Luanda – O discurso proferido por João Manuel Gonçalves Lourenço na cerimônia oficial de abertura do IX Congresso da JMPLA poderá ter sido escrito por assessores brasileiros, segundo análise do conteúdo do documento, que revela uma “mão brasileira” neste, como em outros discursos do também chefe de Estado angolano.

Fonte: Club-k.net

A evidência está em passagens do discurso que ilustram essas gralhas e imprecisões incomuns. No primeiro parágrafo, Lourenço apresenta a JMPLA como “forjador dos quadros de que o Partido e a Nação necessitam para o seu desenvolvimento”.

Um observador e especialista em língua portuguesa, ouvido pelo Club-K, explica que nos discursos dos políticos e acadêmicos angolanos, a palavra "forjador" é incomum, pois normalmente “nós dizemos 'a JMPLA é a forja de quadros do partido...'”.

No quinto parágrafo do discurso, Lourenço diz que “Os membros da JMPLA e, no geral, os jovens angolanos, nunca defraudaram a confiança e as expectativas neles depositadas pelo Partido e pela Nação angolana”.

De acordo com o mesmo analista, a expressão "expectativas neles depositadas" deveria ser "... neles depositados", pois o objeto é "os jovens angolanos".

Já no sétimo parágrafo, o líder do partido destaca que “Na defesa da pátria, na economia, na cultura, na educação e ensino, na ciência, na inovação, no desporto, na construção da paz e da reconciliação nacional, na diplomacia e em outros domínios não menos importantes, os jovens souberam sempre levantar bem alto o bom nome de Angola”.

Segundo o analista consultado, na expressão "e em outros domínios", os angolanos ou os não-brasileiros diriam "noutros domínios".

Foi também detectada uma grande imprecisão no discurso, quando João Lourenço se refere na dissertação que "o país completa dentro de dias cinquenta anos de Independência Nacional". A pergunta é: um evento que vai ocorrer daqui a mais ou menos um ano é "dentro de dias"? Questiona o especialista.

Lourenço também diz, no discurso, que “Queremos uma JMPLA que reflita a esperança e os anseios do jovem angolano, que promova a ética e o civismo, o patriotismo, a tolerância política e o respeito aos velhos, mulheres e crianças e aos mais vulneráveis”.

"O respeito aos velhos", segundo o observador, não é nossa expressão. Nós dizemos "respeito aos mais velhos".

Mais à frente, o líder do MPLA realça que “No futebol, desde o CAN da Côte d'Ivoire, que nossa seleção descolou e se encontra de forma ascendente motivada para ter uma melhor prestação no CAN de Marrocos. Depositamos toda nossa confiança nos nossos jovens jogadores e equipa técnica dos Palancas”.

Quanto a esta passagem, a expressão "a seleção descolou" não faz parte do nosso linguajar. "CAN de Marrocos", quando nós dizemos "CAN do Marrocos".

Foi também notado que há inúmeros casos de omissões de artigos definidos (o, a, os, as), que deveriam estar junto aos substantivos; também há casos de palavras segundo o acordo ortográfico que Angola ainda não implementou (proteção em vez de protecção, conosco em vez de connosco, tênis em vez de ténis). Essas pistas são vistas como suficientes para se afirmar que esse discurso tem mãos não habituais na sua elaboração.

“E isso é também visível no facto de, no discurso em congresso da juventude partidária angolana, se falar mais de questões universais/globais e menos de preocupações locais, de questões do cotidiano da nossa juventude, para as quais o pessoal da JMPLA deve ser mobilizado para arregaçar as mangas e ajudar a resolver”, conforme foi também notado pela mesma fonte consultada.

“Aproveitando este bom momento da nossa seleção, entendemos, no quadro das comemorações do quinquagésimo aniversário da Independência Nacional, convidar a seleção argentina de futebol, a seleção dos gigantes do futebol mundial Diego Maradona e Lionel Messi, para vir a Angola no próximo ano jogar contra os nossos Palancas”, disse João Lourenço no discurso.

De acordo com o parecer dado, “a referência a Maradona não nos deve levar a pensar que o presidente tenha falado como se ele estivesse vivo. Não. Ele diz 'a seleção dos gigantes do futebol mundial Diego Maradona e Lionel Messi'. É claro que, quer Maradona, como Messi, são efetivamente dois argentinos que são gigantes do futebol mundial, só que o primeiro já não está em vida e o segundo está. É o mesmo que dizermos que Pelé e Vini Júnior, brasileiros, são gigantes do futebol mundial, um já falecido e outro vivo."