Luanda - O corpo da mulher está cada vez mais a ser usado em eventos políticos. A sociedade precisa de reflectir sobre a finalidade da objectificação da imagem feminina e os contornos da erotização da política.

Fonte: Club-k.net

Fiquei desgostosa quando há alguns dias assisti (pela televisão e pelas redes sociais) a um evento do partido MPLA, onde, na minha óptica, se fez recurso à objectificação do corpo feminino através do marketing político de bumbuns “jardados”. Na minha opinião, foi uma «cena completamente fora do contexto» e contraditória àquilo que o MPLA tem feito para a promoção da paridade do género, promoção da mulher às estruturas mais altas de direcção no partido e suposta moralização da sociedade.


Na mesma senda, ontem, assisti a outro vídeo onde uma mulher (a princípio com um tipo de roupa descontextualizada) que fazia campanha supostamente para o partido APN. No final do discurso, a mulher virou-se para expor «a parte traseira avantajada».


Deixem-me dizer que, enquanto mulher, não entendi coisa alguma do que ela disse, simplesmente vi o seu corpo (na primeira instância). Eu espero que aquilo seja apenas uma brincadeira de mau gosto de alguém singular, e que não seja promovido pela APN. Caso contrário, eu convidaria o Senhor Quintino Moreira, Presidente da APN, a parar de fazer papel de ridículo e de ridicularizar a figura da mulher. Se almeja ser o mais alto mandatário da Nação, precisa, primariamente, de respeitar o seu potencial eleitorado. Respeitar é também reconhecer que somos seres pensantes e que as mulheres não são apenas corpos sexuais.


Voltando ao MPLA, um partido com uma organização interna forte, coesa, com muitos quadros, mentes pensantes e com muitas mulheres nos cargos de liderança, questiono-me: Por que motivo recorre à coisificação da mulher e à erotização da política? Qual é o objectivo desta palhaçada que atenta à dignidade da mulher? O MPLA tem responsabilidades acrescidas no tratamento digno da imagem da mulher, como pessoa humana, ser pensante, igual em dignidade e capacidade em relação ao homem.


Agora falemos sobre os «bumbuns». Eu não sou contra os «bumbuns jardados ou avantajados», porém é preciso compreender que a parte traseira e inferior da mulher (e quanto mais avantajada for) remete-nos a sensualidade, erotismo, sexualidade e prazer sexual. É senso comum que a parte da mulher que mais cria sentimentos libidinosos para o homem africano (quiçá, a maior parte) é o «bumbum».


Não pretendo posicionar-me como moralista e/ou crítica das mulheres que expõem os seus corpos ou daquelas que recorrem às jardas. Cada um tem o direito de cuidar ou fazer do seu corpo o que melhor entende, desde que não fira o direito dos outros. Algumas mulheres colocam mais ênfase em seus corpos que no intelecto. Respeito tal decisão! Embora eu (mulher) pense que não sou apenas o meu corpo e não gosto que os outros me vejam como «pedaço de carne deliciosa para meter os dentes» e nem aceito que as mulheres sejam comummente vistas como mero objecto de prazer sexual. As outras mulheres não precisam de pensar como eu. Prezo a liberdade do Ser! Entretanto, algumas irmãs angolanas estão a ridicularizar o corpo feminino; precisam de ser aconselhadas e entender que não se pode colocar o «bumbum» no lugar da cabeça. Há contextos em que não se deve exibir a parte traseira e coloca-la em destaque, tal como nos eventos políticos que a todos dizem respeito.

Estamos num momento sério de (pré-)campanha eleitoral para apresentação dos programas de governação daqueles que nos pretendem governar. O contexto é para prestarmos atenção ao que os partidos e líderes partidários têm a oferecer-nos. Não se governa um país através da observação de «bumbuns». São coisas sérias em que devemos utilizar a cabeça, sob pena de escolhermos líderes inconsequentes.


Por outra, os partidos políticos devem ser mais sérios e respeitar os eleitores. Não nos devem tomar como pessoas banais ou mulheres cuja essência está em seus corpos. Os partidos políticos e os seus líderes têm a obrigação de se esforçarem para apresentarem programas e campanhas sérios e demonstrarem que têm competência para governar eficientemente e resolver os problemas da Nação.


Por último, tenhamos mais respeito às mulheres (nossas mães, irmãs, colegas, filhas, companheiras, amigas, etc.). Não somos objectos; somos pessoas humanas, com a nossa sensualidade, todavia também com dignidade e mente pensante. E nós, mulheres, exijamos mais respeito de nós próprias, pois que, se não nos respeitarmos, os homens jamais o farão!


Precisamos de uma sociedade mais exigente para que os nossos líderes políticos nos levem a sério e se esforcem mais. Governar não é um favor! É um privilégio que acarreta grandes responsabilidades. Nós temos a liberdade e a grande responsabilidade de escolher os nossos líderes.

Vânia Frederico
17-06-2022
11:08min