Luanda - Grande parte dos Oficiais Generais das extintas Forças Armadas Patrióticas e Revolucionárias de Libertação de Angola (FALA) eram jovens oriundos de Institutos ou Liceus da era colonial, que se juntaram à UNITA em 1974. O General Antero Vieira foi um deles.
Fonte: Club-k.net
Na década de 1980, o jovem General ganhou notoriedade ao ser destacado para o Cordão (perímetro exclusivo à residência oficial do Dr. Savimbi), onde liderou as unidades dos Comandos encarregues da guarda pessoal do Alto-Comandante das FALA, o General de Exército Jonas Malheiro Savimbi. Pouco tempo depois, assumiu o chefia de um agrupamento de Comandos de Penetração, que iria instalar-se em Cabinda. Apesar das imensas dificuldades enfrentadas no terreno, o jovem Comandante e os seus intrépidos soldados criaram as suas bases no interior da densa floresta do Mayombe. Acredita-se que o sucesso dessa operação se deveu, em grande parte, à sua habilidade de interagir com o povo local, demonstrando ser um líder visionário e carismático.
Em 1988, o seu feito em Cabinda foi reconhecido publicamente pelo Dr. Savimbi, durante um comício comemorativo dos 22 anos da fundação da UNITA. Naquela ocasião, foi-lhe atribuído o título de Comandante. Apenas ele e o tio Zaboba Njunjuvili, então Tenentes-Coronéis, receberam essa distinção sem serem Oficiais Generais.
Pessoalmente, tive o privilégio de o ver cara a cara durante uma visita de um grupo de oficiais superiores das FALA, chefiado pelo então Coronel Vituzi, ao Liceu Nacional da Jamba. O Coronel, com a sua catana à cintura e a sua "mufuka" na mão esquerda, fez questão de apresentar os membros da sua delegação aos estudantes, um por um. Entre os vários, estavam Assobio da Bala, Ngola Livre e, claro, Antero.
Reencontrei o General Antero em 1992, no Lobito, onde ele exercia a função de autoridade máxima das FALA na província de Benguela. Apesar das responsabilidades elevadas, mantinha uma postura simples e cordial. Curiosamente, naquela época, nunca o vi uniformizado com a farda verde-escura das FALA. Preferia roupas casuais e modernas.
Certa vez, avistei-o numa moto aquática, a fazer acrobacias na praia da ponta da Restinga; noutra ocasião, vi-o ao volante de um Volkswagen Passat cinzento, executando uma curva com velocidade e perícia à entrada do quarteirão do Hotel Grão Tosco. A habilidade do General ao volante impressionava, reflectindo a sua versatilidade: além de liderar homens, era também um exímio condutor.
A 05 de Janeiro de 1993, data da nossa retirada do Lobito, enquanto muitos estavam dominados pelo medo, a serenidade do General Antero funcionou como um calmante para todos. Confesso que eu estava muito apreensivo e pressentia que seria o fim. Os relatos das mortes pós-eleitorais em Luanda eram dramáticos. Morreu muita gente, entre eles colegas e amigos meus de infância. E isso assustava-me. Para piorar, quem saía do Hotel Grão Tosco tinha de passar obrigatoriamente pela ponte Carmona, a poucos passos de uma unidade de polícia. De certeza absoluta, eles não nos deixariam passar sem fazer fogo contra nós. E houve trocas de tiros, mas conseguimos furar. Nestas andanças, andei ao lado do Brigadeiro Silas e do Coronel Cândido Mucha.
Vencido o maior obstáculo, subimos à Bela Vista até aos prédios da TGFA, onde nos instalámos. Por volta das seis horas da manhã, o Dito Chimbili, meu amigo do peito e companheiro da revolução de longa data, pediu-me para o acompanhar em casa de seus pais, os meus tios Justo e Nanda. A decisão do Dito foi a mais acertada. Os tios não sabiam de nada. Enquanto eles arrumavam o essencial, nós regressámos para reportar a situação ao General Antero. Prontamente, o General disponibilizou uma GMC Suburban. No mesmo dia, partimos para o Bocoio.
Terminado o conflito armado, em Abril de 2002, mesmo com a guerra perdida, com os mortos por enterrar, com morteiros gastos, com tudo por refazer, voltei de cabeça erguida ao Lobito. Visitei familiares, passei pelos escombros do Hotel Grão Tosco, fui ao prédio do General Antero, ao lado da Colina da Saudade e do Hotel Belo Horizonte, o actual CHic-Chic. Quis chupar gelado, mas a geladaria Veneza também estava em escombros. Daí, fui à Kaponte para comprar os deliciosos doces da Pastelaria Áurea – e comprei. Tomei um galão. Sentei-me virado para a estrada, como fazia em 1992; também, fui à casa do Walter para o saudar, mas ele tinha-se mudado para o Huambo. Vi apenas as suas irmãs. Desci para o Liro para ver a Sicy. Na Restinga, passei pela rua da casa do tio Chu Leitão e pela casa do Didy, da discoteca Kalema. Era muita saudade do Lobito e das suas gentes. A guerra separou-nos das nossas almas. O regresso a terra aconteceu, mas o reencontro, o verdadeiro reencontro, continua adiado...
Cada vez que vou ao Lobito e passo pela Colina da Saudade e vejo o prédio do General Antero, sinto saudades daquela época. Relembrá-la é honrar a memória de todos que lutaram pela nossa dignidade e liberdade. O General Antero foi um destes filhos de Angola que se destacaram na luta por uma Angola que colocasse o angolano em primeiro lugar.
Bato pala ao Comandante General Antero Vieira!
Lobito, 05 de Janeiro de 2025
Gerson Prata