Luanda - Na ciência política existe os princípios da diversidade, da bipolarização, da multipolarização, da coabitação e da coexistência pacífica. A diversidade é um conceito muito profundo e amplo, que significa a variedade, a multiplicidade, a distinção e a divergência. A diversidade é um estado mental da pessoa humana, cujo raciocínio lhe permite perceber o Universo, distinguir o bem do mal, aceitar as ideias dos outros e afirmar a sua identidade, como pessoa, com a personalidade distinta.

Fonte: Club-k.net

Em política, a coabitação é a coexistência, que se manifesta nas coligações politicas para a formação de um governo composto por dois ou mais partidos políticos que possuem ideologias ou ideários distintos ou adversos. A coexistência pacífica, por sua vez, assenta no principio segundo o qual, deve existir a tolerância (compromisso) entre os sistemas económicos e políticos distintos (opostos) no sentido de evitar (renunciar) a imposição de sistemas políticos pela força; recorrendo, deste modo, aos métodos e às formas (dialogo, negociação, compromissos e consensos) pacíficas na competição política, económica, científica, tecnológica e cultural.


A bipolarização, como conceito, visa a divisão do mundo em duas esferas de influências com sistemas políticos e económicos distintos e opostos. Nesta linha de pensamento, a multipolarização, é um conceito que prima pela existência de vários centros (polos) de poderes, que criam o equilíbrio na esfera da geopolítica mundial. Na base desta teoria, o mundo fica dividido em vários blocos políticos, económicos e militares. Apesar de estarem divididos, mas têm uma «inter-relação» de cooperação política, económica, comercial, cultural, tecnológica e cientifica através do mercado internacional e das organizações multilaterais.


Importa realçar que, os dois conceitos: a bipolarização e a coexistência pacífica, emergiram no rescaldo da Guerra Mundial II, em 1945. Ao passo que, o multipolarismo é o novo conceito que emergiu após a guerra-fria, com o surgimento da China como segunda maior economia mundial. No rescaldo da Guerra Mundial II, como sabemos, o mundo ficou dividido em dois sistemas distintos e opostos, sendo: o «capitalismo» e o «socialismo».


Neste processo, a Europa Ocidental ficou vinculada ao capitalismo, sob a liderança dos EUA. A Europa do Leste, por sua vez, ficou integrada no sistema socialista, sob a liderança da União Soviética. Os Países Asiáticos, Africanos e Latino-Americanos ficaram igualmente divididos entre o Bloco Ocidental e o Bloco Soviético.


Portanto, a Guerra-Fria ficou marcada pela Bipolarização entre o Socialismo Asiático e o Capitalismo Ocidental. O desmoronamento da União Soviética, como líder do Bloco Socialista, precipitou o colapso do socialismo, como sistema económico. As duas potências socialistas – Rússia e China – foram obrigadas, pelas circunstâncias óbvias, adoptar a economia do mercado, integrando-se no sistema monetário internacional através do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional. As duas Instituições Financeiras, de Bretton Woods, estão sedeadas em Washington, sob a tutela dos Estados Unidos da América.


Na verdade, a integração da Rússia e da China no mercado internacional, dominado pelo capitalismo ocidental, obrigou todos os países socialistas da África, da Ásia e da América Latina a seguirem o mesmo caminho. É fundamental saber que, a Civilização Ocidental assenta na Cultura Europeia, no Cristianismo e no Capitalismo, que são as fontes principais de inspiração da Democracia Ocidental. Logo, ao aderir à Economia de Mercado, que é o «cerne» do Capitalismo, fica obrigatório vincular-se ao sistema democrático e aos seus valores. No fundo, embora haja outros factores, mais este elemento, do vinculo aos valores democráticos, constitui o âmago das rivalidades entre as Potências Ocidentais e as Potências Asiáticas.


Antes de proceder para diante, gostaria de chamar a vossa atenção ao seguinte: a União Soviética não entrou em colapso devida a falta do potencial militar; mas sim, o sistema económico socialista (planificado e centralizado) não teve a capacidade de concorrer com o sistema capitalista ocidental que é caracterizado por grande produção, por investimento de grande massa de bens, por propriedade individual de capitais, por livre iniciativa, e por mercado livre e competitivo.


Vejamos que, o mecanismo de distribuição do rendimento nacional, no sistema socialista está sob o domínio do Estado, que define e determina as prioridades. Ao passo que, no capitalismo ocidental este mecanismo de distribuição de bens e serviços obedece às regras do mercado na base da produção, da produtividade, da competitividade e da lei da oferta e da procura. Interessa afirmar que, a livre iniciativa e a competitividade são dois factores que impulsionam e dinamizam as forças produtivas. A força produtiva refere-se à força de trabalho humano e aos meios de produção. Como sabemos, uma economia de um país precisa desses dois factores principais para alcançar o nível desejado da produtividade.


Isso indica que, um sistema político que exclui e restringe a participação dos seus cidadãos na económica do país, resulta-se na limitação da sua capacidade produtiva, em todos os sectores. Infalivelmente, isso conduz à estagnação, ao declínio da economia, ao atraso e à pobreza extrema. Por isso, a livre iniciativa não apenas tem o potencial de dinamizar a força de trabalho (recursos humanos), mais sim, de buscar os conhecimentos avançados, o know-how e as novas tecnologias capazes de impulsionar o processo da industrialização e da modernização da economia.


A África Subsariana tem este problema da desvalorização dos recursos humanos e da falta de integração global dos seus cidadãos na vida económica do país. Vejamos que, os regimes africanos adoptam as políticas de excluir todos aqueles que têm ideias ou conceitos diferentes, distintos ou variáveis. Por caso disso, muita gente hábil, dotada de conhecimentos técnicos e de know-how, têm sido combatidos, perseguidos e afastados da vida económica do país. Como resultado, regista-se a fuga massiva de cérebros, sobretudo de jovens intelectuais, que emigram aos países industrializados do Ocidente em busca da proteção, da sobrevivência e do progresso.


Como dizemos atrás, a planificação e a centralização da economia são os factores principais que estiveram na base do declínio do socialismo, que conduziu ao desmoronamento da União Soviética. A China, que esteve à margem da guerra-fria, percebeu-se deste fenómeno e logo abriu ao Ocidente, integrando-se rapidamente na economia do mercado. Só que, o sistema do Partido Único ficou intacto.


A Rússia, na liderança do Mikhail Gorbatchev, adoptou o pluralismo e a economia do mercado, estabelecendo as instituições democráticas, assentem no sufrágio universal directo, com candidaturas múltiplas. Infelizmente, quando Vladimir Putin assumiu o poder em 2000, começou a inverter os termos, mudando a Constituição e desarticulando as instituições democráticas, com o objectivo de restaurar o sistema de Partido Único,
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que prevaleceu na Rússia desde a Grande Revolução Socialista de Outubro de 1917. Gostaria de sublinhar que, a tendência do retorno ao mono partidarismo, não se verificou apenas na Rússia, mas sim, noutros países do mundo, com maior realce em África e na América Latina.


Nesta senda, Angola é um dos Países Africanos onde esta tendência monolítica é mais evidente e profunda. Neste caso específico, o processo da assimilação e da alienação cultural em Angola gerou uma «supra etnia» dos assimilados, da alta burguesia, que hoje domina o poder financeiro, estabelecendo a hegemonia política, hostil à cultura e aos valores dos povos nativos africanos, sob o pretexto da globalização. Por isso, o mercado angolano está totalmente dominado por esta classe social (oligarquia), aliada aos grandes interesses das multinacionais. Nesta base, os cidadãos angolanos, em geral, estão afastados dos principais «eixos» dos poderes políticos, económicos e financeiros.


Em síntese, está assente o facto de que, a definição da nova ordem mundial é determinada por vários factores, dentre os quais, os seguintes: factor humano; factor cultural; factor histórico; factor geográfico; factor económico; factor financeiro; factor militar; factor tecnológico e científico. Como vimos atrás, a guerra-fria foi travada entre a União Soviética e os Estados Unidos da América. O colapso da União Soviética deveu-se aos factores económicos e financeiros; e esses dois factores reduziram drasticamente as capacidades tecnológicas e militares. Obviamente, isso ditou a morte prematura do Socialismo.


O sistema Multipolar, que emergiu no final da guerra-fria, deveu-se ao crescimento acelerado da economia chinesa, impulsionada pela industrialização e modernização. Nesses moldes, a China foi capaz de suplantar a economia da Rússia, que ficou arruinada pelas despesas avultadas da guerra-fria, sem capacidade produtiva suficiente para financiar a manutenção do Império, dos Estados Satélites, da Expansão Militar e da Guerra das Estrelas.


No ponto de vista estratégico, a criação de BRICS, dominado pela China, visava «unir as sinergias» para fazer face ao Gigante Norte-Americano, que ficou em vantagem, como única superpotência, dentro do sistema Unipolar. Porém, a Guerra da Ucrânia alterou bruscamente esta evolução. A Rússia, um outro eixo do poder dentro dos BRICS, ficou atolada na guerra de desgaste da Ucrânia, isolada e afastada dos grandes palcos das organizações multilaterais. Essa evolução está a jogar a favor da China que está engajada na consolidação e na expansão da sua influência na Asia, no Médio Oriente e em África. A presença militar dos EUA na Europa ficou bem reforçada, embora esteja a perder o terreno no Mundo Árabe.


Acima disso, os EUA têm estado a reforçar a sua presença na África Subsariana com a finalidade de travar a expansão económica da China. Tudo isso mostra claramente a alteração gradual da geopolítica mundial em desfavor da Rússia que enfrenta dificuldades enormes para afirmar a sua presença na Região do Sahel – que agora está mergulhada na instabilidade profunda.


Feita uma observação objectiva, verás que, o «sistema multipolar» que está agora em voga, não tem hipótese de afirmar-se, sobretudo na condição actual em que a Rússia se encontra. Pois, pelos vistos, nem a China, nem os Estados Unidos da América, muito menos a União Europeia deseja o ressurgimento da Rússia como uma superpotência mundial. Pois que, além de tudo, existem disputas territoriais entre Moscovo e Beijing, bem como a disputa pela liderança do Continente Asiático. Logo, o declínio e o isolamento da Rússia são vantajosos para a expansão da China naquela Região. Por outro lado, os EUA almejam consolidar a sua supremacia na Europa para expandir-se ao Norte da África e ao Médio Oriente.


Em termos da doutrina política, a China tem-se apostando no «factor económico» como instrumento da sua expansão no mundo, em busca do poder global. Enquanto que, a Rússia sempre se apoiou no «factor militar» como instrumento de expansão e da dominação. Assim sendo, entre a expansão económica e a expansão militar, óbvio que, os Estados Unidos de América preferiam a competição económica, que é mais segura, evitando o risco da guerra nuclear, como está a acontecer agora na Guerra da Ucrânia. Além disso, os EUA têm o potencial económico, tecnológico e know-how muito grande, que supera as outras potências mundiais.


Mesmo assim, existem os grandes desafios que requer a cooperação mútua entre as potências mundiais, como nos domínios da Ciência, da Tecnologia Espacial, das TICs, da Inteligência Artificial e da Alteração Climática. Convinha notar que, o Modelo da «economia mista» da China permite as Empresas Chinesas operar no Ocidente e as Empresas Ocidentais investir na China. Embora, nesta última, há muitas limitações das Empresas Ocidentais operar livremente neste mercado devidas as limitações politicas impostas pelo Partido Comunista Chinês.


A questão fulcral neste momento tem sido da «não-interferência» das Potências Ocidentais nos assuntos internos de outros Estados. Este conceito universal está enquadrado nos princípios da «diversidade», da «coabitação» e da «coexistência pacífica», que já ficaram abordados atrás. Este último princípio, afirma que, os Estados, de sistemas políticos distintos, devem conviver e coexistir mutualmente, respeitando rigorosamente o Direito Internacional e a Carta das Nações Unidas. Portanto, a coexistência pacífica baseia-se em valores e princípios universais que devem ser observados, respeitados e aplicados rigorosamente por todos os Estados, para que a liberdade e a dignidade humana sejam salvaguardadas.


Porém, os regimes autocráticos invertem os termos e manipulam este conceito, defendendo a «coexistência pacífica absoluta», sem condição, violando o Direito Internacional, ao qual estão vinculados por livre vontade. Nessa base, acham que, a Comunidade Internacional não deve responsabilizar, defender e salvaguardar os Direitos Fundamentais do Homem. Infelizmente, essa «visão absolutista» tem muitos adeptos em África, no Médio Oriente, na Ásia e na América Latina. Mesmo na Europa Ocidental existem redutos da «Extrema Direita» que ainda defendem o Fascismo e o Racismo.


O que significa que, os dois conceitos (da coexistência pacífica e da não-interferência) se forem aplicados na lógica da «doutrina autocrática», muitos Países do 3o Mundo serão alastrados por eles. Como consequência disso, os processos da democratização no mundo ficarão desarticulados.


Enfim, na minha opinião pessoal, os conceitos teóricos devem ter substância na prática, como indicador daquilo que há de acontecer na transformação profunda do mundo e na constelação geopolítica do amanha. Ao contrário, a utopia, o populismo e a demagogia vão prevalecer, distraindo a opinião pública, como forma de adormecer as forças vivas da sociedade, enquanto o absolutismo vai enraizando gradualmente os seus sustentáculos.


Luanda, 22 de Maio de 2023