Detalhes:
- N Vieira viajou para Luanda dom, 15.Jun; avião posto à sua disposição por JES; fez-se acompanhar da mulher, Isabel Vieira e de 2 conselheiros, João Cardoso e Manuel Santos; viagem publicamente anunciada.
- Tagme na Wae viajou 6ª f, 13.Jun, via Lisboa; viagem não anunciada previamente; a posteriori apresentada como sendo "de trabalho".
O objectivo principal da iniciativa de JES era o de "criar condições para superar" a contradição que resulta da existência de 2 tipos antagónicos de poder na Guiné-Bissau (AM 272), o poder constituído e o poder paralelo – uma realidade para a qual é remetida a causa chave da instabilidade crónica no país.

O poder paralelo, exercido pelos militares e personificado pelo Gen Tagme Na Wae, sobrepõe-se sistematicamente ao poder político; o espírito de grupo e a coesão que os militares apresentam advêm de práticas de favorecimento étnico que tribalizaram as Forças Armadas (AM 232/266), mas igualmente a administração e sectores da sociedade.
As intrusões dos militares em esferas do poder executivo legal (política, administração, justiça etc.), mas também a sua presumida implicação no narcotráfico, estão a tornar-se numa ameaça para os próprios – por via de um ambiente social cada vez mais adverso, alimentado por um sentimento colectivo de censura.

Tagme Na Wae adoptou ultimamente comportamentos reveladores de cuidados adicionais face a riscos para a sua integridade física (p ex, alterando inopinadamente os locais de pernoita). Sabe-se que quer enveredar por uma nova vida (AM 260), mas evita fazê-lo por temor de vir a sentir-se desprotegido e à mercê de futuros ajustes de contas.
No caso concreto dos sentimentos de insegurança de Tagme Na Wae e dos militares em geral, a moderação de JES contempla promessas e/ou garantias de tranquilidade e conforto futuros, em caso de aposentadoria dos mesmos. O conforto poderia compreender ajudas materiais, a providenciar por Angola.

A retirada dos actuais chefes militares e de parte da cadeia de comando que criaram e mantêm com base em afinidades étnicas (balantas), ocorreria no seguimento de um plano de reestruturação das Forças Armadas – que Angola se presta a apoiar e a acompanhar (inclusivé despachando um contingente para a Guiné-Bissau).

2 . A oportunidade da iniciativa de JES foi determinada pela aproximação da data do congresso do PAIGC, 26/29.Jun, no Gabu. Na perspectiva do coordenador da política do regime de Angola para a Guiné-Bissau, Higino Carneiro, o PAIGC deve reunificar-se e retomar o seu estatuto de partido histórico, contribuindo assim para a estabilidade do país.
Carlos Gomes Jr e Malam Bacai Sanhá são os 2 principais candidatos à direcção do partido. Há outros, menos importantes, entre os quais Cipriano Cassamá, conotado com N Vieira, não se excluindo ainda que actual PM, Martinho Dafa Cabi, possa ainda vir a apresentar-se. A multiplicação de candidatos desfavorece a unidade do partido.

A tendência de Tagme Na Wae e dos chefes militares, quase todos antigos combatentes do PAIGC, é a de apoiar M Bacai Sanha – que lhes inspira menos desconfiança que C Gomes Jr; também tenderiam a apoiar M Dafa Cabi, em razão do aparentamento étnico (balantas) e outros laços.

JES tem tentado persuadir N Vieira (AM 258) a encarar a possibilidade de voltar à presidência do PAIGC. N Vieira reage de forma ambivalente, mas a ideia que prevalece é a de que aceitaria o encargo se pudesse contar com o apoio dos antigos combatentes; a N Vieira não agrada particularmente uma vitória de M Bacai Sanhá.

Em 04.Jun históricos do PAIGC próximos de N Vieira, entre os quais Carlos Correia e Manuel Santos, encontraram-se com C Gomes Jr para uma troca de impressões acerca do actual momento político e sua projecção no congresso do PAIGC. A iniciativa surgiu no quadro de uma aproximação entre C Gomes Jr e N Vieira.

Uma alternativa ao cenário de um regresso de N Vieira à vida partidária (o próprio desabafa que apenas se sente tentado a ser presidente honorário do PAIGC) é a eleição de C Gomes Jr – o qual já garantiu apoio à sua reeleição; as principais reservas à candidatura de C Gomes Jr provêm de Tagme Na Wae e dos chefes militares.

3. A aplicação que o regime de Angola e JES denotam na estabilização da Guiné-Bissau decorre de 2 razões em particular:- É do seu interesse político, em termos de irradiação de prestígio e influências; Angola é vista hoje em dia como principal garante da estabilidade na Guiné-Bissau e JES o promotor de iniciativas nesse sentido.- Defende e acautela volumosos investimentos, USD 500 milhões (AM 231), que um grupo ligado ao regime se propõe fazer no desenvolvimento do projecto do porto de Buba – dimensionado também como pólo regional de influências.

A embaixada de Angola em Bissau acolhe uma "residentura" do SIE (Serviço de Inteligência Externa), chefiada por um Cor, Carlos Costa, cuja função é a de manter a PR a par da situação interna; o embaixador, Brito Sozinho, muito próximo de JES, tem a seu cargo acções de influência.

Fonte: Africa Monitor