Luanda – O Presidente de Angola, João Manuel Gonçalves Lourenço, foi um dos dois únicos chefes de Estado da SADC (Comunidade de Desenvolvimento da África Austral) a não comparecer à cerimônia de posse do recém-eleito Presidente do Botswana, Duma Gideon Boko, realizada na capital Gaborone.

Fonte: Club-k.net

Embora a presença de outros líderes da região tenha sido notável, o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, também esteve ausente, possivelmente devido a questões internas relacionadas com o processo eleitoral no seu país. Nyusi, no entanto, fez-se representar pelo Primeiro-ministro, Adriano Maleiane, que participou na cerimônia em nome do governo moçambicano.

 

Já a ausência de João Lourenço não foi oficialmente justificada, o que tem gerado especulações. Fontes indicam que a postura do Presidente angolano em relação a cerimônias de posse de líderes africanos pode estar relacionada com considerações de afinidade política. Especula-se que Lourenço evita participar de tomadas de posses de chefes de Estado que não sejam de partidos políticos amigos ao MPLA


O Novo Presidente do Botswana e a Mudança Política

Duma Gideon Boko, até recentemente líder da oposição no Botswana, venceu as eleições de novembro de 2024 e assumiu a presidência após a derrota do Partido Democrático de Botswana (BDP), que governava o país há 60 anos. Boko, à frente da coligação Umbrella for Democratic Change (UDC), obteve um apoio considerável, tanto de figuras políticas locais quanto internacionais. Durante sua cerimônia de posse, ele convidou uma ampla gama de convidados, incluindo líderes políticos africanos como Adalberto Costa Júnior (Angola), Julius Malema (África do Sul) e outras personalidades de destaque do continente.

 

A Postura de João Lourenço na Política Externa

A ausência de João Lourenço em Gaborone não é um facto isolado. Observadores políticos apontam que a postura de Lourenço em relação à política externa tem sido marcada por uma crescente tendência de “militância partidária”, o que se reflete em suas interações com outros líderes africanos.

 

Este padrão de exclusão tem raízes em episódios anteriores:

Guiné-Bissau (2019): Durante as eleições presidenciais, João Lourenço adotou uma postura hostil em relação ao presidente eleito Umaro Sissoco Embaló, favorecendo o candidato derrotado Domingos Simões Pereira, do PAIGC, partido parceiro histórico do MPLA. Esse posicionamento gerou tensão nas relações entre Angola e a Guiné-Bissau.

Malawi (2020): Nas eleições presidenciais de 2020, Lazarus Chakwera, do Partido do Congresso do Malawi (PCM), foi eleito. O partido do Presidente Chakwera tem laços com a oposição angolana, uma vez que a UNITA faz parte da Rede de Democratas da África Austral (SAND). Angola não enviou representante à cerimônia de posse de Chakwera, apesar de o Malawi ser membro da SADC.

Zâmbia (2021): Durante as eleições na Zâmbia, o governo de João Lourenço apoiou Edgar Lungu, candidato do Partido Patriótico (aligned to MPLA), que foi derrotado por Hakainde Hichilema. Após a derrota de Lungu, João Lourenço enviou seu vice-presidente, Bornito de Sousa, à cerimônia de posse de Hichilema, cujas relações com Angola foram descritas como frias, especialmente devido a relatos de apoio financeiro e logístico a Lungu durante a campanha.

São Tomé e Príncipe (2021): O Presidente João Lourenço também se ausentou da cerimônia de posse de Carlos Vila Nova, vencedor das eleições presidenciais em São Tomé, apesar de o MLSTP-PSD (partido histórico aliado ao MPLA) ter sido derrotado. Mais uma vez, o presidente enviou o vice, Bornito de Sousa, para representá-lo.


A Repercussão da Ausência de João Lourenço em Gaborone

A ausência de João Lourenço na cerimônia de posse de Duma Boko, somada aos episódios anteriores, levanta questões sobre a postura de Angola na política externa e suas relações com países da SADC. O facto de o novo presidente do Botswana, um ex-líder da oposição, ter convocado líderes políticos de diferentes espectros ideológicos, incluindo figuras da oposição em Angola, também coloca em xeque a diplomacia de Lourenço, cuja abordagem parece cada vez mais alinhada aos interesses do MPLA, em detrimento de uma abordagem mais abrangente e de maior inclusão política no cenário africano.