se o Presidente não tem medo da liberdade do povo, se o presidente acredita na democracia e na soberania do povo, então, deve libertar primeiro os órgãos públicos de comunicação social da sua tutela e colocar a TPA e a ZImbo sob tutela de uma entidade reguladora claramente independente aos olhos de todos. Sem isso, as eleições não poderão ser consideradas ainda “livres e justas”.