Luanda - É inevitável trazer novamente a debate a morte do Professor Laurindo Vieira.

Fonte: JA

Quando uma figura desta dimensão, Reitor de uma Universidade, figura frequente dos programas de televisão, é abatido em pleno dia, a sociedade é forçada a encarar o que acontece no dia a dia.

 

Podemos imaginar o número de cidadãos desconhecidos que são abatidos por qualquer razão.

 

Lamentavelmente, a nossa Polícia continua a dizer que a situação está calma e sob controlo. É obvio que não está. Qualquer pessoa sensata reconhece os grandes esforços que a nossa Polícia Nacional tem feito para a contenção do crime. A realidade, porém, mostra que a bandidagem tem crescido na mesma proporção. Todos os dias, tanto pelas redes sociais como pela própria Polícia, lemos e ouvimos relatos de crimes que acontecem nas nossas cidades.

 

Há uma crónica discussão se o que se regista é um aumento de crimes ou uma maior divulgação dos casos que acontecem, seja como for a morte praticamente em directo de uma figura nacionalmente conhecida fragiliza o trabalho da PN e coloca-nos a todos com receio de andar na rua. O sentimento, hoje, é que qualquer pessoa está sujeita a que um motoqueiro qualquer nos aborde e nos tire a vida, encomendada ou não.

 

Há uns anos, muitos cidadãos possuíam armas de autodefesa. A PN desencadeou, muito bem, um processo de recolha de armas e muitos cidadãos devolveram às autoridades as armas que tinham. As forças de defesa e segurança também fizeram restrições nas autorizações de porte de armas. Como na altura muitos defenderam, a devolução de armas só faz sentido se a PN tiver capacidade efectiva para defender as pessoas. Não podemos ter um agente da polícia em todas as ruas, nem um para cada cidadão, mas tem de existir a garantia de que há um combate acérrimo contra casos destes e quando eles acontecem os responsáveis são exemplarmente punidos.

 

Casos como a morte do Professor Doutor Laurindo Vieira podem levar ao retorno a um passado de procura por armas para nos protegermos contra os assaltos não só na estrada, mas também em casa. Apesar da grande proliferação de empresas de segurança, alguns cidadãos continuam a ser assaltados nas suas residências com a cumplicidade dos funcionários dessas empresas de segurança e outros, sem poder para os contratar e também não têm qualquer ajuda da Polícia Nacional. Sucedem-se as queixas de cidadãos que em aflição procuram pedir socorro às esquadras da PN e muitas vezes não são atendidos por falta de meios e mesmo de homens.

 

Tudo isso leva e justifica o clima geral de insegurança que vivemos. As declarações da PN, que deveriam ser tranquilizadoras, acabam por ser ainda mais preocupantes, porque não parecem reflectir ou falar da mesma situação que vivemos.

 

Mas este assassinato ao vivo não pode ser visto apenas na perspectiva da Polícia Nacional.

 

Um homem foi abatido a tiro e ficou na estrada a esvair-se em sangue. Em vez de o socorrerem, o indivíduo que fez as imagens estava mais preocupado em filmar. Se não tivesse havido aquela filmagem talvez não estivéssemos tão horrorizados com a situação, mas ainda assim a vida humana, o valor de uma vida, deve estar em primeiro lugar. A prioridade, sem qualquer dúvida, deve ser socorrer a pessoa ferida. Filmar, partilhar, tornar a morte humana num espectáculo não pode ser mais importante do que outros valores éticos da nossa sociedade. Todos nós, e somos muitos, que convivemos, partilhávamos ideias e sonhos com o Dr. Laurindo Vieira, ficamos profundamente abalados com a sua imagem a desfalecer no asfalto, enquanto o autor das filmagens fazia o relato da situação.

 

Depois foram os outros, tão assassinos quanto os autores dos disparos, que foram partilhando vezes sem conta a imagem, como se de um filme de ficção se tratasse.

 

Talvez não haja nenhuma lei, regulamento ou código que proíba isso, mas não está certo. Pior do que isso é que não sabemos como e o que se pode fazer.

 

Aparentemente, este tipo de filmagens consegue o maior número de partilhas e de likes, o que também quer dizer que existe uma vontade das pessoas de verem e de dividir com os amigos. Ao invés de apagarem, partilham e quem não tem liga aos amigos a solicitar que lhe seja enviada. É um estado geral doentio que bem nos fazia chamar o Dr. Laurindo Vieira a explicar. E como ele poucos fariam o diagnóstico real do estado de perturbação psicológica da nossa sociedade.

 

Mudando de assunto. A imprensa deu nota de que saiu em Diário da República, datado de 29 de Dezembro, a suspensão do "subsídio de manutenção de residência e de reinstalação e a subvenção mensal vitalícia a beneficiários remunerados de forma cumulativa, salvo se o beneficiário optar por receber exclusivamente a subvenção mensal vitalícia”.

 

Também foi noticiada a suspensão da atribuição de veículos do Estado para apoio à residência aos titulares de cargos políticos e magistrados, assim como foram reduzidos em 25% os subsídios de instalação para todos os beneficiários.

 

Foi anunciada também a redução das classes dos bilhetes de viagem dos titulares de cargos políticos e magistrados, da 1ª classe para a classe executiva, e dos titulares de cargos de direcção e chefia, da classe executiva para a classe económica.

Três perguntinhas básicas:

1- Estas medidas não estavam anunciadas já em 2018?

2- Se não foram cumpridas naquela altura, que garantias temos agora de que vão ser cumpridas?

3- Sendo que o exemplo vem de cima, quem são os dirigentes titulares de cargos de soberania que vão dar o exemplo?