Luanda - Se dependesse apenas da vontade popular, Abel Chivukuvuku perfilharia uma alternativa à sociedade com potencial de boa performance. Obediente a disciplina partidária fica porém dependente da vontade da base da organização, a quem competirá decidir sobre o rumo que o partido fundado por Jonas Savimbi deverá seguir. Foi para falar sobre a situação política do país que o solicitamos para esta longa entrevista que aqui transcrevemos.


Fonte: VOA

Nos dois  ciclos eleitorais vão trazer o fim do presidente JES

Voz da América - Avaliação da situação política desde que em Fevereiro a Constituição foi aprovada. O quê que constatou de positivo e o quê que constatou de negativo?

 

Chivukuvuku- Eu fui recebendo alguns convites nos últimos tempos, tanto para fazer palestras como para avaliar a nova Constituição. Por opção consciente decidi na altura não fazê-lo, porque achei que era bom dar um tempo  para poder aferir e fazer um melhor julgamento sobre a  III República.

 

Em que circunstâncias ocorre a mudança de uma República para outra? Portanto de acordo com a doutrina jurídica e a ciência política há dois factores fundamentais que determinam o surgimento de uma nova República: de um lado é a adopção de uma nova Constituição, mas que essa nova Constituição tem que introduzir uma alteração profunda das normas constitucionais nos vários domínios da vida nacional. Portanto, de um lado aprova-se uma nova Constituição, mas tem que ter normas que, criam uma espécie de ruptura com o passado diferença. E um  exemplo mais concreto é que a Constituição de 1992 que fez a transição da I República que vigorou desde 1975 até 1992  que introduziu a II República  de facto trouxe mudanças significativas. Quando falo em mudanças significativas, tanto no país, como na vida das pessoas. Uma das temáticas que nos deve ajudar a aferir a qualidade da mudança de uma República para outra é: será que as mudanças constitucionais mudam a vida das pessoas ou não? Claramente vamos ver que a mudança da I República para a II trouxe o fim do Estado totalitário e do partido único.


O quê que isso significou?  Isto significa que evoluímos para um sistema democrático e multipartidário. No país isso mudou completamente! A natureza do Estado mudou! Mas também na vida das pessoas, a vida das pessoas mudou.

 

Portanto enquanto estivemos na I República o Estado totalitário restringia profundamente as liberdades, intrometia-se na vida individual. Sabíamos que no Estado totalitário para poder viajar eram preciso as guias, era preciso as permissões,  etc.


Já o Estado democrático trouxe  a liberdade. As pessoas ficaram livres, com a adopção da Constituição da II República      


 
As pessoas também, a partir daí puderam entrar num domínio de participação política, porque entramos no Estado multipartidário e democrático. Houve uma mudança profunda, profunda mesmo. Por outro lado, a nova Constituição de 1992 introduziu a alteração também, da economia de planificação central, para a economia de mercado e livre iniciativa. Mudou qualitativamente a natureza do Estado angolano, mas também mudou a vida das pessoas.  Até ali era o  Estado o único  agente económico ou o agente económico  preponderante. A partir de então o cidadão também passou a ter a possibilidade de montar os seus  negócios  e os seus  empreendimentos, portanto a  livre iniciativa. Vamos dizer que houve de facto  mudança qualitativa e profunda da I para a II  República e acho que isso talvez deveu-se ao facto de que o autor determinante para a introdução dessas alterações foi a UNITA, e por outro lado o contexto geoestratégico do momento também era de mudança. Estes dois factores obrigaram o MPLA a ceder nas grandes opções que teve ate então e, portanto, tivemos uma mudança relevante.

 

Já me pergunto: da II para a III República, com a adopção da nova Constituição o quê que mudou no país? A vida das pessoas, os cidadãos sentem o impacto de que, afinal, estamos na III República ou não sentem  ?  Porque podemos dizer que sim senhor, passamos para a III República porque do ponto de vista da doutrina jurídica e da ciência politica mudou.Também  houve  algumas normas que mudaram. Mas o quê que isto mudou para o país e o quê que isso trouxe para os angolanos? Tenho muitas dúvidas que para os Angolanos tenha trazido alguma coisa para os angolanos e, mesmo, para a qualidade do país.


Por exemplo, no capitulo dos direitos fundamentais ...


Pergunta-Dr Abel acha que  4 meses seria tempo suficiente para ver-se  na prática algo resultante da Constituição aprovada?

 

Chivukuvuku-Eu dei, deliberadamente este tempo, porque se formos a ver na mudança da I para a II República os Angolanos começaram a sentir imediatamente. A primeira coisa tivemos eleições. As pessoas ficaram livres. Livres  de viajar, livres de  trabalhar. Portanto o impacto foi directo. Isso foi porque a qualidade da mudança foi profunda e positiva. Mas quatro  meses, talvez seja pouco tempo mas alguns indicadores deveriam surgir tanto em termos de normas como da sua implementação.

 

Por exemplo no capítulo dos direitos fundamentais.

 


Não houve grandes mudanças. Houve alguma expansão de algumas normas, mas não houve grandes mudanças. Na prática o quê que isso trouxe para os Angolanos? Não trouxe  nada!  Apesar dessa expansão dos direitos, hoje os angolanos não podem se manifestar, não podem livremente se exprimir.

 

O caso do Alves da Rocha. Talvez posso aceitar que as pessoas digam que o caso dele seja especial, porque era consultor. No meu entendimento apenas as pessoas com cargos executivos ficam vinculados ao principio da solidariedade institucional. Um consultor não. Ele não é Executivo. O Alves da Rocha falou e foi imediatamente... E até nem se quer tiveram uma certa, um mínimo de prudência de aguardar que terminasse o prazo do contrato e rescindissem... É a brutalidade.


Portanto, ao nível dos direitos fundamentais houve teoricamente expansão mas na prática não houve evolução.


Ao nível das normas do modelo de Estado, também não houve alteração significativa. Já tínhamos o Estado unitário que vinha desde a I a II República. Na III República continuamos com o  Estado unitário. Nós já tínhamos um Estado altamente centralizado   que  já vinha desde  a I República até a II República. Na III República exacerbamos a centralidade. Está completamente centralizado. Já tínhamos um Estado democrático de direito do ponto de vista teórico, desde a II República com a Constituição de 1992. Portanto, manteve-se isso.
Mas na prática será que a qualidade do nosso processo democrático vai melhorar na III República? Tenho muitas dívidas! Por exemplo, os conceitos de poder unipessoal e concentração de poderes são contra a prática democrática ou pelo menos não são indicadores que favorecem uma democracia saudável.

 

O modelo atípico de eleição que no meu ponto de vista não é se quer um modelo atípico. No meu ponto de vista foi cancelada  a eleição presidencial. Ou seja deixa de haver!...Não reforça o nosso processo democrático.

 

Não introduzimos novas normas constitucionais para reger a comunicação social. Podíamos ter mudado a qualidade da Alta Autoridade para a Comunicação Social. Podíamos ter encontrado um modelo em que ACS depende da Assembleia Nacional que é um órgão representativo dos angolanos. Mas não, mantivemos todas as regras anteriores.

 

O poder judicial no nosso processo democrático já não era independente, mas foi ainda mais subjugado, como consequência das novas normas relativas a indicação dos seus componentes do presidente da República. Agora, o presidente quase que nomeia todos os juízes. Será que isso vai reforçar a independência dos tribunais ou vai torna-los ainda mais submissos (?) muito mais quando conhecemos a nossa condição social. Portanto penso que do ponto de vista do processo democrático do Estado de direito, nesta III República, também não houve evolução.

 

Pergunta-O facto do  presidente da República como presidente do MPLA ter deixado indicações de que não mais  toleraria a corrupção, aliás foram aprovados novos diplomas legais, não é sinal de preocupação com o fenómeno  daí a guerra aberta, declarada contra a corrupção em Angola?

 


Chivukuvuku-Portanto, não vêem normas profundas na Constituição sobre a qualidade da governação, mas eu quero reconhecer o esforço do presidente da República ao tomar a ideia da “tolerância zero” como uma medida politica. Portanto, espero só que como já houve, outras ocasiões no passado em que houve indicadores de evoluir para uma prática governativa mais correcta e não aconteceu, espero que desta vez de facto  seja uma vontade genuína e que possa ser implementada. Mas eu tenho desde já, uma dúvida e uma preocupação profunda: o facto da adopção do principio da “tolerância zero” ter sido feita a partir de uma data e repito a partir de uma data, indica que o anterior contexto de corrupção, má gestão e desvios foi uma opção deliberada e consciente. Porque, afinal  sabia-se. E essa opção servia propósitos de uma estratégia do poder. Visava permitir a promiscuidade e a permissividade durante um período suficiente para enriquecer os membros do poder e seus familiares. Uma vez realizado o enriquecimento ilícito pronto. Agora já dá para fazer a “tolerância zero”. Só isso cria problemas relativos a capacidade moral dos iniciadores e daqueles que devem de facto profundamente implementar o conceito de “tolerância zero”. Mas espero que se implemente. É verdade que também, sou dos que consideram, não chega  a aprovação da lei de probidade pública. Não chega o facto de  terem sido detidos alguns responsáveis juniores tanto do ministério das Finanças como do banco Nacional. Essa vontade tem que ser substantiva.

 

Por exemplo, a implementação da norma de declarações de bens pelos agentes públicos, porquê que tem que ser secreta? Porquê?! Devia ser pública. Eu  não vejo qual é a justificação. Se eles reconhecem que têm, se acham que tiveram honestamente , qualquer cidadão poderia ou deveria ter o direito de ir lá e dizer: eu quero a declaração de bens do fulano tal. Porque é que tem que se esconder? Só isso -não é verdade- dá um sinal de falta de transparência.  Dá um sinal de que afinal tomou-se uma medida mais ou menos cosmética.

 

Porquê que não se investigam, portanto os casos anteriores, os casos antigos. Nós tivemos neste país grandes casos que foram da comunicação pública que todos angolanos souberam. Porquê que se passa um paninho sobre estas coisas. Porquê que não se cria um mecanismo multissectorial encarregue de conduzir e controlar os concursos públicos do Estado de uma certa dimensão, para não serem as entidades elas próprias,  em que cada ministério faz o seu concurso. Portanto, criava-se um mecanismo encarregue de acompanhar isto, até para evitar que os próprios governantes montassem empresas que concorrem e depois ganham e executam os projectos.

 

Até aqui ainda não senti que há uma vontade forte para formular por exemplo, a natureza do Tribunal de Contas. Porquê que não se vai ao desafio de convidar o Justino Pinto de Andrade para presidente do Tribunal de Contas, uma pessoa que toda a gente sabe que é pessoa séria e honesta. Um Estado que quisesse dar sinais, até podia ir ao ponto de criar a Alta Autoridade Contra a Corrupção que já vem na própria Constituição, indica por exemplo o Marcolino Moko. Aquelas pessoas polémicas, conhecidas na sociedade por fazerem determinados combates só dariam mais credibilidade aos próprios processos. Porque de outra maneira fica difícil entender que quem não tem a dimensão moral de poder de implementar determinadas políticas, porque nelas está envolvido, precisa encontrar mecanismos que credibilizem. Por isso é que eu digo que espero profundamente que de facto essa tolerância zero seja verdadeira, mas que até aqui não vejo sinais.

 

Pergunta- Não acha que isso seria dar retroactividade a lei ou as lei. Este princípio normalmente não é aplicado. Se fossemos a vascular a vida no passado...

 

Chivukuvuku- Eu posso aceitar que a bem do país, para  um país muito traumatizado como é o nosso, esqueçamos o passado. Mas que haja seriedade em relação aos processos actuais.

 


Pergunta: É seu entendimento que com a aprovação da lei da probidade a mensagem que foi transmitida é de que tudo ficou ultrapassado. Precisaríamos é o caso,  de um acto público formal para que as coisas tivessem o perdão da sociedade?


Chivukuvuku:Para mim isto significou o reconhecimento de que tudo aquilo que foi feito no passado recente foi feito em consciência. Há os tais que defendem a teoria de que não se cria ricos de forma honesta. Eu não concordo muito com isto mas há quem acredita. Então permitiu-se isso? E a partir de um determinado momento, a partir de agora fecha. Mas se fecha, fecha sério e que haja medidas concretas e profundas que credibilizem isso. Aceito que para um país como o nosso, foi melhor não vasculharmos o passado, para garantir serenidade para continuarmos com o processo de reconciliação nacional que tem muitas facetas. Mas eu gostaria que a qualidade da governação também mudasse.

 


Pergunta-Mas isto não compromete iniciativas das futuras gerações. É desta ideia também? Se as futuras gerações  quiserem levantar, investigar. É uma possibilidade!

 

Chivukuvuku-Significa que como possibilidade não podemos colocar de parte. Mas como interesse nacional há que reconhecer isso. Salve se quisermos evoluir para o modelo sul africano em que o perdão implica o conhecimento das coisas.


Pergunta-Comissão da verdade? 

 

Chivukuvuku- Comissão da verdade. Estão perdoados, mas precisamos de saber. Pelo menos sabemos que aconteceu assim, assim, assim mas estão perdoados nos vários domínios da vida nacional. E que talvez partíssemos em bases mais profundas. Mas também é verdade que no nosso caso, uma comissão de verdade, como disse o Alves da Rocha, iria expor quase toda estrutura do poder e talvez isto pudesse trazer outros factores de instabilidade, etc.


Numa outra fase da vida nacional em que grande parte dos actores actuais já não estejam presentes  ou não estejam no exercício de funções, podia-se pensar numa coisa dessas. Que perdoamos, mas queremos saber a verdade. E fica-se a saber a verdade e escreve-se a história de Angola  com toda lisura e transparência e com  os factos como factos, mas não usando isso como factor de instabilidade para que de facto aquilo que foi a  história do país no passado  seja alterado.

 

Pergunta-se-nos da qualidade da governação. Qual pode ser o impacto da nova Constituição na  III República sobre a governação?

 

Chivukuvuku-A qualidade da governação é geralmente aferida por via da evolução na qualidade de vida dos cidadãos, ou por via dos indicadores de desenvolvimento humano. E no nosso caso, os indicadores são sempre negativos. Se os indicadores são negativos; se a qualidade de vida não evolui como se esperava temos que concluir que a qualidade de governação é negativa. E para mim, há três características fundamentais para esta qualidade de governação:


-É antipatriótica. Tem laivos que indicam que o governo não tem e nem quer ter um projecto de nação sério que faça uma Angola séria.
A nossa tendência é fazer espectáculos pontuais, o invés de ter um todo estruturado e enquadrado para a realização do país.

 

-A segunda característica é a profunda insensibilidade para com o sofrimento dos pobres. E talvez isto deriva do facto de que a própria estrutura do poder faz pouco esforço para conhecer a própria realidade do país. Não basta conhecer a baixa de Luanda. Não basta conhecer as várias dimensões do país. Não basta conhecer  a baixa. Não basta conhecer o litoral. É preciso conhecer o país para desenvolver políticas para o país que se conhece. Não se faz política para um país que não se conhece.

 

-E a terceira característica é a corrupção que eu espero que agora com a “tolerância zero” se faça um combate nessa direcção.  Mas dum lado, com o surgimento da III República, o presidente anunciou que ira se manter o programa politico aprovado nas eleições de 2008. Os autores na essência, são os mesmos. A prática política até aqui não mostrou ter mudado. Não há indicadores de ter mudado.

 

Portanto, como é que vamos ter a mudança na qualidade de governação se nós continuarmos com esta dimensão? Portanto, é ai onde eu vejo que em termos de factores novos para a vida dos cidadãos, a nova Constituição - pelo menos a  III República - não introduziu factores fundamentais de diferença.

 

Outra dimensão por exemplo da própria mudança das normas constitucionais foi no que diz respeito ao sistema de governo. Aqui temos que aceitar que do ponto de vista teórico, entre as normas da II e da III República houve mudanças. Do ponto de vista teórico. Portanto passamos do sistema (semi-presidencial)   para o sistema presidencial que o Vidal Moreira chamava de presidencialismo exacerbado, ou presidencialismo superlativo. Mas mesmo aqui o meu conceito é um pouco diferente. O que a III República  e a nova Constituição fizeram foi legalizar as práticas da I e da II República quanto ao sistema do governo. O que significa, durante a fase da II República as autoridades foram violando a Constituição e agiram como   se já vivêssemos no presidencialismo. Para mim, a introdução do regime presidencialista não trouxe nada de novo porque a prática já era assim. Em nenhum momento nós tivemos...

 

primeiro, a própria Constituição da II República não clarificava bem, deixava omisso quem era o chefe do governo. Deixava omisso e o tribunal Supremo fez um Acórdão em que o presidente da República é que era o chefe do governo, subvertendo a regra dos sistemas semi-presidencialistas. Portanto, sempre tivemos uma prática presidencialista. O facto de termos evoluído para esta norma, só foi legalizar o que já se fazia. O novo sistema presidencialista quase que cria o poder unipessoal. O poder é o presidente da República! Não há governo! Não há nada disso! Risos...

 

A prática já era assim. O quê que trouxe de novo? No fundo a prática antes já era assim. Era o presidente que determinava as coisas. Portanto era um poder unipessoal, poder de uma pessoa. Portanto tanto na II República como na III não houve diferença.   A III República legalizou a  prática da II República.

 

A concentração de poderes! Sempre foi assim! Acabou-se com a eleição presidencial! Sempre nunca tivemos eleição presidencial! O presidente nunca foi eleito! Tudo que foi só foi legalizar e legitimar aquilo que já se fazia. A subordinação do poder judicial e do poder legislativo.   Sempre foi assim!

 


O meu conceito é de que mesmo  nesta mudança para a III República, a única dimensão da nova Constituição que  trouxe normas diferentes, o que fez foi ajustar as normas a prática prevalecente. Portanto as práticas da I e II República  foram legalizadas.
E nesses termos tenho dificuldades de constatar, quais são os factores novos positivos que a nova Constituição introduziu para que a III República pudesse ser diferente e melhor do que as outras. Pelo contrário penso que  tanto nas normas como na prática a III República veio a significar um recuo em relação a II República.

 

Pergunta-Mas o presidencialismo proposto nos projectos foi inspirado do modelo americano. Qual a diferença que existe entre as duas constituições, a de Angola e EUA?

Chivukuvuku-Todos os observadores, todos os constitucionalistas que falaram sobre a Constituição da III República de Angola chegaram  a conclusão de que o presidencialismo angolano é o mais exacerbado de todos existentes. Não há se quer paralelo. Nos Estados Unidos há um equilíbrio muito forte entre os vários  poderes, tanto entre o poder executivo como o legislativo como o judicial. Nos Estados Unidos o presidente não pode nomear um ministro sem ser aprovado pelo Parlamento. Mas aqui não! O presidente faz e desfaz. No presidencialismo americano há um contrapeso forte do legislativo. Daí a grande diferença. Dali o facto de nós considerarmos que o nosso é, de facto como diz o Vidal Moreira um “presidencialismo superlativo” extraordinariamente exacerbado  e de características unipessoais.

 

Mas mais do que isso. Nas sociedades em que a democracia já ganhou raízes profundas e experiencia, não há muito receio de ter-se  um presidencialismo.  Porque o próprio processo democrático introduz travões. Introduz os “checks and balances”. Nos nossos casos de democracias incipientes -a nossa ainda é muito jovem- não ganhou raízes. Pelo contrário há determinados pressupostos da nossa  democracia que tendem em regredir. Num contexto destes, aprovar o presidencialismo... Por outro lado todos nós sabemos -eu não sei porque razão- mas há uma certa tendência das lideranças africanas, não só optarem pelo presidencialismo, mas em alguns casos irem para além do autoritarismo. Nessas sociedades é aconselhável não ir para modelos de concentração de poderes, porque as próprias personalidades, não diria se é genético ou quê que se passa, ou se será a evolução do próprio processo democrático. As próprias personalidades, os actores  políticos já têm tendência de autoritarismo. Quando se lhes dá as normas que legitimam esse exercício, então essa prática torna-se muito mais grave. Dali, que apesar do meu partido ter apostado no presidencialismo- os colegas sabem qual era a minha posição- mas eu verguei-me a opção do partido, mas sou dos que defendem que no nosso caso talvez não foi tão bom o presidencialismo. Mas está feito. Espero só que a prática politica não enverede para aquilo que hoje já considero  o autoritarismo de caris africano. Espero só que através dos vários ciclos eleitorais, aos poucos os cidadãos comecem a amadurecer  a consciência democrática do país, para ser essa consciência a fazer os travões. Mas, neste país não se pode fazer manifestações, não se pode fazer nada.

 


Pergunta- Como se poderia ter travado isso. Faltou sensibilidade da parte de quem detém a maioria no parlamento? Faltaram contribuições, ou a condição minimizada da oposição justificou o desprezo a que se viu sujeita? Como disse alguém, “qualquer partido na condição do MPLA faria a mesma coisa...”

Chivukuvuku-A qualidade da mudança da I para a II República deveu-se ao facto de que o actor  fundamental para introduzir as transformações de 1991-1992 foi a UNITA. O MPLA tinha tido a opção pelo Estado autoritário de partido único. A UNITA exigiu que evoluíssemos para um Estado democrático e multipartidário e o MPLA teve que ceder. Até na altura o MPLA tinha optado pela economia de planificação central e de intervenção total do Estado. A UNITA exigiu que evoluíssemos para a economia de mercado e o MPLA teve que ceder. Portanto, foi o facto do processo de paz  ter introduzido a UNITA como factor preponderante que determinou essa qualidade. Mas também reconheço, o contexto 1991-1992 correspondeu com a fase da queda do muro de Berlim, com  o fim da guerra fria, com as transformações, com a vitoria do liberalismo democrático. E os actores africanos tiveram que ajustar-se também a essas transformações. É por isso que tivemos um processo razoavelmente equilibrado. Não levou muito tempo.

 

Outros exemplos... A conferencia bipartidária entre o MPLA e a UNITA levou menos de 15 dias e de facto o MPLA teve que ceder nas normas fundamentais. A conferencia multipartidária do MPLA com os outros partidos levou menos de 4 dias. Portanto, havia equilíbrio na força dos  actores. E também o contexto não permitia ao MPLA defender determinadas formulações politicas. Já no caso do processo constitucional do ano passado e deste ano , o MPLA foi o factor hegemónico. E todos nós sabemos que o MPLA não dialoga nem cede as questões fundamentais da sua convicção politica.

 

Entendamos que, do meu ponto de vista, os processos democráticos africanos nem todos foram por iniciativa de convicções.

 

Alguns foram metamorfoses dos mesmos actores. O que significa que, as mesmas pessoas que defendiam o totalitarismo, defendiam o comunismo, o partido único, são os mesmos que de repente mudaram, começaram a falar outras coisas mas do ponto de vista convicções não mudaram, começaram a falar outras coisas.

 

E é por isso que nós tivemos essa evolução que  quando o MPLA tornou-se outra vez hegemónico, como está ainda neste momento hegemónico, a tendência é para modelar a sociedade aos modelos antigos de centralização, poder unipessoal, redução dos factores de vivencia democrática. É uma espécie de regressão as convicções que eles sempre arvoraram. E é preciso que a sociedade e os angolanos com o tempo ganhem consciência disso, para que os próximos ciclos eleitorais introduzam o reequilíbrio das forças políticas em Angola. Ou a reformulação de todo quadro politico da vivência em Angola para que assente verdadeiramente a democracia.


Da expansão chinesa

 

Pergunta-Sente que com a emersão da super-potencia do oriente,  Angola pode estar tentada a seguir o modelo chinês?

Chivukuvuku-A democracia na África pós-independências teve dois períodos históricos. O primeiro período histórico correspondeu as independências dos anos 60. E nessa fase, grande parte dos países adoptaram o modelo europeu de democratização, modelos constitucionais, etecetra  e que em menos de uma década, todos tinham regressado aos modelos de partido único utilizando muitas justificações como sejam o analfabetismo, o problema da existência de tribos, a necessidade  de construção nacional porque não havia ainda identidade nacional. Era outra vez o regresso ao partido único, com poucas excepções como a Gâmbia, Senegal, Botswana, muito poucos. Os restantes países africanos regrediram.

 

Houve uma nova vaga da democracia que foi nos anos 90 impulsionadas pelas transformações geoestratégicas mundiais. Verificou-se que, esse surgimento da democracia nos anos 90 teve um ímpeto, mas dez anos depois 2000-2005 tinha havido de nova regressão.

 


 Esta regressão teve uma característica diferente da primeira. A primeira foi de “jure” e de “facto”, quer dizer  legal e prática. Esta segunda regressão já não está a ser do direito constitucional, mas apenas nas práticas. Situo mais ou menos  Angola neste quadro, em que de 90 para cá regredimos. Já não se alteram as constituições para voltar ao partido único, porque não dá, ou pelo menos porque fica mal ao mundo mas que a prática do exercício político tende a adoptar práticas de partido único, mesmo havendo democracia.

 

É verdade que isso também está a ser mais ou menos, como diria, aceite ou encorajado pelo mundo ocidental  que agora começou outra vez a evoluir no sentido de que talvez os africanos não consigam totalmente implementar as democracias ocidentais e que talvez os africanos precisam sempre de um homem forte.

 


Por isso é que aplaudi quando o presidente Obama disse no Ghana que as sociedades e os países não se constroem com os homens fortes. Constroem-se com processos políticos e instituições fortes e sérias. Mas estamos a voltar outra vez  para os conceitos dos homens fortes em África e  reduzir o impacto dos processos políticos e da democracia e das instituições nas vidas nacionais. Este é mais ou menos um  recuo que vai no sentido da filosofia chinesa, mas não chega. Portanto ter um regime forte para que haja uma economia que cresça porque é suposto que os regimes fortes introduzem um factor de estabilidade necessário. Há mais ou menos a tendência dessa formulação.

 

Só  as pessoas não entendem que os regimes fortes que julgam que a estabilidade deve repousar sobre os ombros de uma pessoa é um risco para a estabilidade desses países. As pessoas não são sobrenaturais.

 


Pergunta-Mas podem passar o testemunho para os filhos...

Chivukuvuku-É o que está a surgir no Gabão, no Togo mas que não acredito que em Angola possa acontecer isto. Mesmo também há um outro factor de risco. Não está necessariamente garantido que os filhos têm características dos pais. Há vários casos e várias situações que quando se passou de pais para filhos de facto os países não conseguiram encontrar sustentabilidade.

 

Pergunta-Qual é a  situação social e económica? O quê que vai acontecendo depois das expectativas criadas? Também não se poderia esperar muito em pouco tempo, diga-se.

 Chivukuvuku-Penso que tivemos uma economia que nos anos 2006/07/08 e uma parte de 2009 houve uma expansão considerável  e que até certa medida criou uma espécie de euforia. Não houve ponderação. Não houve cautelas.


Pergunta-Por parte de quem?

 

Por parte das instituições que também transmitiram essa euforia ao país.
E que de um lado, em função crise internacional  que afectou profundamente Angola por causa da nossa dependência em termos de recursos exportáveis, por outro lado isto está ligado a própria qualidade negativa da nossa governação. Portanto durante os anos de euforia houve açambarcamento dos recursos do país. Houve opções talvez ligados a leituras  que poderiam ter sido feitas de forma diferente. Houve todo esse  quadro de euforia e falta de ponderação e falta de sustentabilidade de algumas opções.

 


Neste momento, sinto que a nossa economia apesar da pequena recuperação ainda vive uma espécie de estrangulamento artificial criado pelas próprias instituições. Significa, as empresas estão a ser todas estranguladas porque o Estado hoje virou caloteiro. Não paga, vão fazendo promessas. O país está praticamente bloqueado. As empresas estão bloqueadas.

 


Pergunta-Houve promessas de pagamento imediato...


Chivukuvuku-Houve imensas promessas, mas há companheiros que acham que há um  estrangulamento artificial propositado. Angola devia encontrar modelos para ir ressarcindo ainda que  parcialmente, de forma a permitir que as pequenas empresas não sucumbam e reganhem o fôlego...

 

Pergunta-Mas para quê estrangular. O que  leva pensar assim?

Chivukuvuku-É difícil aferir isso para nós que não estamos na governação. Mas a perspectiva da eleição em 2012- do ponto de vista constitucional teremos eleições em 2012- há os que justificam que tendo havido uma espécie de sangria de recursos até 2008 na fase da euforia, o governo busca agora amealhar recursos suficientes, para na sua prática de aliciamento dos eleitores poder entrar outra vez  num quadro de despesismo em 2011 e 2012 para ver se consolida ainda mais a hegemonia politica. É por isso que eu chamo a isso de governação antipatriótica, porque não visa a realização do país como tal. Visa, de um lado servir a elite governante e do outro a manutenção da elite governante no poder. Porque neste momento, de facto a economia está estrangulada. E com esse estrangulamento os problemas sociais também agudizam-se.

 

Há que reconhecer que do ponto de vista social durante esses  anos de euforia, houve  crescimento de alguns  empregos, mas muito reduzidos  para aquilo que é a força de trabalho activa disponível. Portanto, o desemprego ainda continua a ser uma das características principais que se está a tornar mais grave com uma espécie de “desertificação” da força laboral no interior, particularmente nas aldeias. Os jovens hoje estão todos a sair das aldeias porque não há incentivos.O país não está a melhor na sua integralidade. E portanto no interior não há incentivos para os jovens poderem ficar lá. Há uma “desertificação” da força laboral  jovem no interior. E há que reconhecer que a força social de Angola ainda é muito grave e não precisa ir longe. Basta andar pelos nossos bairros,  não há luz, água, somos um país que ainda tem crianças fora do sistema de ensino não só no interior e no meio rural mas mesmo nas grandes cidades incluindo Luanda. Os nossos indicadores ainda são muito maus.

 

E espero que  seria bom que como angolanos, não diria que tentássemos mais uma vez aquele exercício da agenda nacional de consenso, até porque agora não dá porque a hegemonia do MPLA não permite ao MPLA dialogar. Já não dialogou naquela altura quando nem se quer tinha essa hegemonia, portanto não dialoga. Mas podíamos tentar  perspectivar a realidade do país para os próximos dez ou vinte anos. O que queremos fazer nos próximos anos para mudar um pouco a natureza da vida nacional!

 

Pergunta-Já agora o quê que acha que podia ser feito para mudar este quadro de uma maneira greal?

Analisar  a evolução num futuro de médio prazo implicaria sempre  que houvesse estudos, projecções, sondagens. Infelizmente na maioria dos países africanos, com excepção de um ou outro como África do Sul, como Ghana talvez.

 


Pergunta-O quê dificulta que estes governos invistam nestes estudos? Publicações de organizações como o PNUD eram publicadas até recentemente.

Chivukuvuku-As instituições internacionais algumas ainda continuam a publicar alguns documentos. Felizmente ainda temos a Universidade Católica que também vai fazendo um ou outro estudo. Mas o que faz com que nós tenhamos pouca tendência para fazer projecções, para fazer estudos, avaliações e etc? Primeiro é que o ambiente e o regime não são receptivos a critica e os estudos têm que cerrar sempre alguma dimensão de critica. As instituições não são abertas para isto e, obviamente as várias  entidades privadas fecham-se. Evitam para não entrar em confrontação o com  sistema. Por outro lado o nosso regime não leva  em consideração  estudos académicos, em termos das suas formulações. Há um grupinho que vai fazendo algumas coisas e não sustentadas. É o caso que tivemos. Alguém foi dizer ao presidente que em quatro anos faz-se um milhão de casas. Não houve estudos sobre que materiais de construção, como tratar da legalidade dos terrenos, a capacidade das empresas de fazerem isso. Como não houve estudos e o sistema não liga a estudos, tomaram isso como uma opção politica.

 

Pergunta- Não é viável, quer dizer?

 

Chivukuvuku-Não é viável! Nem temos material de construção que sustente em quatro anos construir um milhão de fogos…

 

Pergunta-Na visita de campo que o presidente da República fez ao Kilamba Kiaxi, ficou demonstrado que pelo menos ao nível da  nova cidade, uns trezentos e cinquenta mil apartamentos estariam a ser construídos! Somando a totalidade das construções pelo país até 2012 pensava-se que se estaria muito próximo de 1 milhão de habitações, número prometido!

Chivukuvuku-Mas nem sei se é credível essa asserção. São essas coisas que não são sustentadas por estudos credíveis.

 

Pergunta-Sobre o futuro político de Angola a curto e médio prazo. Que cenários poderiam ser desenhados?

Chivukuvuku-Mas mesmo sem projecções  feitas penso que numa circunstância dessas que me coloca vamos fazer uma espécie de cálculo de probabilidade. E há sempre três variáveis a ter em consideração sobre o  que pode ocorrer no país que classifico,  “o mais provável”, “o  provável” e “o menos provável” de acontecer. E, modestamente, penso que o mais provável, em inglês diz-se “the  most likely” de ocorrer nos próximos 10 anos, nos dois  ciclos eleitorais que temos 2012-2017, vão trazer o fim do ciclo histórico político do presidente José Eduardo dos Santos . Portanto nos próximos dez anos vai ocorrer o fim. Quer dizer seja do ponto de vista político, como do ponto de vista  fisiológico, obviamente a carreira do presidente estará no seu fim.

 

Pergunta-Mas ele pode desejar continuar!

Chivukuvuku-Em dois ciclos eleitorais não acredito. Acredito que em 2012 o presidente possa continuar presidente. Mas não acredito que  2017, 2021... continue a ser presidente. Penso que é desejável para ele próprio encerrar bem, não verdade, o seu ciclo histórico politico neste país e que nos próximos dez anos deveria, tanto para interesse dele , como para interesse da República de Angola é bom que nos próximos dez anos seja encerrado o ciclo politico histórico do presidente José dos Santos.

 


Espero também que nos próximos dez anos que vão  incluir dois ciclos eleitorais, tenhamos a maturação do eleitorado e passemos para um voto consciente ao contrário do que tivemos até aqui que é o voto do medo e voto aliciado. Talvez em 2012 ainda não seja voto profundamente consciente mas acho que vai haver já evolução da qualidade do voto entre 2008 a 2012, mas até 2017 vamos começar a ter voto consciente. Portanto haja maturação do eleitorado. Espero, também, que nos próximos dez anos, em termos de variável “do mais provável” haja uma espécie de evolução positiva no processo democrático tanto na prática eleitoral como nas liberdades, como na qualidade da comunicação social pública para que possamos ter uma espécie de universalidade, transparência e justeza de voto. Se nós não fizermos isso nos próximos dez anos, então o nosso processo fica completamente desacreditado. Temos que evoluir para isso.

 

Também espero que nos próximos dez anos se afirme de forma clara uma alternativa e que assuma as rédeas do país, em 2017 ou 2021.

 

É preciso que a alternância e a alternativa sejam os factos e em dez anos pode-se esperar isso. Tanto a UNITA pode ganhar esta predominância ou juntar-se a outros partidos e fazer uma força de mudança. Muita coisa pode ocorrer nos próximos dez anos que pode ser visto como “o mais provável”.

 

Também penso que nos dez anos vamos continuar a ter o crescimento económico, talvez não de forma fulgurante, mas possamos crescer . Na conferencia que houve há dias onde estavam académicos, deve ter sido o Alves da Rocha ou o Rosado que afirmaram que provavelmente nos próximos dez anos, Angola pode passar de sétima economia africana para quinta economia africana. Já seria razoável. Mas também espero que em dez anos haja mudança qualitativa nas filosofias politicas de abordagem do contexto social. Não interessa o país continuar a crescer economicamente, mas o fosso entre os que têm e os que não têm continuar a agravar-se. Há que mudar do ponto de vista mental, há que mudar na formulação das politicas e das filosofias para que de facto possamos crescer economicamente e também os indicadores sociais melhorarem. Acabarmos  com as crianças fora do sistema de ensino, melhorar a qualidade da nossa prestação de serviço de saúde. O problema da água tanto nos meios urbanos como nos meios rurais ser equacionado. Ver bem os problemas de  energia, saneamento básico. Portanto, há coisas fundamentais que deveriam ser abordadas nos próximos dez anos para termos um crescimento um bocadinho mais equilibrado para sermos uma sociedade estável. Podíamos dizer que este é o “wishful thinking” significa é o desejo, mas eu sou positivista e penso que em dez anos podemos mudar. 

 

A “variável provável”  é  o MPLA continuar no poder nos próximos dez anos,  mas que não acredito que consiga manter essa hegemonia asfixiante como temos neste momento. De qualquer das maneiras penso que é inconcebível que o presidente José Eduardo continue para além do ciclo de dez anos e penso que também é provável em termos de segunda variável a continuidade do marasmo. Significa o crescimento económico razoável concomitante com uma degradação social e a manutenção de uma espécie de autoritarismo como já temos hoje.


“O menos provável” ... Eu não acredito que em Angola possam ocorrer mudanças instantâneas, imediatas  e radicais tipo golpes de Estado, revoluções, levantamentos. Penso que a história recente de Angola já criou anti-corpos para qualquer uma dessas possibilidades.


Portanto considero menos  provável nos próximos dez anos ocorrer uma situação dessas. Também considero que é muito menos provável que o presidente José Eduardo continuar para além dos próximos dez anos. Dificilmente pode ocorrer isso. Só se fossemos um país irresponsável. Também penso que com o ritmo actual não vamos conseguir reduzir fundamentalmente a pobreza.

 


São estas três variáveis que eu coloco. Uma positiva, uma equilibrada e outra negativa. E sou muito mais propenso, a positiva que é a mais provável que eu penso que é a que poderá ocorrer nos próximos dez anos. Mas como disse, infelizmente no país não temos sondagens, não temos projecções o que dificulta qualquer avaliação e prognóstico em termos de vivência futura.

 

Pergunta-Nesta perspectiva de criação de alternância credível, qual é a avaliação que faz da oposição de um modo geral e da sociedade civil em particular?

 

Chivukuvuku-A percepção que o contexto transmite é de fragilidade que precisa de ser superada para ganharmos o fôlego todos - forças politicas, sociedade civil e as forças de mudança – porque o país tem que ter alternâncias,  equilíbrios para que os processos políticos sejam mais ponderados. Mas o contexto transmite alguma fragilidade e uma espécie de hegemonia  asfixiante do sistema do poder que utiliza esta hegemonia para tentar fragilizar ainda mais. É preciso um esforço conjunto para não nos deixarmos fragilizar ainda mais. E por outro lado, consigamos evoluir para a afirmação de todas as forças politicas.


Pergunta- Que ambições pessoais alimenta. Não sente que muitos gostariam de tê-lo na liderança de qualquer um projecto de partido ou coisa parecida?

Chivukuvuku-Eu penso que o meu dever é manter-me o angolano patriótico e espero fazer politica talvez, mais 12 anos. É verdade que há determinadas tendências, exigências na sociedade, mas no entanto, a nossa vida politica obriga-nos ao realismo para que não nos deixemos levar pela primeira corrente que aparecer. Portanto, vou manter-me dirigente da UNITA se assim acontecer. Vou fazer politica nos 12 anos, independentemente de que capacidades que tiver. Depois será tempo de ir para a reforma. É preciso dar alguns sinais à juventude de que nem toda a gente tem apego ao poder.

 

Depois disso passaremos  para uma fase de activismo, ligado a uma espécie de perspectiva académica. Não académica no sentido de dar aulas, no sentido de conferencista e escritor. Nessa altura penso que estarei já num quadro de serenidade e maturidade. Já tenho os meus títulos estabelecidos dos livros que quero escrever, o material está preparado, mas só o farei nesta altura. Também dedicar-me um pouco a  conhecer esta grande maravilha que Deus criou e que os  homens criaram que é a terra, penso que é bom. Conheço razoavelmente e vive na África, América do Norte, Europa, mas  conheço pouco a América Latina particularmente a espanhola e também conheço pouco a Ásia e o Médio Oriente. Mas que sim a dimensão patriótica obriga-me ainda a continuar na vida política.


Pergunta-Mas de que forma, ostracizado?

Chivukuvuku-É como disse em todas as capacidades que as circunstancias e o esforço  individuais e colectivos permitirem. Portanto, aberto para todas as opções numa perspectiva realista não só como um dos dirigentes da UNITA e numa perspectiva realista para todas as opções em termos de participação. Não faço disso um finca pé. Não sou daqueles que acho que a  política tem que ser uma questão de vida ou morte, tenho que conseguir... Não. Muito realismo, ponderação, serenidade. Servir em todas as capacidades que tanto individual como colectivamente prepararmos que talvez seja a dimensão mais apropriada. Depois disso, passarmos o testemunho.

 

Pergunta-O Dr Abel não estaria em condições de assumir por exemplo a liderança dum partido político se o tivesse que criar?


Chivukuvuku-O facto de que já fui candidato para a liderança da UNITA indica que eu considero que posso dar um contributo como líder da UNITA se assim for a vontade dos militantes. Não foi assim no Congresso de 2007 e por isso tenho estado predisposto para outras dimensões de servir. Portanto serve-se em várias dimensões e continuarei assim. Se as circunstâncias determinarem e a vontade das pessoas determinar que posso fazê-lo noutras capacidades toda gente também sabe que estou disponível. Mas se o quadro de circunstâncias com todo o realismo maturar para isso, poderemos servir Angola  e penso que podemos servir razoavelmente bem. Não é excessiva confiança mas tudo isso depende do contexto e da vontade das pessoas.


Pergunta-Está entendido. Fale-nos agora deste discurso do Juiz Conselheiro, presidente do Tribunal Constitucional Rui Ferreira de certo modo desencontrado com a prática do executivo no que toca a repressão das manifestações públicas.

Chivukuvuku-Isto resulta da dicotomia inerente aos regimes autoritários e de caris africano, em que uma das características fundamentais é não respeito da lei. Buscam credibilidade fazendo leis bonitas, democráticas, politicas abertas, mas depois fecham a prática. É natureza. E é por isso que por ser natureza é geral. As pessoas se tentarem manifestar-se no Uíge o comportamento do regime é o mesmo de ocorrer em Benguela ou no Huambo. É a natureza so regime. E enquanto não tirarmos esta dimensão de democracia de “jure”  mas fechada na prática vai ser muito difícil. Mas também dificilmente isso vai  ocorrer enquanto tivermos os mesmos actores que foram os mesmos actores de partido único. Mantêm-se as convicções dos estados totalitários de partido único. Metamorfosearam-se para ajustar-se ao contexto presentes, mas em termos de convicções não mudaram e por isso aparecem essas práticas.

 

Pergunta- Ainda na perspectiva do cenário positivista que traçou. Nem sempre a expressão das urnas reflecte a vontade popular. Isto contrariaria em princípio uma visão de esperança que desenhou! Não acha?

 Chivukuvuku- ...tem que haver mesmo evolução. Não podemos ter um processo eleitoral em 2012, tão supostamente desorganizado embora foi desorganização organizada, foi anarquia estrutural, criada, para permitir todo tipo de falcatruas. Nós não podemos transmitir essa imagem ao mundo se queremos ser um país sério. Nós queremos ser um país importante, quinta economia d’Africa, por enquanto somos a sétima. Queremos ser um actor importante na região e faz processos irresponsáveis democraticamente do ponto de vista interno. Não vai ser possível sustentar isso. A credibilidade de um país tem que assentar em vários pressupostos. Não é só porque tem petróleo! A Guiné Equatorial tem petróleo mas não é um país credível. A Líbia tem petróleo... Mas para ser credível ... A África do Sul não tem petróleo mas tem processos políticos sérios e é credível. O Ghana é mais pobre do que nós, mas é muito mais credível do que Angola. Até o Botswana é mais credível do que Angola.

 

Para nós sermos um país credível, temos que ter um país que em termos de processos políticos e institucionais fá-lo com forma séria, honesta e transparente. Temos que ter um país que se diz que é democrático é mesmo democrático. Temos que ser um país com a economia que se diz que continua a crescer, mas que como reverso da medalha do ponto de vista social as pessoas deixam de ser paulatinamente de ser pobres. São todos esses factores que vão fazer a credibilidade de um país. Tanto na vida pessoal como na vida política há um ditado que diz que o mais importante não é o que você me diz, mas é o que você faz. Se você diz  que é democrata mas age anti-democraticamente quem é que vai acreditar que és democrata que é essa a característica  dos nossos actores principais.

 


Pergunta-A corrupção sistémica é uma ameaça sobre os quadros da  nova geração com potencial de ascensão, capazes de integrar novas lideranças. Quer comentar isso!

 Chivukuvuku-Significa o país corre alguns riscos sérios. Porque de um lado a hegemonia asfixiante que impera neste momento aliado a uma problemática de valores que destacam o materialismo como uma das questões mais preponderantes da vida mas materialismo este sustentado por formas ilícitas de o atingir faz com que seja um desafio muito grande, mas para o qual acho que as estruturas actuais e o poder não estão a altura, nem tem vontade, moral para poder transformar estas coisas. Porque quando temos uma cultura que se vai transmitindo de geração em geração, em que a busca da riqueza é o objectivo principal, mas não sustentada por trabalhos sérios, honestos, de iniciativa, mas sustentada pela trapaça, pelos desvios e isso tudo portanto, subverte aquilo que nós queremos criar como valores que sustentem o Estado angolano e a sociedade angolana. É assim, que podemos encontrar  jovens que vêm de outras sociedades que  estudaram em Portugal, na França onde sem dizermos que não haja corrupção, mas onde há um combate sério e a sociedade estrutura-se em bases de valores... Chegados cá dificilmente conseguem resistir e acabam sempre por sucumbir. Porque os tentáculos do sistema de um lado são asfixiantes mas omnipresentes na vida das pessoas. Aqui o fundamental que temos que pensar é que: terá esse regime actual capacidade de regenerar-se ou não? Eu tenho dúvidas!