Luanda - Era uma vez um Rei mandou eliminar todos os idosos do seu reinado. Porém, havia um jovem que decidiu esconder os seus avos. Um dia desse, sentado na sua Corte, uma cobra grande e cumprida subiu no Rei e enrolou-se pelo seu pescoço. Instalou-se o alvoroço na Corte. Ninguém sabia como salvar o Rei. Mandaram chamar toda a gente para reunir-se na Corte. Neste meio ninguém tinha uma ideia concreta para tirar a cobra do pescoço do Rei.

Fonte: Club-k.net

Alguém levantou-se e disse, o Rei mandou matar todos os mais velhos. Se cá estivéssemos com eles teríamos uma solução. Agora, nessas circunstâncias em que nos encontramos não podemos fazer nada. O Rei, sob o perigo da vida, mandou saber se não existisse nenhum mais velho sobrevivo, escondido algures.


Um jovem, que escondeu os seus avos, levantou-se na multidão, dizendo, como foi dito agora, a Sua Majestade mandou matar todos os mais velhos. Este Decreto-Lei está em vigor. Nessas circunstâncias qual será a garantia de trazer aqui um mais velho? O Rei, com o medo da morte, não hesitou em revogar de imediato o Decreto. O jovem foi a correr até ao esconderijo para ter com os seus avos. O avô ficou reticente, achando que aquilo fosse uma armadilha. Mas a avó meditou-se profundamente e disse: no meu ponto de vista, melhor ir lá ver e perceber o que está de facto a acontecer. Porque neste esconderijo onde estamos não oferece-nos qualquer garantia, nem a nós, muito menos aos outros membros deste reino. Com essas palavras sensatas da mais velha, o ancião aceitou assumir o desafio.


Posto na Embala encontrou de facto o Rei na agonia. O ancião olhou ao Rei com desdém, dizendo: tu és criminoso. Porque mandastes massacrar todos os sábios desta terra? Agora tu ficastes ai sozinho. Quem então vai-te salvar desta condição perigosa em que estás neste momento? Agora tens duas escolhas: respeitar escrupulosamente as normas e regras do nosso direito costumeiro, ou ficar engolido pela cobra. O Rei jurou cumprir o direito costumeiro do Reino e nunca mais voltar a cometer os mesmos erros.
Dali o Ancião mandou apanhar o rato; amarrou-o no fio e largou-o em direcçao do Rei. Vendo o rato no chão a circular a cobra desenrolou-se devagarinho do pescoço. O Ancião foi puxando lentamente o fio para trás até que o Rei libertou-se totalmente da cobra. Aproveitaram apanhar a cobra quando ela estava a engolir o rato. Foi metida no saco. Depois de concluir os rituais tradicionais, uma equipa acompanhou o mais velho até ao santuário na floresta dos mortos onde a cobra foi largada.


No momento em que se alargou a cobra sentiu-se um grande estrondo e uma fumaça no santuário. Nesta confusão a cobra desapareceu. A floresta ficou coberta de nevoeiro. Lá na Corte, quanto isso aconteceu, sentiram igualmente um forte abalo da terra, como terramoto. O ancião e sua equipa de jovens saíram dali a correr. Quando chegaram na Embala o mais velho disse a todos: “a nossa súplica foi aceite pelos nossos antepassados.” Agora podemos viver em paz. Mas foi imperativo abrandar os espíritos revoltados e libertar o nosso Reino da maldade e da abominação que haveriam de afectar o nosso Reino de uma geração para outra, e sucessivamente.


Para dizer que, de princípio, uma fábula é uma narrativa curta e imaginária, com um objetivo pedagógico e moral, geralmente protagonizada por animais ou seres inanimados. Portanto, essa fábula ou lenda, como podemos designá-la, tem como objetivo de chamar a atenção aos governantes ao facto de que, o Estado é uma pessoa de bem. Ele não deve ser cruel e injusto. Pelo contrário, ele deve tratar toda gente por igual, cada sector deve ser visto como parte integrante do Estado com os mesmos direitos e deveres. Um Estado não pode tratar as pessoas com intolerância, com desprezo ou com discriminação.


Lembro-me que no tempo colonial havia um dia do mês decretado pelo Estado em que os salários da função pública e das empresas privadas eram pagos em todo território. Os nossos países vizinhos, como Namíbia, pagam os salários e as pensões no mesmo dia. Na Namíbia, por exemplo, neste dia do pagador, há convívios familiares em todos os lares. Portanto, as pessoas têm a previsibilidade das suas receitas e despesas. Evita incorrer em dívidas desnecessárias devidos aos atrasos dos salários ou às inconsistências permanentes do sistema salarial.


Interrogo-me, porque numa Angola independente (49 anos) não tem sido capaz de cumprir cabalmente com os deveres públicos? Olha, isso a tratar-se de um país rico em petróleo e em tantos outros recursos minerais! Porque há discriminação e favoritismo na tabela salarial e no pagamento dos salários? Uns recebem cedo e outros recebem muito tarde? Em Angola ninguém sabe o dia certo de pagamento do seu salário. Isso atrapalha os planos das pessoas, as suas poupanças e despesas. De facto, existe uma anarquia total nos sectores das finanças e do sistema bancário. Os angolanos vivem na aflição e na incerteza permanente. Não percebo bem este fenómeno. Será que isso deve à incompetência, à corrupção ou à ausência da vontade política e do sentido de Estado?


A título de exemplo, nesta quadra festiva da páscoa, todos os sectores públicos receberam os seus salários para passar bem a páscoa com as suas famílias ou deslocar-se às outras províncias visitar os familiares e amigos. Porque os pensionistas da Caixa de Segurança Social das Forças Armadas Angolanas e do Instituto Nacional de Segurança Social foram sacrificados, não receberam as suas pensões? Será por serem da terceira idade? Como se diz, que se lixe!


Enfim, parece-me que, há a mentalidade esquisita em certos círculos da Cidade Alta que acham que a «pensão» é um favor que estão a fazer aos pensionistas. Este círculo do poder não reconhece que a pensão é um fruto do trabalho árduo dos pensionistas e de tantos sofrimentos que assumiram integralmente durante o período mais conturbado do nosso país.


Os sacrifícios consentidos por esta geração sacrificada de mulheres e homens, em prol da Pátria, não tem preço nenhum e não tem recompensa. O Artigo 84o da CRA tornou- se uma letra morta, sem efeitos materiais. Por isso, os Antigos Combatentes e Veteranos da Pátria são abandalhados, e não são tidos nem achados.

Em síntese, o nosso continente tem os mesmos problemas. Porque as suas elites políticas comportam-se da mesma maneira como o Rei-Cobra. Em África existe uma tendência forte de reprimir e afastar os sábios. Aposta-se na mediocridade. Quando o povo estiver na miséria, ele torna-se mais dócil e manipulável. Na condição da pobreza extrema o povo não tem tempo de pensar em grandes coisas. Limita-se a pensar somente na fome e na sua condição de pobreza extrema. O povo é lançado no obscurantismo, no atraso e no subdesenvolvimento. Este quadro é o mais propício para a consolidação da ditadura e da autocracia.


Somente esquece-se que, dentro da sociedade existe sempre pessoas avisadas e esclarecidas como o jovem que escondeu os seus avos. Que ajudou em derrubar o ditador sanguinário que ficou asfixiado pela cobra no seu pescoço. O exemplo concreto mais recente é do povo do Senegal que abriu os olhos, foi resgatar o jovem Bassirou Diomaye Faye da cadeia e coloca-lo no Palácio Presidencial contra as manobras antidemocráticas do Presidente cessante, Macky Sall.


Isso por si só revela claramente de que o povo africano está bem acordado e pronto para alterar o quadro actual do nosso Continente. Repare que, as causas principais das instabilidades políticas, sociais e económicas da África são a manipulação dos processos eleitorais, os golpes constitucionais e a busca de mandatos extras que não estão previstos na Constituição. A corrupção e má governação são os principais desafios da África Subsariana. Portanto, estejamos atentos, o povo não está a dormir, está de pé e com os olhos bem abertos.

Luanda, 01 de Abril de 2024