Luanda - Excelentíssima(o)s senhoras e senhores líderes das Centrais Sindicais dos Trabalhadores em Angola, queiram aceitar as minhas fraternais e solidárias saudações, com desejo que tenham dias plenos de realizações e sucessos nas vossas actividades.

Fonte: Club-k.net

Desafios para as Pessoas com Deficiência em Angola

Tomo a liberdade de endereçar-vos a presente reflexão mandatado pelo dever e o direito que me assiste de ser cidadão, como consagrado na Constituição da República de Angola(CRA), e a responsabilidade que recai sobre mim, enquanto activista profundamente comprometido com a causa da defesa, promoção dos direitos humanos e inclusão das pessoas com deficiência.

Fazendo parte dos meus propósitos, contribuir para a promoção do diálogo construtivo e que sejam estabelecidas pontes, visando o alcance de entendimentos profícuos, que blindem o país contra situações geradoras de violações de direitos.

Nos últimos meses, temos testemunhado desentendimentos, entre as Centrais Sindicais dos trabalhadores e o Executivo angolano, sobre temas relacionados aos direitos trabalhistas, também respaldados na CRA, culminando na iminência de uma greve geral, com início previsto para a próxima quarta-feira, 20 de Março do ano em curso. De resto um direito dos trabalhadores.

Enquanto o país se prepara para a paragem laboral, é de todo conveniente considerar o impacto que o despoletar da mesma pode ter na vida das pessoas com deficiência, uma comunidade frequentemente marginalizada em quase todos os eventos que têm lugar em Angola, apesar de a CRA consagrar princípios e normas que estabelecem um tratamento específico para essa franja de cidadãs e cidadãos, tal como a leis ordinárias referem diversos sectores da vida pública, política e social inerentes ás mesmas pessoas, velando pela sua igualdade, equidade e dignidade.

“Segundo o Censo Geral 2014, em relação aos dados das pessoas com deficiência no país, existiam à época 656.258 (2,5%) residentes em Angola com deficiência…sendo que actualmente, em função das 2.435 pessoas com deficiência que foram cadastradas no Sistema de Informação e Gestão da Acção Socia – SIGAS (últimos dados actualizados de 2023), o país tem mais de 658. 693 pessoas com deficiência, sendo 367.103 do sexo masculino e 291.590 do sexo feminino.” (Plano de Inclusão às Pessoas com Deficiência 2023 – 2027 – PLANIAPED 2023 2027).

E essas pessoas, sobretudo as mulheres, têm duas a quatro vezes mais probabilidades de estarem expostas aos vários riscos inerentes aos eventos como o que se avizinha.

Pelo que, a busca pela igualdade e pelo empoderamento de todas as pessoas é um imperativo global, que requer acções coordenadas e inclusivas (vide CDPD e o seu Protocolo Opcional, o Protocolo à Carta Africana sobre dos Direitos Humanos e dos Povos Relativo aos Direitos das Pessoas com Deficiência em África e os ODS).

Para a maior parte das pessoas com deficiência em Angola, o acesso ao emprego já é, em si, um desafio gigantesco devido à escassez de oportunidades e à discriminação no local de trabalho, quando conseguem emprego.

Face à iminência de uma greve geral, que terá lugar de 20 a 23 de Março de 2024, esses desafios podem ser exacerbados. As pessoas com deficiência muitas vezes enfrentam barreiras adicionais para garantir os seus meios de subsistência durante períodos de instabilidade econômica e social.

Durante uma greve geral, ou em consequência dela, os serviços essenciais podem ser interrompidos ou limitados(reduzidos a serviços mínimos), afectando directamente as pessoas com deficiência que dependem desses serviços para a sua saúde, mobilidade e bem-estar.

Por exemplo, a falta de acesso aos transportes públicos acessíveis, cuidados médicos e apoio social pode colocar em risco a segurança e a qualidade de vida dessas pessoas.

Pelo que, é necessário que os serviços mínimos sejam orientados para uma atenção específica e humanizada às pessoas com deficiência.

Além disso, aquelas pessoas com deficiência que queiram poderão enfrentar dificuldades adicionais para participar de eventuais protestos, ou se envolver em actividades sindicais, devido a barreiras arquitectónicas, comunicacionais ou sociais, sendo por isso imperioso que os organizadores da greve e as autoridades considerem as suas necessidades específicas e garantam a sua inclusão e participação plena e efectiva nas discussões e negociações.

No entanto, apesar dos desafios associados, uma greve geral também pode representar uma oportunidade para promover a consciencialização sobre as questões enfrentadas pelas pessoas com deficiência e impulsionar mudanças positivas em direcção à inclusão e igualdade de oportunidades.

A solidariedade entre diferentes grupos sociais, incluindo trabalhadores e pessoas com deficiência, pode fortalecer a luta colectiva por justiça e direitos humanos para todas a cidadãs e todos os cidadãos de Angola.

À medida que o país se aproxima a passos largos da greve geral dos trabalhadores da função pública, é essencial que as necessidades e os direitos das pessoas com deficiência sejam respeitados, protegidos e cumpridos.

Somente com a garantia de uma abordagem inclusiva e equitativa dos direitos trabalhistas, será possível construir uma sociedade verdadeiramente justa e resiliente (não egoísta) para todas e todos o(a)s angolano(a)s.

Luanda, 18 de Março de 2024.

Atenciosamente,
Adão Ramos Manuel
(Activista, defensor e formador dos direitos das pessoas com deficiência)