Luanda - Tumultos de domingo na Lunda Sul resultam da falta de políticas públicas voltadas ao dinamismo da província, diz analista. David Sambango entende que atribuir estatuto especial a região já ajudaria a resolver a crise.

Fonte: DW

Em Angola, mais de cem pessoas foram detidas no domingo (08.10) em Saurimo, capital da província da Lunda Sul, quando tentavam marchar para o centro da cidade e foram intercetados pelas autoridades. Segundo a polícia, foram dadas instruções para que a marcha não prosseguisse, mas os manifestantes insurgiram-se criando uma rebelião. Os manifestantes acabaram por ser dispersados com recursos a gás lacrimogéneo e outros meios não letais.

Em entrevista à DW, o analista angolano David Sambango critica a atuação da polícia e entende que tem havido "surdez social" da parte do Governo.

 

DW: A polícia alega que os manifestantes terão se insurgido criando uma rebelião. Contudo responderam com recursos a gás lacrimogéneo e mais de cem pessoas foram detidas. Como classifica a resposta da polícia?

David Sambango (DS): Penso que faltou na Polícia Nacional agir com mais patriotismo e com mais inteligência, porque a questão da violência não se justifica, apesar da estarmos a ouvir os motivos da contestação.


DW: Os motivos da marcha não foram referidos no comunicado das autoridades, mas sabe-se que o mote terá sido a defesa da autonomia da região...

DS: Penso que esses tumultos que cada vez mais se assistem, quer na Lunda Norte, atualmente estamos a falar da Lunda Sul, mas houve tumultos na Lunda Norte em 2022. Isto resulta da falta de políticas públicas voltadas para um maior aproveitamento, um maior dinamismo, dessas províncias que têm uma potencialidade muito grande, sobretudo a Lunda Sul é uma província que tem o seu solo a questão do diamante que gera muita riqueza, mas que as populações não conseguem sentir o impacto positivo nas suas vidas da extração desses diamantes. Portanto, era importante que se criasse quer para a Lunda Norte, quer para a Lunda Sul uma região autonóma ou um estatuto especial [para que as populações] que possam sentir a presença do Estado através de um conjunto de equipamentos sociais e infraestruturas.

 

DW África: E no seu entender, como tem sido o posicionamento do Governo angolano?

DS: A posição do Governo angolano não é a mais adequada. Penso que já deveríamos passar para o Governo um estatuto especial e isso está no programa do Governo do MPLA, no programa de 2022, onde olhava não só para as Lundas, mas também para Cabinda porque são províncias que acabam tendo alguma visibilidade do ponto de vista da extração dos recursos naturais altamente estratégicos que sustentam a economia do nosso país, mas que as populações dessas províncias vivem na indigência social. Penso que está a haver uma surdez social da parte do Governo angolano, isto porque não ouve a aclamação dos cidadãos. E pensamos nós que esta conduta se não for corrigida poderá, volta e meia, permitir que ambientes como estes sejam recorrentes no nosso país. Portanto, o que tem de se fazer para estancar este problema é o Governo ouvir as aclamações dos cidadãos das Lundas, procurar conversar com estas populações e implementar políticas públicas que façam com que eles se sintam parte integrante do território angolano.