Luanda - A apenas quatro dias das eleições gerais em Angola, aumentam receios de fraude eleitoral. A afirmação é do presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD). "Até hoje, CNE não publicou os cadernos eleitorais".


Fonte: DW

A apenas quatro dias das eleições gerais em Angola, aumentam os receios de fraude. Por isso, a Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD) apelou à Comissão Nacional Eleitoral (CNE) para agir com "transparência". E deixar de violar a lei eleitoral, para evitar que sejam postos em causa os resultados da votação no próximo dia 24.


Em entrevista à DW, o presidente da AJPD, Serra Bango, alerta para eventuais "confusões" no dia da ida às urnas, como já aconteceu noutras eleições, e que muitos eleitores não saibam onde votar. Em tempo de balanços, Serra Bango critica também a cobertura eleitoral feita pela imprensa pública angolana. Como ponto positivo, destaca a diminuição dos confrontos violentos entre militantes do MPLA e da UNITA que fizeram manchete noutras épocas eleitorais.


DW África: A AJPD apelou à Comissão Nacional Eleitoral a atuar com transparência e abster-se de práticas que violam a lei. O que é que quer dizer com tudo isso?
Serra Bango (SB): Queremos dizer que a CNE deve, primeiro, gerir o processo estritamente de acordo ao que está estabelecido na Lei Orgânica sobre as eleições gerais. Ocorre que, desde o princípio, ela está a violar alguns prazos. Há tarefas que deveriam ter sido executadas num período específico e não foram. Continuam a protelar a execução destas tarefas para última da hora. Um primeiro exemplo é o credenciamento dos delegados de lista. Outro exemplo é o credenciamento dos observadores - a CNE criou muitas dificuldades para credenciá-los, apesar de tê-lo feito. Mas ainda assim condiciona a presença dos observadores a determinadas circunscrições eleitorais. Um observador que tiver possibilidades de deslocar-se de uma província para outra, ou de uma circunscrição eleitoral para outra, não pode fazê-lo.


Mas a última de todas elas mesmo é o fato da CNE, até hoje, não ter publicado os cadernos eleitorais - algo que é uma imposição legal. E qual foi o expediente que a CNE encontrou? Publicar no seu site a lista dos eleitores para que os mesmos consultem. Mas não é isso que a lei diz. [Contrariamente,] a lei diz que devem ser os cadernos eleitorais. Quando o eleitor entrar para a cabine, o delegado de lista ou os funcionários que estiverem lá deverão riscar o nome do eleitor para confirmar que já votou. Em Angola, temos zonas e populações que não têm acesso à internet. Estamos a criar uma ilusão de que estamos numa sociedade em que toda a gente tem acesso à internet, e pode ver e localizar o seu nome, ou mesa de assembleia.


DW África: Há aqui sinais de que se poderá estar a preparar uma fraude eleitoral que pode afetar a credibilidade destas eleições de 24 de agosto?
SB: Sim, também há um outro sinal que poderá ocorre. É a última hora a CNE dizer que cada cidadão poderá votar em qualquer assembleia. Isso vai criar uma confusão e dispersão de pessoas. Não estando criadas estas condições, não se respeitando a lei como ela estabelece, é um sinal evidente de que temos uma porta aberta para resultados que poderão não refletir de facto a vontade expressa pelos cidadãos nas urnas.


DW África: Falemos também da campanha eleitoral - que está na reta final. Na opinião da AJPD, o que é que manchou a campanha eleitoral e o que é que foi positivo nestes dias?
SB: Esta campanha foi manchada pelo comportamento pouco aconselhável da imprensa pública. Durante quase seis meses ela vem fazendo a campanha do MPLA - e agora o faz 24/24 horas. Outro elemento que manchou a campanha foram as posições que determinados servidores públicos tiveram e como incitavam, ou amedrontavam, a população. Refiro-me aos pronunciamentos do chefe da casa de segurança da presidência. O Sr. General Furtado usou a expressão "que haveriam de dar no focinho todos aqueles que saíssem à rua e se manifestassem contra". Há irregularidades no processo e estas palavras foram depois seguidas por atos de intimidação, com exercícios militares, demonstração de força pela polícia.


Mas um aspeto positivo é que não percebemos de forma evidente os confrontos violentos e físicos entre os militantes do MPLA e da UNITA.


DW África: Quais são os seus principais receios para "O dia D", 24 de Agosto?
SB: O receio é que haja confusão no dia da votação e existam pessoas que não saibam onde votar. E que algumas assembleias não abram na devida altura, ou que não tenham material disponível para votação, como ocorreu em 2012, 2008, no Kikolo e no Cazenga, Viana. Sobretudo naquelas áreas consideradas bastiões da UNITA. Portanto, que haja esta confusão propositadamente criada para inviabilizar o voto dos cidadãos. Há aqui um sentimento generalizado na população de que há muitos simpatizantes de Adalberto da Costa Júnior, e não de João Lourenço. Perante este cenário, é provável que o MPLA e o seu candidato, querendo evitar uma derrota, ou uma situação pouco agradável para si, crie com o beneplácito da CNE condições para que muitos cidadãos não votem. Se os cidadãos não votam, no sistema de distribuição de voto, quem estiver no poder, e tiver algumas vantagens, sempre terá possibilidades de angariar os votos para si. Por outro lado, a situação é que, desta vez, não consigamos ter um ambiente mais pacífico. Há aqui dois movimentos que se criaram - o "votou sentou" e o "votou bazou" - e essas duas tendências estão dividir a opinião pública