Luanda - Em Angola, a persistente violência contra mulheres e meninas tem gerado clamores por ações mais eficazes. Casos recentes, como o trágico assassinato de Charlene, grávida, e o abuso sexual de sua irmã, servem como exemplos hediondos da gravidade dessa problemática. A marcha em 25 de novembro, partindo do cemitério da Santa Ana até ao largo das Heroínas, visa chamar a atenção para a urgência de abordar essas questões.

Fonte: Club-k.net

1. A violência contra as mulheres e meninas em Angola, é um problema social grave. O seu combate por via das leis vigentes ainda é deficitário. Contra o corpo das mulheres e meninas são praticados vários tipos de violência, o feminicídio e as agressões sexuais.


2. Um exemplo recente e hediondo, é o caso da jovem Charlene de 29 anos e a sua irmã[1]. Ela, uma jovem grávida, foi assassinada na sua própria casa e a irmã abusada sexualmente no mesmo local, na província do Zaíre, cidade de Mbanza Congo. Igualmente, o crime de abuso sexual cometido contra meninas na província de Benguela, como foi o caso de Lurdes Manico 19 anos, abusada sexualmente até a morte pelo padrasto.


3. Além destes crimes, muitos outros são cometidos contra as mulheres e meninas em espaços públicos, por parte de pessoas singulares quando as assediam, de funcionários públicos quando se recusam a garantir o exercício de um direito, e por parte das forças de segurança, quando as agridem fisicamente, como a violência policial sobre as mulheres zungueiras- A impunidade e o deficiente cumprimento da legislação vigente, nos casos dos crimes contra as mulheres e meninas leva a normalização de todas as formas de violência contra si praticadas.


4. A violência contra as mulheres e as meninas manifesta-se também pelo fraco financiamento em infra-estruturas escolares que as forçam a frequentar escolas sem o acesso à água, dificultando a sua higiene menstrual.


5. Assim como, a debilidade das maternidades (nos locais onde existem), a insuficiência de postos de saúde e as debilidades no atendimento, continuam a incentivar que mais mulheres realizem partos em casa e de forma insegura. Por fim, o acesso aos métodos anticoncepcionais continua deficitário, e periga cada vez mais o direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.


6. O artigo 30.º da Constituição da República de Angola, é claro ao prever que o Estado respeita e protege a vida da pessoa humana, que é inviolável. O código Penal e a Lei contra a violência doméstica condenam a violência e a tipificam como um crime público. Apesar disto, continua a se registar muitos casos de violência contra as mulheres e meninas. Em 2021 foram registados mais de 7000 mil casos de violência contra menores[FT1] em Angola.[2] No ano de 2022 foram recebidos mais de 6 243 casos de violência contra mulheres. Em 2023 contabilizou-se 902 casos em Luanda.


7. É inaceitável que os nossos corpos não sejam protegidos, sobretudo pelo sistema de justiça. Começando pela instrução destes processos até a demora ou falta de resposta às denúncias e julgamentos destes casos. Reconhecemos os desafios como a fraca preparação dos oficiais de justiça para lidar com crimes de violência cometidos contra as mulheres, além do facto de muitas destas instituições são masculinizadas e desumanizadas. Assim como, a distância entre as instituições e as comunidades. Afinal, como se explica haver apenas um centro de criminalística em Angola? Facto que dificulta o acesso à justiça às vítimas.


8. Os serviços de justiça são burocráticos e morosos[3], para que a vítima tenha acesso à assistência judiciária célere, de modo a ser auxiliada na defesa dos seus direitos violados. Nestas situações, é necessário que a mesma passe uma procuração a favor de advogada/o, conferindo-lhe poderes para o efeito. Acontece que, nos casos em que a vítima não tem bilhete de identidade, tem sérias dificuldades em outorgar a procuração junto do Cartório Notarial, o que pode constituir uma limitação ao seu direito de defesa no processo.


9. Ainda sobre a protecção das vítimas, apesar de o regulamento da Lei contra a Violência Doméstica (Decreto Presidencial n.º 124/13 de 28 de Agosto) prever a criação de espaços de abrigo, não há registros nem relatos do acesso a um espaço de abrigo por parte de vítimas, nem do reencaminhamento a estes espaços, por parte de profissionais da justiça.


É por estes motivos que convocamos todas as pessoas interessadas, singulares ou colectivas, defensoras dos direitos humanos das mulheres e meninas em Angola, para que no dia 25 de Novembro, do cemitério da Santa Ana (símbolo da morte) até ao largo das Heroínas marchemos pelo fim da violência contra mulheres e meninas em Angola.