Luanda - A Política é feita por um conjunto de ideias, em termos de pensamentos, conceitos, valores, princípios, normas e métodos, que se traduz numa matriz ideológica ou doutrinária. Dali se engendra o «idealismo» que é uma atitude prática ou teórica segundo a qual o ideal tem primazia sobre o real. Noutras palavras, o idealismo consiste na teoria de subordinar actos e pensamentos a um ideal moral, intelectual ou estético.

Fonte: Club-k.net

Inversamente, o «realismo», que é uma teoria materialista, vê as coisas como elas são, e agir em conformidade com isso, sem atender a precedentes ou a escrúpulos. Em termos de conceitos, o «realismo» afirma o primado do real sobre o ideal – como antítese. A meu ver, a contradição fundamental entre os dois conceitos consiste em saber quem, de facto, tem primazia: o Ideal ou o Real?


Vejamos, na filosofia, por exemplo, o «realismo» é uma doutrina segundo a qual as nossas ideias gerais ou conceitos universais corresponde, fora da mente, algo de real, ou em si mesmo ou nos seres individuais. Isso quer dizer que, sem um processo cientifico de análise, fica difícil apurar a essência de alguma coisa, que nos aparece ou que esteja implicitamente na nossa mente. Ali estará o nó da lógica, de como determinar se alguma coisa é real ou é ideal? O fundo da contradição, nesta antítese, reside na primazia, que se torna difícil apurar e determinar a sua essência, sem que haja um processo cientifico de estudo e de análise, para conhecer a essência da matéria.


Este processo de análise crítica nos conduz ao «pragmatismo», um outro conceito filosófico, que assenta na teoria segundo a qual a função essencial da «inteligência» não é fazer-nos conhecer as coisas, mas sim, permitir a nossa acção sobre elas. Ou seja, a verdade de uma ideia reside na sua utilidade, definindo-se pelo seu êxito. Para dizer que, a prática, que resulta do nosso juízo, é o método mais eficiente e adequado que nos permite descobrir as leis internas dos seres e das coisas.


O fundo da questão é que, embora na teoria os três conceitos filosóficos aparecem ser análogos, mas na sua essência existe uma diferença enorme entre si, que distingue uma doutrina de outras. O «idealismo», por exemplo, assenta no ideal (abstrato) contra os factos reais. Ao passo que, o «realismo» busca os factos reais contra o ideal; este último, regula-se por elementos morais, intelectuais e estéticos. Quanto ao «pragmatismo», este conceito não busca apenas os factos reais, mas sobretudo, a transformação das coisas em algo substancial, fora dos valores morais, éticos, estéticos e ideológicos.


Para entrar na profundidade desta matéria, o realismo (politica realista) vê as coisas conforme elas são e não conforme deviam ser; além disso, agir em conformidade com a natureza real de cada coisa, sem sujeitar-se aos freios ideológicos, morais, éticos, espirituais e culturais. O «realismo» é aquilo que ficou conhecido por Realpolitik, na terminologia da língua alemã. Para o Henry Kissinger, um dos proponentes mais dinâmicos da Realpolitik, tinha a visão segundo a qual, cita: «A Realpolitik é uma forma pragmática de lidar com outras nações poderosas de uma maneira prática, em detrimento de uma base de politica doutrinaria, moral ou ética, defendendo os interesses nacionais, no contexto da geopolítica mundial”. Fim de citação.


Neste caso, o «pragmatismo» é o princípio que está no domínio do Conceito do Realismo «política realista»; mas só que, este princípio vai muito além de agir de modo realístico, mas sim, buscar soluções realistas, adaptando-se aos aspectos reais, sem com qual ficar amarrado ao dogmatismo ideológico da moral, da ética, da ideologia ou dos tabus culturais. Neste respeito, a diplomacia económica, da era da globalização, assenta-se firmemente nos princípios pragmáticos, associando-se ao princípio da coexistência pacífica.


Este princípio, da «coexistência pacífica», conhecido por “existência simultânea,” baseia-se no pressuposto segundo o qual, deve prevalecer o compromisso mútuo entre Estados de sistemas económicos e políticos opostos no sentido de, renunciando a impor um dos sistemas pela força, recorrer a formas pacíficas de competição económica, tecnológica, científica, comercial e cultural.

 

Quando este principio estruturante é atropelado na condução das relações internacionais, sempre tem consequências nefastas, pondo em perigo a segurança da comunidade internacional. Por exemplo, a invasão da Ucrânia pela Rússia constitui uma violação flagrante do princípio da coexistência pacífica. Quando a Rússia procura impor um sistema político e económico a um outro Estado soberano, até anexar os seus territórios. Agora, as consequências estão aí, ter-se mergulhado o mundo na crise económica profunda, com a probabilidade desta guerra sair sob o controlo e embocar-se no uso de armas nucleares.


Na realidade a «coexistência pacífica» é um dos princípios basilares da democracia plural, em que, no xadrez político nacional, do mesmo espaço social, as forças políticas de matrizes ideológicas adversas convivem juntos, de modo pacífico, disputam o poder político, e aceitam livremente o princípio de alternância, que passa por via do sufrágio universal directo.


Convinha enfatizar o facto de que, a coexistência pacífica, o realismo e o pragmatismo são princípios estruturantes que as potências mundiais, como os EUA, China e Rússia, adoptam nas suas políticas externas, na defesa dos seus interesses nacionais e nas relações bilaterais entre elas. De modo geral, neste jogo de interesses das superpotências, os países menos desenvolvidos, dependentes das economias industrializadas, sem capacidades tecnológicas avançadas, terminam sempre por ser vítimas.


Nesta senda, gostaria ainda de sublinhar o seguinte aspecto: o princípio do «interesse nacional», que é a pedra angular da política externa norte-americana, não tem sido bem percebido ou interpretado correctamente por Governos e Partidos Africanos. Isso acontece geralmente quando a postura do Washington contrariar ou prejudicar os processos democráticos nos Países Africanos. Pois, tem sido frequentemente, nas políticas internas africanas, Washington inclinar-se ao lado dos regimes corruptos e autoritários que estiver no poder, mesmo quando os resultados eleitorais estiverem a favor dos Partidos na Oposição.


No fundo, a visão estratégica norte-americana não reside na promoção das forças democráticas africanas, mas sim, na garantia dos seus interesses geoeconómicos e geopolíticos que lhes permite isolar a Rússia dos seus aliados históricos em Africa, e deste modo, afastá-la dos espaços vitais do Continente. Pois que, a partir da Administração do Presidente Richard Nixon (1969-1974), a política externa norte-americana deixou de orientar-se por interesses ideológicos. A título de exemplo, a UNITA tem sido vítima consequente desta doutrina, quer em 1975 (Emenda Clark); quer no rescaldo da guerra-fria (1992); quer no final da guerra-civil (2002); e quer na conjuntura (eleições de 24/08/2022) actual – da Guerra da Ucrânia e da crise energética na Europa.


Nisso, gostaria de afirmar que, na época contemporânea, a prioridade dos Estados Unidos da América e da União Europeia (NATO) é a Guerra da Ucrânia. Todos os esforços estão sendo feitos neste sentido, pressionando os Governos Africanos para alinhar-se com o Ocidente contra a política expansionista do Presidente Vladimir Putin. O «Factor-Chinês» em África, embora tenha o peso demasiado na política externa norte-americana, devido o seu potencial económico e tecnológico; mas mesmo assim, isso não supera o «Factor-Putin», que é tido como o maior desafio do Ocidente desde a Segunda Guerra Mundial.


Portanto, qualquer análise realista e pragmática, no domínio da política externa africana, não deve ignorar este aspecto, da realpolitik norte-americana, que tem o potencial enorme de adiar ou retardar os processos democráticos em África. Visando, deste modo, a maior cooperação estratégica com os governos africanos; o aumento dos investimentos ocidentais nos países africanos; e sobretudo, o acesso aos recursos minerais (petróleo e gás) estratégicos, às vias marítimas e aos aeroportos estratégicos.


Em síntese, ao longo dos tempos, a idealização e harmonização de conceitos científicos tem sido a preocupação permanente dos filósofos, dos pensadores e dos estudiosos (de todos os ramos da ciência), tendo a finalidade investigar, estudar e perceber a natureza dos seres, as suas origens e a sua evolução, na base do «existencialismo», que é a «essência» da vida humana.


Assim, se não percebermos correctamente os Conceitos essenciais dos outros Povos, das outras Nações e dos outros Estados, na formulação das suas políticas internas e externas, fica difícil lidar com eles, saber os seus desígnios, prever o futuro, e acautelar os nossos interesses, sem com isso causar danos a outras partes. Nisso reside o imperativo do idealismo, do realismo e do pragmatismo como conceitos científicos que orientam a política externa e a diplomacia dos Estados soberanos e das Organizações Multilaterais.


Importa enfatizar que, o exposto acima, não se limita apenas aos Governos, como Administrações Públicas; mas sim, aos Partidos Políticos influentes, que asseguram a estabilidade dos países, a representatividade dos povos, a disputa do poder político, a manutenção do equilíbrio e o desenvolvimento equilibrado e sustentável.


Luanda, 07 de Novembro de 2022.