Luanda - Advogado admite "excesso" no número de condenações pelo crime de ultraje em Angola. Serviço de Investigação Criminal prendeu mais dois jovens que alegadamente ofenderam João Lourenço redes sociais.

*Borralho Ndomba
Fonte: DW

O crime de ultraje está tipificado no polémico artigo 333 do Código Penal angolano, aprovado em 2020, que condena o ultraje à figura do Presidente da República e aos órgãos de soberania. Desde a sua promulgação, são vários os angolanos detidos e julgados por alegadamente ultrajarem a figura de João Lourenço. Entre eles está o ativista Tanaice Neutro que, apesar de absolvido, continua preso.

 

Nelson Dembo "Gangsta", o ativista que convocou, na passada sexta-feira (31.03), a manifestação "fica em casa", também está indiciado pelo crime de ultraje. Gangsta não cumpriu a medida de coação que visa apresentar-se regularmente ao Serviço de Investigação Criminal (SIC) e é procurado.

"Objetivo é diminuir a intervenção cívica"

 

Em declarações à DW, o ativista Gangsta diz que o artigo 333 é uma ameaça à liberdade de expressão. "Objetivo é diminuir a intervenção cívica. Manter-te sob controlo. Se fores para cadeia e fores condenado, será uma pena suspensa prolongada. O que quer dizer que deves ficar calado durante cinco anos porque João Lourenço deve governar com liberdade. Não pode. João Lourenço deve ser questionado", defende.


O advogado Zola Bambi diz que a norma está a ser mal aplicada e de "forma abusiva".

"Aqui há excesso. Devemos ter respeito por qualquer ser humano, não importa se ocupa ou não funções. Mas em África, particularmente Angola, há aproveitamento político. Quando se trata de ativistas ou pessoas que não se identificam com o partido político no poder, a questão de ultraje é aplicada de forma extrema", lamenta.

 

"Para os ativistas basta dizer uma palavra forte, digamos 'fora', já é mesmo ultraje", critica o advogado.

Mais dois detidos

Neste fim de semana, dois jovens foram detidos na província do Uíge por ultraje. Os mesmos apareceram num vídeo a ofender o Presidente da República e o ex-governador do Uíge, atual secretário-geral do MPLA, Paulo Pombolo.

 

Pedro de Sousa, membro do Movimento Revolucionário de Angola na província do Namibe, condena a ação dos jovens.


"É uma lei que visa oprimir o povo e fazer com que a sociedade civil deixe de criticar o Presidente da República, deixe de chamar o Presidente de incompetente e deixe de chamar o Presidente de ditador", afirma.

 

Condenado com pena suspensa por crime de ultraje em janeiro, o ativista Luther Campos está impedido de fazer ativismo durante cinco anos sob pena de voltar à prisão.

 

"Mesmo a ser penalizado, vou continuar a fazer cobranças sempre que houver necessidade", promete.

 

O presidente do Conselho Nacional da Juventude (CNJ), Isaías Kalunga, reprova os atos de jovens que ultrajam o Presidente angolano. As declarações foram feitas na quinta-feira (30.03) no evento em que o CNJ apresentou uma moção de apoio a João Lourenço.

 

"Quando dizia que o Presidente da República, João Lourenço, é um símbolo nacional, este símbolo deve ser respeitado. Temos acompanhado cidadãos que volta e meia ofendem, ultrajam a figura do chefe de Estado como se ele não fosse pai de alguém. Não é aceitável que assistamos a cidadãos a ofenderem o Presidente da República", conclui.