Luanda - O presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, solicitou, segunda-feira, em Brasília, capital do Brasil, apoio tecnológico aos parceiros do Fórum de Justiça dos Países e Territórios de Língua Portuguesa, ao reconhecer que a digitalização e o uso das tecnologias modernas no contexto na tramitação processual, como mecanismo de promoção da celeridade e de acesso à Justiça, ainda não atingiu os níveis desejados em Angola.

Fonte: JA

Joel Leonardo defendeu ser imperioso que os tribunais estejam instalados próximos dos cidadãos, tornando-os facilmente acessíveis, do ponto de vista geográfico e processual, o que apela à criação de um ambiente digital moderno e proactivo, que permitirá aos tribunais conhecerem, em tempo útil, as questões que lhes forem submetidas.

 

"É neste particular que aqui e agora solicitamos suporte tecnológico de vossas excelências, enquanto nossos parceiros neste Fórum de Justiça dos Países e Territórios de Língua Portuguesa, por nos terem já dado mostras de um caminho com êxitos percorrido por alguns países membros”, sublinhou.

 

Ao dirigir-se aos ministros da corte suprema da República Federal do Brasil e presidentes dos supremos tribunais de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste, Macau e Portugal, Joel Leonardo disse ser impossível ter serviços judiciários seguros, auditáveis ou éticos, sem um aprendizado constante na área da transformação digital que vise uniformizar procedimentos e definir padrões tecnológicos que facilitem a identificação dos utentes com os serviços.

Por outro, Joel Leonardo apontou não ser fácil aprimorar acompanhamentos processuais e consultas de decisões judiciais, sem olhar para as experiências multilaterais, de modo a se construir soluções tecnológicas a favor da garantia ao acesso digital dos cidadãos.

Sobre a realidade de Angola, o presidente do Tribunal Supremo frisou que a informatização dos tribunais era, há dois anos, uma tarefa do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, ou seja, de responsabilidade do Poder Executivo, que há duas décadas fez o ensaio de implementação das plataformas Hábilus – Citus no Tribunal da Comarca de Luanda, mas que não logrou continuidade.

Joel Leonardo acrescentou ainda que na sequência de um protocolo celebrado entre o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos e o Conselho Superior da Magistratura Judicial, em finais de 2019, com vista a consolidação plena da independência dos tribunais e a concomitante autonomia administrativa e financeira, o desiderato da informatização dos tribunais, acompanhado da formação dos utentes, passou a ser tarefa do Conselho Superior da Magistratura Judicial de Angola. "É evidente a necessidade de evolução dos Conselhos Superiores de Justiça, de meros órgãos de gestão e disciplina dos juízes para um verdadeiro órgão de governo do Poder Judicial, garante da independência dos juízes e dos tribunais, mas também, responsável pela eficiência e eficácia do sistema de justiça”, defendeu.

Joel Leonardo acrescentou que, ao se falar da consolidação do Estado de Direito em Angola, considera-se importante apontar o modelo de organização e de funcionamento dos tribunais de jurisdição comum, com respaldo na Constituição de 2010, na qual o legislador constituinte conferiu dignidade constitucional ao acesso à uma justiça célere e eficaz para todos.

"É nesta perspectiva que em Angola existe o Tribunal Supremo, com competência exclusiva sobre a matéria de direito, sendo os Tribunais da Relação instâncias intermédias com competência para julgamento da matéria de facto e de direito”, explicou, apontando que no país existem actualmente 26 juízes conselheiros, 71 juízes desembargadores, 498 juízes de direito e 3.373 oficiais de justiça para um universo de cerca de 32 milhões de habitantes.

No geral, Joel Leonardo defendeu mais trocas de experiências em torno de boas práticas judiciárias e do diagnóstico dos problemas mais candentes que afligem os tribunais dos referidos países, sendo fulcral que seja um caminho conjunto para objectivos comuns, que consistem na busca da vitória do justo sobre o injusto, trazendo soluções digitais para universos difusos, para realidades sem retornos que exigem perspicácia e um olhar actuante, porém, sereno, em prol da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana.


O Judiciário e as novas tecnologias

No seu discurso, Joel Leonardo apontou ainda que a realidade contemporânea demonstra claramente que o Judiciário deve compaginar a sua actuação de harmonia com as exigências da chamada "Era Digital”, lançando mãos ao processo electrónico e incentivar o uso de ferramentas inovadoras que permitam a realização de julgamentos de processos e a correspondente comunicação processual por meio de redes virtuais.

O magistrado disse ser inegável que, actualmente, a Internet e o aparecimento das designadas redes sociais possibilitaram o surgimento de novos formatos de negócios, novas relações de trabalho e uma nova maneira do cidadão se relacionar com o Estado.

"Vamos sim procurar disciplinar o tratamento e a protecção de dados processuais em ambientes digitais inclusivos, caminhando prudentemente para uma governança da Magistratura que se pretende tempestiva, moderna e, acima de tudo, independente”, prometeu, saudando o diálogo interoperacional em busca de soluções digitais que divulguem linhas decisórias das diversas jurisprudências produzidas pelos tribunais dos Países e Territórios de Língua Portuguesa.

"Repare-se que hoje nos nossos tribunais, autuamos expedientes processuais de mais de 100 volumes, podendo nalgumas situações pesarem 150kg ou mais”, referiu, defendendo, por isso, ser urgente que se imprima maior velocidade na digitalização que se impõe em todos os tribunais. Informou que, em Angola, estão a ser dados os primeiros passos neste sentido, criando um sistema integrado de gestão informática dos tribunais, para reduzir a morosidade processual e conferir transparência e fluidez, distribuindo, assim, uma justiça acessível para todos.


Abertura do fórum

A abertura do fórum, que decorre até hoje, no salão nobre do Superior Tribunal de Justiça, contou com a intervenção da presidente do Superior Tribunal de Justiça do Brasil, a ministra Maria Thereza de Assis Moura, que apontou a celeridade processual como uma das principais vantagens da implementação das novas tecnologias no sistema judiciário brasileiro.

Segundo informações do Tribunal Supremo a que o Jornal de Angola teve acesso, Thereza Moura, que também é a presidente do fórum, revelou que "a tecnologia permite aos juízes brasileiros julgar perto de 15 mil processos anualmente”.

A ministra, (uma versão de juíza conselheira em Angola), afirmou ainda que no contexto brasileiro a distribuição de processos é feita de forma electrónica.

Por sua vez, o coordenador geral da Conferência do 11º Fórum dos Presidentes dos Supremos Tribunais dos Países e Territórios de Língua Portuguesa, o ministro João Octávio de Noronha, advertiu aos presentes que a diplomacia não terá sucesso, se a justiça não dialogar, defendendo ainda que "um país que se isola, não renuncia apenas ao diálogo, mas também ao desenvolvimento”.

O fórum em que participam Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Portugal, Moçambique e a Região Administrativa Especial de Macau, decorre sob o lema "Judiciário e as Novas Tecnologias”.