Londres - O Governo de João Lourenço corre o risco de sofrer um forte revés no caso dos 500 milhões de dólares transferidos em 2017 pelo BNA, por autorização de José Eduardo dos Santos, e que ditou a abertura de um processo-crime em Luanda contra Valter Filipe, José Filomeno dos Santos e demais réus.

Fonte: Club-k.net

Informações apuradas junto de círculos estrangeiros, e que já estarão a correr nos corredores restritos do Governo, atestam que as autoridades angolanas terão já sido notificadas pelas autoridades judiciais inglesas da reabertura do processo em Londres, por iniciativa de interessados estrangeiros que invocam, entre outros factos, grave violação do acordo de consenso assinado na capital britânica em 2018, que ditou o retorno dos valores a Angola.

Segundo as mesmas informações, as autoridades judiciais inglesas estarão mesmo em vias de dar ordem de congelamento de activos do Estado angolano domiciliados no exterior no valor de 500 milhões de dólares, uma vez que os novos queixosos reclamam indeminizações milionárias. A informação não foi, entretanto, tornada pública oficialmente porque a justiça inglesa terá impedido a sua publicação, numa fase inicial, de modo a evitar-se aproveitamentos políticos por qualquer das partes, uma vez que Angola se encontra em processo eleitoral.

Na fundamentação dos queixosos, conforme apurou o Club-K, o Governo angolano estará a ser acusado de violar o acordo de consenso que encerrava completamente o processo em Londres e que não permitia a exigência de indemnizações nem a abertura de processos-crimes contra qualquer das partes.

Entretanto, como é sabido, após a assinatura do acordo em Londres e ver os dinheiros desbloqueados, o Governo angolano decidiu continuar com o processo em Portugal e em Angola, acusando os cidadãos evolvidos na operação, que acabaram condenados em primeira-instância no Tribunal Supremo, estando a aguardar agora a decisão do Tribunal Constitucional para onde os réus recorreram. Além da condenação a vários anos de cadeia, o Tribunal Supremo exigiu também indemnizações milionárias aos réus.

Os estrangeiros lembram ter ficado provado em Londres que não havia qualquer intenção de se desviarem os valores, de tal modo que as autoridades britânicas desistiram de qualquer processo-crime, tendo exigido apenas a assinatura de um acordo entre todas as partes para que os dinheiros regressassem. Os mesmos recordam que a decisão da justiça britânica em descongelar os 500 milhões em 2018 deveu-se ao facto de ter ficado provado em Londres que o congelamento tinha sido motivado por erros do próprio Banco Nacional de Angola na comunicação com a UIF e esta com a sua congênere inglesa. Por outro lado, a justiça britânica havia recebido a confirmação das próprias autoridades angolanas de que os 500 milhões de dólares tinham sido transferidos com base em contratos para um fim específico e com autorizações das entidades competentes.

Os novos queixosos querem provar agora que o Governo de João Lourenço mentiu em várias ocasiões e violou propositadamente o acordo de consenso por motivações políticas, com o objectivo de dar credibilidade a sua agenda de combate à corrupção, tendo em conta a importância dos angolanos que faziam parte do processo. Os estrangeiros terão mesmo reunido um manancial substantivo de provas que terão convencido as autoridades britânicas a ordenar o congelamento de activos do Estado angolano no estrangeiro, equivalentes a 500 milhões de dólares, além de admitirem uma recomendação para o envio do processo ao Tribunal dos Direitos Humanos, sobretudo, pela forma como o processo prosseguiu em Angola e pela relação deste com o novo processo agora reaberto em Londres. Entre as provas recolhidas pelos queixosos constam também diligências dos serviços secretos angolanos, incluindo garantias que foram dadas aos estrangeiros de que o encerramento do processo em Londres dependia da realização do congresso do MPLA em 2018, em que ocorreu a passagem do testemunho na liderança do partido.

Recorde-se que José Eduardo dos Santos, além de ter garantido que João Lourenço estava informado da operação, confirmou ao Tribunal Supremo ter autorizado a transferência dos 500 milhões de dólares, no quadro de uma operação que considerava essencial para o actual Governo. Entre as mentiras apontadas pelos queixosos está o facto de o então ministro das Finanças, Archer Mangueira, ter afirmado em Londres que a operação nunca tinha sido aprovada pelo titular do poder executivo.


Ao Tribunal Supremo, o ex-Presidente garantiu, no entanto, ter autorizado Valter Filipe a assinar os dois contratos que visavam a constituição de um Fundo Estratégico com vista a angariação de recursos financeiros que permitiram o fortalecimento da moeda nacional e a realização de projectos públicos estruturantes. Além disso, o ex-Chefe de Estado assegurou que era impossível a qualquer um dos réus apropriar-se dos 500 milhões, uma vez que, com base nos contratos assinados, os fundos permaneciam na esfera jurídica do BNA, além de que se manteriam sempre no circuito bancário.


Segundo consta, José Eduardo estava convencido que a operação permitiria sanar os principais problemas económicos e sociais do país, com destaque para o combate à fome e a redução do desemprego. Com o fortalecimento da moeda, estava previsto sobretudo o controlo da inflação e a manutenção do valor do kwanza, evitando a grave depreciação que retirou poder de compra às famílias e às empresas, aprofundou a pobreza e aumentou o desemprego. A realização de projectos estruturantes com recursos privados também asseguraria a retirada do Estado da condição de maior investidor da economia, facto que tem dificultado também a criação de emprego e o crescimento económico. Recorde-se que a maioria dos projectos da era João Lourenço que estão em curso ou que foram concluídos recentemente partiram da governação de José Eduardo dos Santos. Além disso, os investimentos públicos realizados nos últimos cinco anos em projectos estruturantes estão muito aquém do nível de financiamento previsto nos contratos autorizados por José Eduardo dos Santos que rondava os 30 mil milhões de dólares.

Recorde-se que, neste processo conhecido como o ‘caso 500 milhões, o Estado angolano não perdeu qualquer centavo.