Luanda - Escrevo estas linhas para corresponder ao apelo lançado pelo jornalista Jorge Eurico que tive a oportunidade de aceder a partir do Club-K reflectindo com todos os da nossa geração de cidadãos, jovens, que têm sido ironicamente categorizados como sendo o futuro da nação, para a alerta geral sobre a consciência de geração nos termos que se seguem:
Fonte: jukulomesso.blogspot.com
Texto dedicado à Adão Ramos, meu amigo
Se entendermos que a juventude, que somos, se encontra envolvida numa luta em que os interesses políticos e económicos beneficiam ainda a geração daqueles que reclamam a autoria das guerras e da independência vindo de todas as sensibilidades políticas e partidárias a partir do maqui, devemos pois admitir que vivemos uma época tenebrosa sobre a nossa trajectória histórica onde a percepção do interesse comum e a consciência de geração se encontram em absoluta crise fenomenológica.
Reparemos no modo como defendemos os partidos políticos em que pertencemos relegando o outro jovem ao plano de absoluto desprezo ou na forma como procuramos justificar os erros dos nossos líderes governamentais e partidários? Não existe maior tendência para a defesa radical do que aquela que acontece mesmo entre nós os jovens.
Mas se repararmos bem para o quadro político mesmo a frente de todos nós, havemos de notar que os partidos políticos junto com as suas ideologias e causas que a nossa geração desconhece o fundo fazem o jogo de pingue-pongue onde as bolas somos nós, os jovens. Quando procuramos analisar a postura da UNITA criticando a forma como encara o sentido de oposição somos tidos como defensores do MPLA; quando procuramos chamar atenção sobre os erros de governação de MPLA somo rotulados como membros da UNITA. Se criticamos o MPLA e a UNITA juntos, então estamos loucos ou perdidos. Eis o jogo de pingue-pongue em que a bola vai de um lado e do outro entre dois jogadores opostos. Pior. Somos mesmos nós os jovens que assim nos acusamos, esquecendo que os mais velhos do MPLA ou da UNITA as tantas arranjam sempre um tempinho para tomarem juntos uns copos celebrizando a forma como manipulam a nossa geração dentro dos seus interesses.
Somos nós que acabamos afastando o outro do nosso convívio por pertencer a um outro partido político com receio de que se formos descobertos pelos nossos não teremos as oportunidades prometidas e depois somos nós que ficamos frustrados porque os mais velhos nunca nos dão o que prometeram. Lembro-me que há mais de 10 anos quando se formou o CNJ (Conselho Nacional da Juventude) os da minha faixa etária eram maioritariamente estudantes e sem qualquer perspectiva de projecção política. Éramos centenas de jovens representando organizações juvenis diversas entre organizações partidárias e não partidárias. O CNJ tornou-se num verdadeiro areópago juvenil onde ensaiávamos já grandes debates sobre a nação no ângulo das preocupações da juventude. Lembro-me que quando a JMPLA (do MPLA) dirigida por Álvaro Boavida Neto como seu Primeiro Secretário e JURA (da UNITA) dirigida pelo Adalberto Katchiungo seu Secretário Geral entrassem em discussão sobre as mais prementes agendas sobre a juventude os dois partidos entravam em alvoroço pela determinação que os jovens tinham na condução dos assuntos juvenis. Ambas as direcções eram muitas vezes chamadas pelas respectivas direcções partidárias para relatórios e planos estratégicos. Era, na época uma verdadeira demonstração de capacidade de exercício político.
Entretanto, apesar da maturidade que tínhamos ao conduzir os assuntos da juventude as nossas resoluções eram sempre condicionadas pelos mais velhos. Assim é que o estatuto de utilidade pública solicitado já no início da formação do CNJ apenas recentemente foi atribuído a organização passando a beneficiar de fundo afectados pelo Orçamento Geral do Estado sem causa visível para o seu atraso e o dia nacional da juventude escolhido para um dia que não seja 14 de Abril continua arquivado. Volvido este tempo quantos de nós saídos do CNJ ganhou a confiança dos seus partidos para a direcção do Partido ou de órgão de soberania do Estado? Dentre as centenas de jovens com discurso estruturado e bem orientado que éramos, apenas Álvaro Boavida Neto foi nomeado Governador do Namibe seguido mais tarde pelo Yaba Pedro primeiro como Deputado a Assembleia Nacional e depois como Vice-Ministro da Juventude e Desporto e Paulo Pombolo como Governador do Uige para além do Reis Cuanga que acabou sendo Deputado a Assembleia Nacional e poucos outros que a memória não apela de momento a representar o MPLA. Ainda por cima com idades acima dos 35 anos num país onde a média de idade atesta a favor da juventude. Quanto a UNITA que era parte do GURN nem para a Assembleia Nacional nem para Governo indicou um jovem sequer para não falar da atitude semelhante seguida pelos outros partidos com assento na Assembleia Nacional.
O que aconteceu com a geração amadurecida de jovens ensaiados pelo CNJ naqueles áureos tempos em que o exercício político entre a juventude era trespassado pela preocupação com o conflito militar e o clima de intolerância política? Simplesmente os mais velhos não cederam lugar para a nossa geração e continuamos a mendigar o nosso momento assumindo cargos menores. E no meio disto tudo, somos os Rottwaillers ou os Pitbulls dos mais velhos quando querem afastar os outros com os quais não se simpatizam publicamente embora nas escuras comam juntos.
Da mesma forma há mais de 8 anos quando eu (agora Jurista), Gilberto Figueira (agora Matemático), Adriano Cristóvão (agora Médico), Paulo Aguiar (agora Geólogo), Celso Gomes (agora Físico), Rafael Aguiar (agora Sociólogo), Valente (agora Engenheiro Civil), Adalberto Costa (agora Economista) entre outros então simples estudantes organizamos a primeira manifestação dos estudantes da Universidade Agostinho Neto envolvendo mais de oitocentos estudantes das diferentes unidades orgânicas, tínhamos tomado uma decisão cujos contornos políticos viriam a ser revelados mais tardes com as mudanças radicais operadas na forma como a Universidade Agostinho Neto era encarada pelo Governo. As exigências dos professores universitários em greve na altura acabaram sendo satisfeitas graças a pressão que exercemos contra o governo numa manifestação que levou-nos a enfrentar a Polícia anti-motim acabando muitos de nós detidos por acusações diversas. Muitos estudantes universitários daquela época ao de lembrar-se desta narração. O que acabou sendo benefício para todos os estudantes e professores foi no momento combatido por outros estudantes e professores que procuraram inclusive desacreditar a legalidade da manifestação. Aconteceu mesmo que fomos acusados de estarmos a servir interesses de partidos políticos da oposição. E que dizia isto? Os outros estudantes jovens que até estavam a viver o mesmo perigo que nós de verem o ano lectivo anulado devido a greve dos professores. Salvamos o ano lectivo e aqueles que nos acusaram também beneficiaram desta operação. Hoje quase todos gostaríamos de ver aquele dia consagrado como o dia do Estudante Universitário em Angola pela coragem única que tivemos em levantarmo-nos contra os abusos que impendiam sobre os estudantes.
Hoje a maior parte daqueles que nos acusaram pretendendo sabotar a manifestação a favor das orientações do MPLA continuam a procurar afirmar-se como profissionais embora tenham já o canudo universitário. Foram enganados com falsas promessas de que teriam a fidelidade premiada.
Tudo serve para ilustrar o quão, a nossa geração, tem sido manipulada pelos mais velhos por causa da falta de solidariedade geracional entre nós. Por isso, não será estranho que este meu discurso apesar de servir a todos nós venha a ser visto por alguns dentre nós como sendo anti-geracional, porque infelizmente ainda continuamos enganados e a manipular interesses que não nos beneficiam. Quando vamos mudar? Quando começaremos a perceber que a medida em que nos atacamos uns contra os outros estamos a comprometer o nosso próprio futuro, a nossa própria realização profissional ou académica, enfim a nossa própria geração?
Levantemo-nos todos! Não contra partidos políticos. Mas contra as nossas próprias consciências. Continuemos o país de todos nós com os interesses que unem a nossa geração. Haja visão comum sobre os interesses económicos e sociais mesmo que as ideologias partidárias sejam incompatíveis. Enfim, apelemo-nos com Jorge Eurico, defendamos os nossos interesses e deixemos de ser ingénuos no momento de unirmos forças. Porque no fim seremos todos, os a favor e os contra, os únicos beneficiários do esforço da nossa geração!