Luanda - De facto, como temos vindo a analisar, a maior parte dos conflitos em África têm origem nas contradicções decorrentes dos desequilíbrios políticos, sociais,culturais e económicos que ocorrem no seio das sociedades globais, como também de disputas territoriais que tem evocado para a sua solução a realização de “ uma nova conferência de Berlim”.


Fonte: A Capital

 

Isso a acontecer já não será, seguramente, em Berlim, mas numa capital africana. Também não esta a alheia a essa situação de conflituosidade a ambição desmedida de alguns líderes africanos e a influencia das grandes potências mundiais e regionais que buscam, permanentemente, recursos naturais para alimentar a sua indústria. O conflito angolano inseriu-se nesse contexto, agravado pela disputa entre as duas super potências da época. Os Estados Unidos da América e a União das Republicas Socialistas Soviéticas.


 
Com efeito, nos anos 80 e 90, tive a oportunidade, nas várias missões de serviço que realizei, de me encontrar com alguns líderes do continente africano, entre esses, merecem destaque, alguns chefes de Estado e de Governo, como Nelson Mandela, Omar Bongo, Leopold Senghor, Pascoal Lissouba, Hassam II, Mobutu, Ntambo Beki, Jacob Zuma, Museveni e Kagame. Foram encontros demasiados úteis e nas suas reflexões faziam transparecer a problemática da construção do Estado-Nação em África. Debatiam-se, na época, com a essa problemática de construção de novas sociedades, agravado pelo facto de que os territórios que administravam - os novos Estados africanos - tinham herdado fronteiras impostas aos povos de África pelas potências coloniais.


 
Assim sendo, o problema da unidade e coesão nacional continua a ser o calcanhar de Aquiles da maior parte dos Estados modernos africanos. A construção da unidade nacional, do ponto de vista estruturante, continua, de facto, a ser um processo político complexo que tem de se ater as realidades culturais das sociedades africanas o que exige a identificação de elementos de identidade nacional com carateristicas estruturantes, papel que cabe a sociedade politica. Com efeito, as nações africanas, que habitavam o território que é hoje Angola, viviam soberanamente; tendo, a colonização, sobretudo portuguesa, e a partir do século 16, desestruturado as respectivas nações, impondo novos valores e espaços geográficos, cujas consequências se fizeram sentir no seio do nacionalismo angolano que se manifestou em meados do século XX e durante a luta de libertação nacional. Como consequência histórica, o nacionalismo angolano afirmou-se fracturado com reflexos negativos que se fizeram sentir com maior intensidade no período pós – independência, levando os angolanos a uma guerra civil brutal. Três movimentos, com cultura e filosofias políticas e ideológicas diferentes lutaram, cada um a sua maneira, contra o colonialismo português, então inimigo comum dos angolanos, sistema que subjugou durante décadas os povos de Angola que viviam dentro das fronteiras impostas pela conferência de Berlim. Por conseguinte, é, assim, responsabilidade da sociedade politica emergente no seio dos novos Estados modernos africanos construir a sociedade global. Esse processo político exige lideranças visionárias, com sentido de Estado e nação, capazes de afirmar a coesão e a unidade nacional na pluralidade, criar consensos e equilíbrios nacionais, aprofundar o processo de reconciliação nacional e redistribuir com justiça a riqueza nacional.
 


Verificamos nos dias de hoje, e com muita preocupação, que as elites dirigentes de alguns países potencialmente ricos, como Angola, continuam incapazes de proporcionar a camada mais desfavorecida melhores condições de vida. A redistribuição da riqueza continua adiada deixada para as calendas gregas. A violação dos direitos humanos continua a ser uma constante, que se alia a pobreza extrema que se aprofunda e ao agravamento de doenças endémicas. Junta-se-lhes outros flagelos político-sociais, como a falta de transparência na gestão da coisa pública, a corrupção institucionalizada que nega o desenvolvimento, a privatização do Estado e da riqueza nacional, facilidades politicas e economica para a classe dirigente apenas e a ausência de uma fiscalização credível por parte das instituições do Estado.


 
Com excepção do Presidente Mandela, da África do Sul, que se retirou da política activa logo após o fim do primeiro mandato, o pensamento politico e o discurso legitimador da maior parte dos actuais Chefes de Estados e de Governo da África Subsaariana deixa antever o enfraquecimento do processo democrático nos respectivos países. Esta fraqueza reflecte-se na debilidade das instituições e no clima quase permanente de instabilidade politica e social que enferma a maior parte das sociedades africanas. Ironicamente, alguns destes Chefes de Estado e de Governo no poder há várias decadas, ascenderam ao poder por meios violentos, ou seja, por meio de golpes de Estado, assassinato ou guarda-civil.
 

Alcides Sakala