Lisboa - Gustavo Costa começou a colaborar com o Expresso em 1989. Era o nosso correspondente em Luanda e morreu na madrugada desta sexta-feira, às 00h03 na capital angolana vítima de um AVC. Quando discutíamos as matérias ao telefone ele ouvia-nos com atenção, explicava sumariamente como pensava tratar o assunto, pausava e concluía, repetindo “sim, sim, sim”. Nós ficávamos descansados. Ou partíamos para massacrá-lo com telefonemas quando havia atrasos ou as edições em Lisboa exigiam antecipação: "Gugu!!", e ele respondia. “Sim, sim, sim”. Só mais meia hora…

* Cristina Peres
Fonte: Expresso

A intuição jornalística dele e a lista de contactos de que dispunha garantiam que alguma coisa nos surpreenderia na “volta do correio”. Umas horas antes de ter sofrido o derrame cerebral falámos sobre o texto que escreveu para a “Revista E” em antecipação das eleições de 24 de agosto e ele insistiu, impressionado, na tensão que se sentia no ar nos meios que correu para escrever aquela que viria a ser a última reportagem para o Expresso.

Gustavo Costa nunca trabalhou num meio fácil, o que nalguns anos terá sido estimulante, já que a liberdade em Angola é angolana. Como me disseram alguns entrevistados no pós-eduardismo, cada um à sua maneira, pode-se falar, não se sabe qual pode ser a consequência. Antes seria pior e, por isso, o Gustavo Costa foi condenado em janeiro de 2000 a um ano de prisão com pena suspensa de 19 meses e ao pagamento de uma multa no valor de quatro mil contos (cerca de €20 mil).

CONDENADO A PENA SUSPENSA E MULTA
O processo foi movido pelo chefe da Casa Civil da Presidência da República de Angola, na sequência da publicação de uma notícia onde afirmava que o Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, havia denunciado o envolvimento de funcionário do seu gabinete em esquemas de corrupção. A defesa de Gustavo Costa interpôs recurso à condenação, porém eram os tempos em que corrupção era palavra tabú em Angola.

Num texto publicado no diário “Público” em fevereiro de 2000, Reginaldo Silva escrevia que do Gustavo Costa “tinha sido o último jornalista julgado em Luanda em regime de absoluto ‘black-out’, com base no facto de se tratar de um crime particular, o que permite à acusação requerer o julgamento à porta fechada, já que a publicidade pode afetar ainda mais o lesado”. Mais à frente, Reginaldo Silva escreve que esta sentença foi tão draconiana que “se comenta em Luanda que até o próprio advogado do chefe da Casa Civil de Eduardo dos Santos terá sido surpreendido com a dureza da pena”.

Gustavo Costa iniciou-se no jornalismo na década de 1970 no período pós-independência, no “Jornal de Angola”. Passou pelo “JDM - Jornal Desportivo Militar”, os portugueses “Record” e “Expresso” e pontualmente a BBC. Fez parte da equipa que lançou o “Novo Jornal”, de que viria a ser diretor-adjunto e, depois, diretor, sobre o qual se diz “ter sido uma lufada de ar fresco no panorama jornalístico angolano”. De tal maneira, que arrebatou vários prémios.


Numa nota biográfica datada de 2015 lê-se que durante a sua já longa carreira em prol de um jornalismo crítico, Gustavo Costa foi galardoado com várias distinções dentre as quais o Prémio Nacional de Jornalismo e o Prémio Maboque de Jornalismo. Merecido! As muitas reportagens que escreveu no Expresso testemunham-no, “sim, sim, sim!”.