Luanda - Mais uma inconstitucionalidade de Joel Leonardo, ou mais uma intervenção do poder para assegurar o seu efectivo controle sobre essa instância judicial do topo da hierarquia dos tribunais de jurisdição comum? Juíza Joaquina Nascimento, mais votada que o actual Presidente, não foi nomeada na sequência da vacatura por jubilação do anterior vice-presidente e vê-se agora ‘afastada’ com realização de nova eleição.

*RAMIRO ALEIXO
Fonte: Kesongo

O Conselho Superior da Magistratura Judicial realiza hoje, 15 de Agosto, em Luanda, o processo de eleição de candidatos ao cargo de vice-presidente do Tribunal Supremo, numa sessão ordinária do Plenário do Tribunal Supremo, que será presidida pelo juiz conselheiro Presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo. 


De acordo com nota de imprensa distribuída por essa instituição, a eleição de candidatos ao cargo de vice-presidente do Tribunal Supremo decorre da vacatura do referido cargo que se regista desde 2021, por jubilação do venerando juiz conselheiro do Tribunal Supremo e vice-presidente, Cristino Molares de Abril e Silva.


A nota refere que concorrem ao cargo de vice-presidente do Tribunal Supremo os venerandos juízes conselheiros Daniel Modesto Geraldes, Efigénia Mariquinha dos Santos Lima Clemente e Maria Teresa Marçal André Baptista Borges.


No entanto, as eleições estão a ser vistas como mais um golpe institucional orquestrado pelo Presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, porque a justificação utilizada contraria os artigos 19.º e 20.º da Lei Orgânica do Tribunal Supremo (de 17 de Março de 2022). O referido instrumento jurídico estabelece que, a nomeação do vice-presidente do Tribunal Supremo deverá sair entre os três candidatos participantes nas eleições, neste caso, de que resultou a escolha pelo Presidente da República do segundo mais votado de entre três concorrentes, em que a veneranda juíza conselheira Joaquina Nascimento, com oito votos, superou os demais correntes, designadamente, Joel Leonardo com seis e Norberto Sodré João com um voto. Assim sendo, da vacatura do referido cargo que se regista desde 2021, por jubilação do juiz conselheiro do Tribunal Supremo e vice-presidente, Cristino Molares de Abril e Silva, de imediato deveria ser acionado o processo para indicação, pelo Presidente da República, da juíza Joaquina Nascimento, que não integra sequer a nova relação de candidatos.


De acordo com o Artigo 20.º da Lei Orgânica do Tribunal Supremo, referente a eleição e nomeação do vice-presidente, o “vice-presidente do Tribunal Supremo é nomeado pelo Presidente da República, de entre os restantes dois candidatos referidos no n.º 1 do artigo anterior”, bem como que, “em caso de impedimento definitivo do vice-presidente é nomeado para o substituir o terceiro candidato referido no n.º 1 do artigo 19.° da presente Lei”, neste caso o juiz conselheiro Norberto Sodré João, apesar de menos votado com apenas um voto.


Neste caso, e porque o mandato quer do Presidente do Tribunal Supremo quer do vice-presidente tem duração de sete anos não renovável, significa dizer que os resultados eleitorais que serviram para a indicação de Joel Leonardo, ganhos pela veneranda juíza conselheira Joaquina Nascimento, com oito votos, continuam válidos. Logo, a realização de novas eleições para se encontrar um vice-presidente é considerada como uma “manobra” inconstitucional do juiz Joel Leonardo, provavelmente, de acordo com as nossas fontes, por não ser da confiança nem do MPLA, nem do Presidente da República, que apesar de mais votada, usando o seu poder discricionário, optou pela nomeação de Joel Leonardo. 


Fontes ligadas ao processo, deram conta que o processo eleitoral já está formatado, fortemente influenciado pelo MPLA, que para o efeito impôs a indicação da juíza conselheira Efigénia Mariquinha dos Santos Lima Clemente, uma sua ex-deputada (1993-2008), que ao tempo do juiz Rui Ferreira esteve no Tribunal Constitucional, e desempenha as funções de presidente da Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal Supremo. A jogada de bastidores que foi engendrada faz algum tempo, contará com a influência do coordenador da Comissão Eleitoral, para a qual foi indicado, por deliberação, o vogal Sebastião Jorge Diogo Bessa, que, de acordo com a nossa fonte, já não devia integrar o Conselho Superior de Magistratura Judicial porque entrou na categoria de juiz de Direito e agora é juiz conselheiro no Tribunal de Contas.


Até ao fecho desta matéria, às primeiras horas de hoje, não conseguimos contactar a juíza conselheira Joaquina Nascimento, que foi a mais votada na eleição que conduziu Joel Leonardo à presidência do Tribunal Supremo, com oito votos, que não integra a relação das duas novas candidatas de um grupo de três do qual faz parte também o candidato Daniel Modesto Geraldes.


Para as nossas fontes, ao não apresentar a sua candidatura, a juíza conselheira Joaquina Nascimento poderá estar a reservar-se para impugnar os resultados eleitorais no período de 48 horas estabelecidas pelo regulamento que rege a Comissão Eleitoral. No caso de não ver atendido, o seu pedido poderá transitar para análise e decisão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura Judicial, a quem se poderá interpor recurso contencioso, no prazo de dois dias, após a notificação da referida decisão. O mesmo que dizer, dar a volta para cair no mesmo: em Joel Leonardo, o mandão de tudo.


O Regulamento do Processo Eleitoral dos candidatos ao cargo de vice-presidente do Tribunal Supremo segundo dá conta um comunicado divulgado na tarde de ontem, estabelece que podem concorrer ao cargo de vice-presidente os juízes conselheiros do Tribunal Supremo em pleno exercício de funções, que estejam a exercer ou que tenham exercido a função de presidente de uma das câmaras do Tribunal Supremo, que possuam, pelo menos, 5 (cinco) anos de antiguidade na categoria de juiz conselheiro do Tribunal Supremo e que tenham uma classificação mínima de bom, na avaliação de mérito, nos últimos 5 (cinco) anos.


As candidaturas foram apresentadas mediante requerimento dirigido à Comissão Eleitoral, no prazo de 2 dias, que contaram a partir do dia da convocação do Plenário do Tribunal Supremo, para realização da eleição. 


A eleição do vice-presidente, em voto obrigatório e secreto, deverá ser feita com pelo menos 2/3 dos juízes conselheiros em efectividade de funções e o corpo eleitoral será constituído por 24 juízes conselheiros do Tribunal Supremo, incluindo os candidatos. 


Para além do Presidente do Tribunal Supremo e dos candidatos ao cargo de vice-presidente do Tribunal Supremo, são eleitores, os juízes conselheiros do Tribunal Supremo, Joaquina do Nascimento, Teresa Buta, João Pitra, José Martinho Nunes, Miguel Correia, Norberto Sodré João, Domingos Mesquita, Norberto Capeça, Aurélio Simba, João Pedro Kinkani Fuantoni, Anabela Mendes Vidinhas, António Fernando Neto da Costa, Raúl Carlos Rodrigues, Artur Domingos Gunza, Inácio Paixão, Ana Bela Couto Valente, Maria Guiomar Carvalho, Pedro Nazaré Pascoal, Paciência Graça Diaquesse Simão e Carlos Alberto Cavuquila (recentemente empossado apesar de toda a polêmica pelo facto de ter sido condenado num processo de gestão de recursos públicos).  


O vice-presidente do Tribunal Supremo tem as competências de substituir o Presidente do Tribunal Supremo nas suas ausências e impedimentos, e de exercer as demais estabelecidas por lei ou determinadas superiormente pelo Presidente do Tribunal Supremo. 


O Tribunal Supremo é a instância judicial do topo da hierarquia dos tribunais de jurisdição comum e os juízes conselheiros do Tribunal Supremo são nomeados pelo Presidente da República, sob proposta do Conselho Superior da Magistratura Judicial, após concurso curricular de entre Magistrados Judiciais, Magistrados do Ministério Público e Juristas de Mérito.