Luanda - Angola pediu recentemente explicações ao Gabão sobre a invasão da casa do presidente da Comunidade Económica dos Estados da África Central, em Libreville, o embaixador angolano Gilberto Veríssimo, por parte de homens vestidos com a farda militar do país. As relações entre os dois países, já fragéis depois da tomada de poder do Presidente interino gabonês, o General Brice Nguema, podem degenerar numa crise política regional.

Fonte: RFI

Este incidente diplomático vem adicionar mais uma camada de tensão às já frágeis relações entre Angola e o Gabão. Mesmo próximos geograficamente, os laços entre estes dois Estados africanos que integram a Comunidade Económica dos Estados da África Central têm vindo a deteriorar-se desde a chegada ao poder do General Brice Nguema, após um golpe de Estado no fim de Agosto.

 

Em entrevista à RFI, Osvaldo Mboco, especialista em Relações Internacionais ligado à Universidade Técnica de Angola, considera que Angola está a tentar tudo para perceber o que aconteceu na invasão da casa do embaixador Gilberto Veríssimo.

 

"Angola está a tentar verificar ao máximo que aconteceu. Daí, usando os canais diplomáticas, Angola chamou o embaixador do Gabão acreditado em Angola para manifestar o seu descontentamento e pedir esclarecimentos sobre o que está a acontecer", declarou.

O investigador declara que há "mal-estar" entre o Estado angolano e o novo regime do Gabão. Esse mal-estar ficou patente quando num dos últimos encontros de alto nível da CEEAC, o Presidente João Lourenço e a sua comitiva se retiraram da sala quando o Presidente interino do Gabão, o general Brice Nguema, entrou. Mais, a CEEAC chegou mesmo a propor a mudança temporária da sua sede de Libreville para Malabo, na Guiné Equatorial, devido à natureza inconstitucional do regime instituído no Gabão.

 

Estas desavenças vêm influenciar negativamente as relações entre os dois países que têm importantes laços diplomáticos e comerciais, com Osvaldo Mboco a recear que isto possa abrir uma crise diplomática entre Angola e o Gabão.

 

"Se as autoridades gabonesas não esclarecerem ao máximo que de facto aconteceu com o embaixador Gilberto Veríssimo, isto pode levar a uma maior crispação política que pode levar a uma pressão angolana e retirar mesmo de lá o seu embaixador. Se acontecer mais algum incidente do ponto de vista diplomático e político, podemos assistir a uma crise política profunda entre estes dois Estados. E isso não será bom porque geograficamente estamos próximos e pertencemos ao mesmo bloco regional", declarou.

 

O episódio com o embaixador Gilberto Veríssimo pode também prejudicar a imagem externa do novo regime gabonês, já que a manutenção da segurança de diplomatas acreditados é uma das funções primordiais num Estado de Direito.

 

"O que aconteceu com o embaixador Veríssimo pode dar uma imagem internacional que o Gabão é um país instável com o novo regime e é tão instável que embaixadores e corpos diplomáticos, que estão protegidos pela Convenção de Viena, podem estar em perigo e passar uma imagem de insegurança", indicou Osvaldo Mboco.

João Lourenço resiste a legitimar golpistas

Desde o golpe de Estado levado a cabo por militares no Gabão no final de Agosto que depôs o Presidente Ali Bongo, João Lourenço tem mantido as suas distâncias em relação ao novo líder do país, o general Brice Nguema. Num périplo onde visitou vários líderes africanos, Nguema não foi recebido em Luanda.

 

"O que aconteceu no Gabão foi uma alteração à ordem constitucional, houve um golpe de Estado e o Estado angolano entende que em circunstâncias do género, não pode legitimar actos desta natureza. A legitimização dos golpes de Estado em África acontece quando há um apoio popular internamente e, do ponto de vista externo, quando os governos que chegaram ao poder através de golpes de Estado são recebidos por Governos ou Presidentes democraticamente eleitos", indicou Osvaldo Mboco.

 

Luanda tem estado na linha da frente na mediação de vários conflitos africanos e também em diferentes processos de transição democrática após uma onda de golpes de Estado ter deposto os regimes em vigor no Mali, Burkina Faso, Niger ou Guiné. João Lourenço tem-se mostrado firmemente contra estas mudanças repentinas e pelos longos períodos de transições impostos pelos golpistas.

 

"O Presidente João Lourenço não quer estar no grupo dos presidente que legitimam golpes de Estado", concluiu Mboco.