Luanda - Por todo o mundo moderno, crescem práticas populistas de fazer política, afectando tanto partidos de direita como de esquerda. Entre as características mais comuns, encontramos o discurso anti-elite, em que, como se tivessem de provar a sua autenticidade, atacam as elites políticas e o sistema constitucional vigente, e recusam as autoridades, porque dizem que os representantes eleitos, na verdade, não representam o povo.

Fonte: JA

Os populistas se auto-proclamam-se defensores da vontade do povo e quando perdem eleições foi "obviamente” por fraude. A propaganda do populismo é moderna, usa as redes sociais e agarra-se aos sentimentos de raiva e medo existentes na grande massa dos seus eleitores. Estabelecem uma relação privilegiada com os grupos extremistas (disponíveis para as manifestações violentas) descontentes e marginalizados, públicos que essa propaganda mobiliza e, de modo geral, estimula com o espectro do "inimigo comum”, real ou imaginário.

 

Os líderes populistas apresentam-se sempre como os guardiões da honra nacional, pessoas de boas contas e as pessoas mais puras que existem: porque eles são o povo enquanto os seus opositores são os tais "inimigos do povo”. Para Trump esses inimigos eram os negros, mulheres e imigrantes. Para Bolsonaro eram os gays, mulheres e índios. Para Boris Jonhson era o mercado europeu, tal como o ANC é apresentado como o inimigo comum por Julius Malema, da EFF, na África do Sul, ou o MPLA é o inimigo comum que Adalberto Costa Júnior usa em Angola.

O novo populismo procura fazer da política um carnaval, um exercício político que não se baseia na exactidão ou na veracidade dos acontecimentos, mas apenas na intensidade da narrativa e na estratégia de manipulação de massas. Esse carnaval no "parlamento e no sistema político” não se rege pelo bom senso e procura ostensivamente chocar com o politicamente correcto; usar a gozação, a provocação e grosseria como armas políticas. Usa as redes sociais e os grupos radicais para atacar e ridicularizar quem não pensa como eles. A liderança de ACJ exibe cartões vermelhos na Assembleia Nacional, ataca a Constituição, desvaloriza os tribunais e todas as instituições, abandona sessões parlamentares e usa de um conjunto de narrativas manipuladoras (a exemplo da ideia de que ganhou as eleições e resolveu não reclamar isso para não provocar um banho de sangue ou do facto de terem aceite e aprovado o subsídio dos deputados e depois terem vindo afirmar que o recebem para depois repassar parte para os necessitados).

Se olharmos para esta atitude nos padrões do novo populismo, a proposta de destituição de João Lourenço é uma provocação expectável, dentro de uma linha programática e de uma actuação que vem sendo consistente nesta UNITA de ACJ. Pode-se a partir daí imaginar que mais do que chegar a um resultado político concreto de acordo com os velhos padrões, a proposta de destituição de João Lourenço tenha pretendido apenas provocar o MPLA e ridicularizar, "por afronta e vulgarização”, o Presidente João Lourenço.

Não há, nem nunca houve qualquer expectativa de abertura do processo tanto no Parlamento como nos tribunais. O "teatrinho” do processo de destituição tem como único objectivo pôr lenha na fogueira da narrativa anti "joãolourencista” predominante entre os grupos radicais da sociedade e entre os cidadãos mais comuns, por conta da subida dos preços, alta de vida e desvalorização do Kwanza.

A UNITA não quis perder a oportunidade de "cavalgar” sobre a baixíssima popularidade do Presidente, procurando tirar o máximo rendimento desse descontentamento para dar a entender aos mais necessitados que quer que o "inimigo comum” saia do poder e que isso só não acontece por culpa do sistema político, do MPLA e todo o complot de pessoas e como instituições que querem o mal dos outros também.

Há, pelo mundo, bastantes provas de que muitos eleitores gostam dessas novas formas de fazer política fora do chamado politicamente correcto. Donald Trump, nos Estados Unidos, Boris Johnson, na Inglaterra, Jair Bolsonaro, no Brasil, ou Giorgia Meloni, em Itália, por terem vencido eleições com essas políticas pouco ortodoxas tornaram-se exemplos a seguir e provaram que é possível ter sucesso com tais recursos políticos.

E não haja dúvidas: Estas novas formas de fazer política vieram para ficar. Gostemos delas ou não, as novas formas de fazer política são legítimas e consequência da degradação moral dos novos tempos. O MPLA precisa urgentemente de aprender a conviver com elas e a reagir a estas provocações sem colocar mais achas à fogueira do novo populismo. Na sua reacção, o MPLA teve o bom senso de não fechar a porta do diálogo institucional, mas, em simultâneo, revelou despreparação para a provocação. O MPLA não pode, a cada vez que se via confrontado com novas formas de combate político, recorrer ao espantalho da guerra eu de violação da ordem constitucional. Esses argumentos, gastos por serem usados em todas as ocasiões, fortalecem a narrativa anti-regime e não colhem nenhuma simpatia junto dos públicos a quem se destina a mensagem da UNITA. O MPLA deve ter uma resposta mais racional do que emotiva, que tenha como foco o aumento da sua legitimidade do exercício governamental, ou seja, desencadeando mais acções governativas viradas para a satisfação das necessidades do cidadão. É pelo exemplo que vier da actuação do MPLA e do seu Governo que os descontentamentos serão meros protestos e manifestações pacíficas e não fontes de disseminação da raiva, frustração e violência. O MPLA tem de encontrar rapidamente uma estratégia que retire protagonismo à UNITA e consiga mostrar aos cidadãos que ela, a UNITA, é parte integrante (e tira bom proveito delas) das estruturas e do sistema político que diz odiar.