Luanda - Após críticas da sociedade e da oposição, Procuradoria-Geral da República de Angola diz que vai passar a divulgar informações sobre a recuperação de bens arrestados. O que isto significa na prática?

*Braima Darame
Fonte: DW

Após várias críticas da sociedade civil e dos partidos políticos da oposição, a Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola anunciou que vai passar a divulgartodas as informações sobre a recuperação de bens arestados no âmbito do combate à corrupção, através de um sítio na Internet - a ser criado.

No dia 27 de abril, a PGR completou 47 anos de existência, inaugurou uma nova sede e viu Hélder Pitta Gróz reconduzido ao cargo como Procurador-Geral da República e Inocência Pinto indicada como a vice. Toda esta dinâmica foi justificada com a necessidade de "continuar a luta contra a corrupção, ou seja, acabar com o ninho dos marimbondos".

A União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), principal partido da oposição, chegou a acusar a PGR de conduzir o processo de forma muito "parcial" e pouco transparente. À DW África Armindo Laureano, jornalista e diretor do Novo Jornal, de Angola, explicou a importância da disponibilização da informação, mas não poupou críticas.


DW África: Acha que esta é a maneira mais adequada de mostrar transparência no combate à corrupção?

Armindo Laureano: Há aqui dois princípios, o da transparência no processo e o do acesso à informação pelos cidadãos. E isso tem todo um histórico, porque há uma pressão muito grande e críticas, alegadamente feitas pelo partido UNITA e outros visados neste processo. Criticam a PGR por estar alegadamente a conduzir este processo de combate à corrupção de forma seletiva. Esta é a resposta que encontraram para as várias críticas, que recebem desde 2017, quando o Presidente João Lourenço apresentou o combate à corrupção como uma das suas bandeiras. Então, a PGR vai passar a publicar essa informação no âmbito do Serviço Nacional de Recuperação de Ativos.

 

DW África: Mas o processo de divulgação dos ativos apreendidos já começou?

AL: Ainda não começou a ser feito e eles dizem que é para breve. Mas garantem que as pessoas poderão ter acesso ao que foi recuperado, onde está localizado e a quem foi dada a responsabilidade da sua gestão - além de uma série de informações neste sentido. Muitos visados, os seus constituintes e famílias, têm reclamado que este processo tem sido feito de forma pouco transparente. Não se sabe a quem se entrega os bens recuperados ou quem está a gerir. E há, por isso, um conflito muito grande de interesses muito grande.

 

DW África: E por que só agora a PGR decidiu avançar para esta via?

AL: Boa pergunta. A resposta que posso dar é que esta medida peca apenas por ser tardia. Resulta da pressão que foi feita pelos partidos de oposição - nomeadamente, da UNITA e também de visados e dos seus advogados. Posso recordar que, no mês de fevereiro, o Novo Jornal entrevistou Zenú dos Santos, filho do ex-Presidente José Eduardo dos Santos. Em pormenores, [ele] falava também do combate à corrupção e da forma seletiva como estava a ser feito. Dizia que estava a ser julgado neste processo, então em prisão domiciliar, por ser filho de José Eduardo dos Santos. O mesmo também aconteceu com Irene Neto, filha do ex-Presidente Agostinho Neto, e esposa de São Vicente, que neste momento está detido. Alegam que este processo foi apenas para se apropriarem de certas pessoas e dos bens que São Vicente tinha.

 

Esta medida vem também no âmbito de criar uma certa transparência e deixar cair por terra muitas acusações e alegações sobre o fato de altas figuras do poder judicial estarem muito envolvidas num conflito de interesses em ficar com a propriedade destas pessoas que estavam alegadamente indiciadas pelo crime de corrupção. Até o mês de abril, a informação que nós tínhamos é que foram recuperados, segundo as autoridades angolanas, seis mil milhões de dólares e que foram apreendidos mais de 20 mil milhões de kwanzas (cerca de 40 milhões de dólares) em ativos no país.


DW África: Resumindo, coloca-se aquela questão – será que este processo de combate à corrupção falhou?

AL: Estes números que apontei-lhe, por exemplo, era preciso discriminar-se para onde é que foram - para Portugal, ou onde estão? Qual é o caminho, já estão nos cofres do Estado? [Foram recuperados] pelo Banco Nacional? Havia toda esta necessidade. Também há a questão do sujeito que leva a cabo este combate à corrupção. Esta responsabilidade tem sido muito atribuída ao Presidente João Lourenço. E os seus correligionários do partido dizem "o combate à corrupção levado a cabo pelo Presidente João Lourenço" – é aí que deve ser discutido e fere um bocado o princípio da separação dos poderes.

 

DW África: É desta que os angolanos terão mais informações? Haverá transparência neste processo com esta nova dinâmica da PGR em passar informação, em criar esta página na internet?

AL: Que tipo de informação e como vai ser passada? Será passada toda a informação que as pessoas precisam? Este é o grande problema, o grande dilema da transparência. É perceber o quê e a quem se recuperou. E onde está e quem está a fazer esta gestão. Por exemplo, na questão dos imóveis que foram recuperados - estão entregues às mesmas pessoas que foram atrás e perseguiram aquelas pessoas. Acabaram ficando com estes imóveis e não declararam. Este processo é pouco transparente. As críticas já vêm há muito tempo, os visados e as famílias têm feito isso. É isso o que nós vamos explorar. N]ao acredito, tenho minhas reservas. Mas, na realidade, é um bom princípio dizerem que vão publicar, tornar disponível, em nome da transparência. Porque a informação é um direito que o cidadão tem.