Luanda - A proposta de Lei do Governo angolano para a nova Divisão Político-Administrativa pretende revogar a Lei nº 18/16, de 17 de Outubro retificada em 2017, que teve como objetivo principal, redefinir a divisão político-administrativa e modelo organizacional do território nacional, de modos a garantir, no essencial, uma capacidade de resposta adequada à prestação de um serviço público mais eficiente às populações.
Fonte: Club-k.net
A par de outras Leis revogadas, a Lei em vigor, revogou também as portarias 18.137-A, de 13 de Dezembro de 1971, de matriz colonial sobre a “Divisão Administrativa de Angola” e, definiu 18 Províncias, 164 Municípios, 518 Comunas e 44 Distritos Urbanos. Com a actual proposta, o país passará a contar com 20 Províncias, 325 Municípios e 375 Comunas.
O relatório de fundamentação da referida proposta apresenta factores exógenos como o crescimento acentuado da população do continente africano, existência de situações de invasão e ocupação de parcelas do território nacional para fins de exploração ilegal de recursos naturais e criação de gado, Tendência de crescimento dos fluxos migratórios para o país. E factores endógenos como, a grande dimensão do país com significativas assimetrias territoriais, a pressão demográfica sobre as zonas urbanas, o recurso à serviços nos países vizinhos pela distância da oferta interna, a exploração ilegal de recursos minerais em zonas distantes das sedes municipais.
Em suma, o Governo diz que pretende com esta proposta de lei garantir a soberania nacional, aproximar os serviços públicos e os gestores públicos da população, proteger os recursos naturais e conservar a biodiversidade, promover o desenvolvimento equilibrado do território, garantir a ocupação integral do território, e por outro lado, racionalizar os serviços da administração do Estado, aumentando a sua eficácia, eficiência e equidade.
No Plano Social e Económico, o Governo diz que a nova DPA proporcionará ao país a Redução das desigualdades e dos índices de pobreza no seio das populações; a Distribuição mais justa e equilibrada do território e do rendimento nacional; o Desenvolvimento económico e social harmonioso do país; a Promoção do bem-estar, da solidariedade social e da qualidade de vida das populações mais vulneráveis; a Criação de condições progressivas necessárias para tornar efectivos os direitos económicos, sociais e culturais dos cidadãos.
Olhando para as premissas apresentadas, até parece que a intenção é boa. Mas como se costuma a dizer, de boas intenções o inferno está repleto.
Ora bem, se realmente a intenção é melhorar a vida das populações, não se percebe porque é que o Governo pensa que a Divisão Político-Administrativa é a melhor alternativa, e não as Eleições autárquicas?
Porquê acha o Governo que a DPA deve ser implementada agora, enquanto que as Autarquias continuam a ser adiadas há mais de 10 anos, quando a complexidade da primeira é maior do que a da segunda?
Porque é que nunca se interessou em criar bens e serviços nessas províncias e municípios que agora se querem repartir e acha que a DPA é a solução?
Porque é que a Divisão Político-Administrativa tem que ser já e agora? O que é economicamente mais viável e urgente, a realização das Eleições autárquicas ou a Divisão Político-Administrativa?
Um outro problema que se coloca tem a ver com a auscultação feita no modelo dos “Conselhos de auscultação dos Governos Provinciais”, e que não são essencialmente inclusivos, deixado de fora os actores críticos e relevantes do ponto de vista histórico, cultural e antropológico. Esses, com certeza, trairiam melhores contributos, caso tivessem sido consultados e ouvidos, se de facto tivéssemos um governo mais aberto e tolerante a opinião contrária, o que significaria exatamente, um governo comprometido com o bem-estar das cidadãs e dos cidadão angolanos.
Outro dos grandes problemas consiste no timing, uma vez que, a referida proposta começa já ser discutida hoje, 05 de Agosto na Assembleia Nacional, sendo que a aprovação da mesma terá de ser dentro do corrente ano. E a entrada em vigor do diploma prevista para Janeiro de 2025, com as novas unidades territoriais a serem já contempladas no Orçamento Geral do Estado de 2025.
E a pergunta que não se quer calar é a seguinte: como é que o Governo irá melhorar a vida dos angolanos (criação de infraestruturas, vias de acesso, formação de quadros para as novas sedes provinciais municipais e comunais) em tão pouco tempo, numa altura em que vozes do próprio executivo têm vindo a público dizer que não há condições financeiras para a realização das autarquias locais? Há verba para sustentar a DPA, mas não há para realização das autarquias?
A conclusão é única: a Divisão Político-Administrativa não irá trazer benefícios nem para os cidadão angolanos e, nem para o próprio Governo que a propõe, sendo que, a montanha irá novamente parir um rato e os seus proponentes sairão mais uma vez descredibilizados.
Inocêncio de Brito, 05 de Agosto de 2021