Ao Exmo Senhor Director
do Semanário Angolense


Antes de mais, queremos deixar claro que somos leitores assíduos deste jornal e, por isso, nos sentimos com legitimidade para apontar alguns elementos que, no nosso modesto entender, consideramos ser autênticos casos de abusos de imprensa e até devassa da imagem de titular de cargo público, pois dão a ideia aparente de beneficiar o jornal, pelas vendas, mas que, no fundo, tem consequências nefastas num aspecto bastante caro no hodierno jornalismo angolano, que é a credibilidade.

 

Fonte: SA

Subsídios para um jornalismo sério e credível

O mote desta «Carta Aberta» é a matéria de capa da edição 377 do Semanário Angolense, que reporta um suposto «encolhimento» do general Kopelipa no círculo restrito do poder. Uma ideia que aparentemente está resumida na questão colocada como manchete do jornal (KOPELIPA ESTARÁ MESMO A «ENCOLHER»?), mas que colide com a ideia «espremida» da matéria no interior do jornal.


Não se trata de nenhuma tentativa de ensinar os profissionais do «SA» a fazerem o seu trabalho, tãopouco abrir uma frente de debate em defesa de quem quer que seja.


Apenas um exercício de análise que fazemos, sublinhe-se, como leitores assíduos deste título periódico com alguma capacidade crítica e preocupados com o factor credibilidade dos nossos órgãos de comunicação, em geral, e do «SA», em particular.


Ora, cá estamos. Como qualquer bom estudante, começaremos logo por identificar as questões mais relevantes e problemáticas do caso em presença. A primeira delas é a escolha em si da figura de capa: o general Hélder Vieira Dias «Kopelipa».


Sobre isso, não tenhamos receio em admitir que estamos em presença de uma manifestação de uso da «lei do menor esforço», já que, sendo a figura em questão dos rostos mais enigmáticos do Executivo, pela natureza do seu trabalho, o director ou editor não terá tido necessidade sequer de queimar neurónios para «bolar» a sua primeira página.

 

Ao que tudo indica, terá bastado um simples mujimbo para que, num estalar de dedos, fosse aos arquivos procurar a «melhor fotografia» para estampá-la na primeira página e depois ir deitar-se descansado, com a sensação de mais um fim-de-semana ganho. O resto é conversa…


Olhando para a capa, e em presença do conteúdo da matéria, não há como negar a sensação de que fomos grosseiramente ultrajados. É que a nossa condição de leitor assíduos, do «SA» e de outros canais de informação, nomeadamente os digitais, muito em voga de um tempo para cá, faz com que nos apercebamos, quase que automaticamente, quando estamos a ser aldrabados.


Foi precisamente a sensação com que ficamos quando acabamos de ler a matéria e constatamos que não existia nada de objectivo, ou seja, nada que possa ser realmente comprovado, por exemplo, em tribunal.


Será que isso não importa para os jornalistas? E a sensação de roubo é ainda mais evidente, quando nos damos conta que mais de metade da matéria já lemos em edições passadas ou nalgum outro lugar há muito tempo.

 

Quanto à matéria propriamente dita, não nos sentimos em condições de abordar, por exemplo, o estado actual da relação entre o presidente Eduardo dos Santos e o general Kopelipa, pois entendemos que se trata de uma questão subjectiva, que o bom senso aconselha a uma análise um pouco mais profunda sobre vários aspectos que interagem nesse dossier. A começar pelo vínculo entre estas duas figuras e depois olhar para aspectos da trajectória comum de ambos. Tudo isso, antes de qualquer juízo de valor, porque entendemos que era bem mais avisado fazer esse exercício prévio, do que se expor de ter de desmentir ou dar o dito pelo não dito.


Contudo, não deixamos de notar alguma hesitação na tese da suposta «retracção da influência» do general Manuel Hélder Vieira Dias. O articulista teria esboçado um recuo, ao escrever (infelizmente com base no pernicioso hábito de ouvir dizer) que «Kopelipa está para lavar e durar» e que «é neste momento a âncora do esquema de segurança do Presidente ». Numa mesma abordagem, o «SA» sai, como se diz, do «oito para oitenta» quando, por um lado, faz uma acusação, ainda que velada, de «indevido aproveitamento do seu lugar e papel no Executivo», por outro, faz menção a «círculos» que ventilam a ideia de que a saída do general Kopelipa da direcção-geral do GRN (Gabinete de Reconstrução Nacional) «não obedecerá a nenhum desígnio para sua penalização, mas que se teria tratado de uma opção dele próprio».


Na verdade, o que fez o «SA» foi bater «no cravo e na ferradura», sem perder de vista a sua vocação mercadológica.


Levaríamos muito tempo e gastaríamos certamente imenso papel se fossemos analisar com a exaustão que se impõe a referida matéria e outras tantas, infelizmente, com sustentabilidade duvidosa.


De resto, como afirmamos, ficaram irremediavelmente lesados os interesses do leitor, com o tratamento algo ingénuo dado à referida matéria, porque consideramos que terá faltado o rigor com que sempre nos habituou o «SA» em questões de objectividade.


Para terminar, não queríamos de deixar de apontar uma inverdade que tem sido divulgada, quanto a nós, sem o mínimo de sustentação, sobre um tal «súbito problema de saúde» do general Kopelipa, segundo afirma o «SA», decorrente de «admoestações que lhe teriam sido feitas pelo presidente da República». Nada mais falso.

 

Não é usual que leitores citem fontes «geralmente bem informadas» em cartas abertas, mas, por uma questão de necessidade, obrigatoriedade até, de pôr fim a um boato que, em de fragilizar a imagem do general Kopelipa, como objectam os seus eventuais detractores, pelo contrário, só acresce na descredibilização dos nossos órgãos de informação. É que nos tais dias em que se comentava a «discreta e rápida evacuação para tratamento em Londres», para nosso espanto, deparamos com o homem em plena cidade de Luanda, desempenhando as suas funções, por sinal acrescidas.

 

Reafirmamos o nosso respeito e admiração pelo elenco redactorial do «SA» e os seus proprietários, encorajando o seu trabalho, por procurar manter-se como produto de referência no jornalismo angolano. Mas,nem por isso nos vamos destituir da nossa capacidade críticas, sublinhamos mais uma vez, como leitores assíduos desse nobre título.


Mais uma vez, o nosso mutíssimo obrigado.


Luanda, aos 27 de Julho de 2010.
Manuel Inocência Quiza (gestor)