Luanda - Em entrevista à DW, a ativista Laura Macedo defende uma petição para a retirada de "milhões de falecidos" dos cadernos eleitorais em Angola. "Precisamos que os observadores estejam atentos a este tipo de irregularidade".

Fonte: DW

Um grupo de cidadãos residentes em Angola e na diáspora lançou no fim de semana passado uma petição dirigida à Comissão Nacional Eleitoral (CNE) angolana, em que exige a purga dos cadernos eleitorais de "milhões de pessoas falecidas".


Segundo o texto, o cadastro nacional de cidadãos eleitores está "ensombrado com o registo de milhões de pessoas falecidas", atribui um número não identificado de "duas mesas a um único eleitor capacitado", ou estipula o local de voto "a milhares de quilómetros da residência" de eleitores e exclui o direito de voto a um número, também não identificado, de eleitores na diáspora, que pela primeira vez podem votar nas eleições agendadas para 24 de agosto.


Estas irregularidades, sublinham os peticionários, constituem argumentos que justificam a "pré-disposição para a impugnação do processo eleitoral" junto do Tribunal Constitucional angolano, ação eventual para a qual estão já a contactar possíveis patronos jurídicos.


Os signatários exigem, assim, à CNE que devolva ao processo eleitoral "a necessária transparência e aos cidadãos eleitores a necessária confiança nas instituições" e decida "de imediato pela reposição das normas regulamentares e subsequente correção das irregularidades".


A DW África falou sobre o assunto com a ativista cívica Laura Macedo, uma das quatro promotoras da petição.


DW África: Qual a vossa principal preocupação?
Laura Macedo (LM): A nossa grande preocupação [são] esses números de eleitores, que o próprio Ministério de Administração e Território, quando entregou o ficheiro provisório, falou-nos em cerca de dois milhões de mortos.


Portanto, este é um dado que foi avançado pelo ministro Marcy Lopes. Então, para nós é um dado fiável, nós não falamos em dois milhões de mortos de ouvir dizer, foi ele que disse. Depois vemos também que os angolanos na diáspora se queixam de que em muitos sítios não houve o registo eleitoral oficioso. Mas, quando eles inserem o seu número de bilhete de identidade, aparece-lhes uma mesa de voto onde irão poder exercer este direito.

DW África: Quer dizer que o simples envio de uma mensagem para um número disponibilizado pela CNE permite aos eleitores, através do número de bilhete de identidade, saberem onde vão votar no dia 24 de agosto?
LM: Sim, senhor! Nós temos milhares de cidadãos na diáspora que, porque o Governo resolveu anexar o arquivo de identificação das pessoas, ficaram automaticamente aptos a votar numa assembleia de voto perto da morada que indicaram quando tiraram o bilhete de identidade.


Portanto, nós temos pessoas que nunca se registaram e que, porque vieram a Angola e tiraram o seu bilhete de identidade, [estão aptas a votar]. E sobre isso eu tenho uma experiência com um familiar, porque veio cá e aproveitou para renovar o seu bilhete de identidade. Quando ele disse que vivia no Porto, em Portugal, não lhe foi permitido que ele pusesse a morada dele [no exterior do país]. Ele está neste momento com a morada da minha casa. Está apto a votar numa assembleia de voto aqui perto da minha casa.


DW África: Essa falha no registo eleitoral põe em causa a transparência de todo processo no registo eleitoral?
LM: Nós sempre tivemos desconfianças com as eleições. Neste momento estamos em campanha [eleitoral] e vemos que o que o partido que governa o país faz durante a campanha é inadmissível. Eles usam os meios todos do Estado, da comunicação social... Quer dizer, o presidente do MPLA usa os seus poderes como Presidente da República, como se já tivesse sido reeleito.


DW África: E como tem sido a aceitação desta petição por parte da sociedade civil angolana? Já tem muitas assinaturas?
LM: Neste momento estamos com 150 assinaturas. Optamos por, em vez de entregar primeiro e depois recolher as assinaturas, angariar mais força e entregar já com mais assinaturas.

 

DW África: E a vossa intenção é que esta petição chegue ao conhecimento de instâncias internacionais, certo?
LM: Claro que é esta nossa intenção. Precisamos que os observadores estejam atentos a este tipo de irregularidade, porque, convenhamos, dois milhões de boletins de voto são muitos boletins de voto. Quem vai controlar estes dois milhões de boletins de voto? Quem sabe na CNE quantos são ao certo os mortos para retirar os boletins e inutilizar para não serem usados? O que é que acontecerá a estes boletins? Será que depois inventam uma assembleia de voto fantasma, como nós costumamos ver em imagens que são divulgadas que são em zonas onde num raio de trinta quilómetros não há pessoas e está lá uma assembleia de voto? Será que depois vão colocar estes boletins como sendo destas assembleias de voto e contabilizar? Portanto, há todo um clima de desconfiança