Luanda - Naquele tempo, apesar da guerra, o Natal era vivido com muito ânimo e havia o envolvimento das autoridades locais no sentido de se proporcionar um dia diferente às populações. A festa acontecia no Pavilhão VI Congresso - das maiores obras de engenharia construídas em plena mata. Na fase da sua construção, fazíamos questão de lá ir para ver de perto o movimento dos "catrapilares" e basculantes. Víamos sempre o saudoso Coronel Moisés Chivemba a comandar a obra.

Fonte: Club-k.net

Na véspera do Natal, uma equipa de estudantes do Liceu da Jamba encarregava-se da ornamentação do Pavilhão, com serpentinas e balões de várias cores, para além das pinturas gigantes do nosso professor de Artes Plásticas e Decorativas, o Major Miguel Zavara - um lobitanga de gema, poliglota e contador de histórias. Ele frequentava, com regularidade, a nossa casa, que servia de local de concentração dos benguelenses do Bairro Cmdte Polé-Polé, por onde vivíamos. O tio Chu Leitão, o meu xará, o General Nhany, o tio Perestrelo, nosso vizinho, e, às vezes, o tio Lito Borges, apareciam por volta das 20 horas: tomavam um café e ficavam a conversar até bem perto das 23 horas.

Voltando para as Festas de Natal, tínhamos algumas rotinas, que se repetiam ano após ano: de manhã, era ir à Igreja para assistir à encenação do nascimento de Jesus Cristo e entoar os hinos referentes ao natal. Hoje, não sei se é da idade ou porque os tempos são outros, não vejo aquela emoção na cara das pessoas, nem alegria pelo nascimento de Jesus Cristo; as ruas não são ornamentadas, o ambiente natalício não é vibrante como nos tempos passados, em que era importante vestir roupa nova, até podia ser de fardo, mas para nós, crianças na altura, cheirava a novo. O que importava era vestir “compolixoni” e untar vaselina ao cabelo e ao rosto. Essa era a nossa alegria. Não tínhamos ideia do Natal nas Cidades.

Também sabíamos que nas tardes do dia 25 haveria uma partida de futebol entre a Equipa da Estrela-Negra, anteriormente chamada de Equipa 25 de Dezembro, e a Estrela-vermelha, com relato de Tito Marcolino ou de Felix Miranda. Nesses jogos a Estrela-Negra levava quase sempre a Taça. Os jogadores faziam de tudo para dignificar o seu dia, mas nem sempre dava certo, por vezes, a Estrela-Vermelha estragava a festa dos pupilos do mister Ngamba. Foi o que aconteceu no natal de 1985, no campo pelado do Batalhão de Instrução, em que o anfitrião perdeu por 1 bola a 3, com golos do suspeito de sempre, Zé Manuel (Kafuringa), outro, de Kálias (Kaliambeque), e, de livre directo, marcou, com o seu pé esquerdo, Lito Borges.

Essa era a dinâmica do dia de Natal dos nossos tempos da Jamba, antes da assinatura da paz de 1991.

Acho que o pessoal da Estrela Negra não vai gostar de recordar esse jogo da derrota, mas vou fazer mais como se esta é a verdade?!

Como o tempo já passou e a saudade continua, cá estaremos para contar algumas coisas que vamos nos lembrando do nosso passado comum. Resta-me, apenas, desejar Festas Felizes a TODOS!

Luanda, 23 de Dezembro de 2023.
Gerson Prata