Madrid - Na manhã do dia 26 de Julho, um grupo militar autodenominado Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria (CLSP), anunciou na televisão Pública Nigerina, a destituição do presidente do Niger Mohamed Bazoum eleito em 2021, num processo eleitoral fortemente questionado pela oposição daquele país com várias manifestações. A junta militar suspendeu todas as instituições do Estado, os poderes executivo, judicial e legislativo passaram ao controlo do Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria (CLSP) presidido pelo General Abdourrahmane Tiani até a realização das eleições. Esta junta já suspendeu igualmente a constituição do país, ratificada em 2010. Até o momento, há rumores que o Presidente destituído se encontra detido no Palácio Presidencial, baixo tutela da junta militar.
Fonte: Club-k.net
A junta militar diz ter respondido ao clamor do povo nigerino, que pedia uma mudança radical no país devido a incapacidade do Presidente Mohamed Bazoum em dar respostas sólidas aos problemas que afligem a população nigerina, como: o Iadismo de Alqaeda e do Estado islâmico, a corrupção e a pobreza extrema, no que há anos é considerado um dos países mais pobres de África e do mundo, com uma taxa de mortalidade infantil de 132 por cada 1000 nascimentos, a pesar de ser o quarto maior productor de Urânio do mundo, segundo dados da World Nuclear Association, um país onde 90% da população sobrevive graças a agricultura de subsistência e com a agravante de possuir uma dívida externa contraída aos países que exploram os seus recursos hipotecando, assim, as futuras gerações.
Cabe recordar, que o Niger alcançou a sua independência de França em 1960 e desde então não deixou de viver constantes golpes de Estado, instabilidades políticas, inúmeros conflictos internos, todos estes factos têm impedido o país de sair da pobreza extrema. O presidente destituído, Mohamed Bazoum, nasceu no ano em que o seu país alcançou a independência de França, na região su-oriental de Diffa, no seio de uma tribo arabé nómada com ramificações em Chad e na Líbia, algo que em certos sectores da população nigerina, levanta dúvidas sobre a sua verdadeira origem nigerina. Mohamed Bazoum chegou ao poder pelas mãos do anterior presidente Issoufou Mohamed, de quem era o braço direito, ambos militaram no partido para a Democracia e o socialismo (PNDS). O primeiro presidente do país depois da “independência” de França, o Senhor Hamani Diori, foi derrocado depois de 14 anos, por uma junta militar, de ali em adiante o país foi passando por consecutivos golpes de Estado, sendo que o penúltimo ocorreu em 1999, destituindo o então presidente Mamadou Tandja. Em 2011 houve eleições e o país elegeu o Presidente Mahamdou Issofou. As eleições de 2021, que elegeram a Mohamed Bazoum foram marcadas por muita tensâo, a oposiçâo denunciou fraude, o país sofreu uma série de manifestaçôes violentas, tanto é que dois dias antes da sua tomada de posse houve uma tentativa de golpe de Estado.
O golpe de Estado no Niger, deixa nesta zona do continente africano vários países governados por juntas militares, como é o caso do Mali, o do Burkina Faso, o da Mauritania, o do Sudão do Norte, o da Guiné Conakry e o Chad onde governa desde 2021 o General Mahamat Idriss Déby Itn, filho do mandatário que dirigiu o país com braço de ferro desde 1999, Idriss Deby.
Muitos paises da África ocidental, na sua maior os francófonos, celebram este golpe militar no Niger, porque consideram o início de uma nova era para aquela zona do continente, até o momento colonizada por França e os seus aliados, com a imposição e o controlo do Franco CFA, a extracção e controlo dos recursos naturais destes países, com a permanência, depois de mais de 50 anos, de forças militares francesas nos seus territórios, o controlo do sistema educativo, social e financeiro pela França, impedindo o desenvolvimento real destas economias. França é quem dita a estes países através do seu Banco Central, quantas remessas de Franco CFA devem ser emitidas e que valor deve ter no mercado local, as crianças nas escolas dos países francófonos estudam os conteúdos educativos dictados pela França, no caso do Níger, concretamente, tanto França como Estados Unidos, colocaram neste país as suas bases militares com a desculpa de impedir o avanço do terrorismo no mesmo, quando na realidade aproveitam a sua presença para fazer a extração desenfreada do Urânio e o Ouro nigerino. O urânio é transportado para França para a sua transformação e posteriormente é vendido a países como Irão, Japão, Espanha... entre outros com centrais nucleares. Uma boa parte deste urânio é usado em França para prover a sua população de energia eléctrica. O volume das vendas e/ou dividendos destes importantes recursos extraídos no Níger são enviados para este país em forma de Crédito, aumentando desta forma o valor, já astronómico, da dívida externa para com a França. Trata-se de uma relação abusiva, predatória e desumana. O estádio de coisas já perdura há mais de 50 anos. Os países francófonos naquela região mantêm esta relação. Na verdade, a dívida para com a França é inexistente. A quando das descolonização a França ardilosa e criminalmente estabeleceu normas que têm mantido uma dependência crónica não só do Níger como das demais antigas colônias .
Com o golpe de Estado no Níger e o controlo do país pela Junta militar os negócios destes países acabam em águas de bacalhau, tanto é assim que a população francesa já mostrou a sua preocupação pela exobitante subida do preço da eletricidade em França resultante da falta de abastecimento do urânio do Niger para manter as suas centrais nucleares em funcionamento. Só agora é que a população francesa entendeu que o seu bem estar está associado à desgraça do povo do Níger. Para terem nas suas casas energia eléctrica, significa que no Níger, a população, precisa ser ou tem sido privada deste recurso.
A Comunidade internacional, instou a junta militar a devolver a normalidade, restituindo o Presidente Mohamed Bazoum no cargo, sob pena de tomar medidas drásticas. O Estados Unidos ameaçou com retirar a Ajuda Humanitária, esta ameaça caiu em saco rasgado, já que os nigerinos convidaram-lhes a fazê-lo com total liberdade. Pela primeira vez, em muitos anos, os africanos mostraram-se unidos apoiando o Níger a 100%, indicando que qualquer intervenção em Níger contra a Junta militar, que actuou ouvindo o clamor do povo, será considerada uma declaração de guerra contra Níger e contra todos os países que o apoiam, como é o caso da Burkina Faso e o Mali. Países como Costa de Marfim, de Alassane Ouatara, ou a Nigéria, de Tinubu, que no princípio se mostravam a favor das indicações maquiavélicas e neo-coloniais do Ocidente, enviaram comunicados por via da CEDEAO ( Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental) no final vemo-los a reconsideraram as suas posturas. O Senegal, de Macky Sall, sabendo dos problemas que neste momento atravessa depois da insurreição popular resultante da detenção ilegal do candidato à presidência Ousmane Sounko, não tem nenhuma legitimidade para posicionar-se já que o seu governo também está em plena fragilidade sócio-politica. A Rússia vê nesta instabilidade sócio-politica africana a oportunidade de posicionar-se geo-estrategicamente e deixar na corda bamba os seus inimigos do ocidente consciente da grande dependência destes, aos recursos naturais africanos para a manutenção das suas economias e do seu esforço de guerra.
A África ocidental vê na Rússia e na China, aliados justos, com quem se poderá estabelecer uma relação win-win, já que a Rússia, não necessita do gás africano, porque dispõe deste recurso em seus territórios. E muitos países africanos veem na Rússia aquela potência que apoiou os movimentos de libertação e formou muitos dos seus quadros e nunca colonizou ou usou o seu poderio militar para atacar ou apropriar-se de nenhuma nação africana. O continente africano é grato, mas, verdade seja dita: o imperialismo americano, europeu ou ocidental é exactamente igual ao imperialismo russo. A África precisa ser dona do seu destino e escolher os interesses que melhor sirvam os seus povos. A África não deve ser servil aos interesses imperialistas de quem quer que seja.
Esta situação no Niger, marca um antes e um depois nos países africanos, alguns inclusive se atrevem a chamar esta época, como a nova “ primavera” africana, já que é a era dos jovens fortes e cansados das humilhações do ocidente, dos jovens fartos da incompetência dos sucessivos governos à soldo do ocidente e oriente (dos presidentes que colocam os interesses das potências acima do interesse do seu próprio povo), dos jovens que estão fartos das eleições fraudulentas, mas aprovadas ou validadas pelos países corruptores do Ocidente, dos jovens que estão fartos do silêncio cúmplice da União africana diante de milhares de mortos africanos no mar mediterrâneo fugindo da miséria e falta de oportunidades nos seus países, jovens que nesta era da internet, cansam-se de ver como os outros, filhos de corruptos seus governantes, usufruem dos seus recursos a viverem como reis no ocidente, enquanto eles tenhem que ficar à espera das migalhas. Esta é a era da África que ruge, que diz basta as humilhações, a África de jovens que querem escrever a sua própria história nas suas terras, sem serem obrigados a fugir para a Europa por expressar o que sentem, por exigir um emprego digno, por querer formar uma família de maneira segura, por saber que se adoece terá assistência médica de qualidade e poderá contar com uma educação Universal, gratuita e de qualidade para eles mesmos e para os seus filhos e filhas.
Esperamos que estes golpes de Estado, condenáveis e oportunos, sirvam para o que realmente os motiva, queremos crer, que é a devolução da dignidade ao povo através de um sufrágio Universal transparente, estabelecendo governos sólidos do povo e para o povo.
A Áfrika ruge agora mais do que nunca.
UBUNTU UMOYA.