Luanda - Lucas Kanangui Soares nasceu a 27 de novembro de 1953, na aldeia de Lukuku, localizada no município do Andulo, na província do Bié. Filho de Bartolomeu Ndumbo Chundumula e Maria Nekandi Soares, desde a infância foi imerso num ambiente onde a educação e os valores familiares tiveram um papel preponderante. Fez a sua iniciação escolar na aldeia natal, continuando os estudos na escola primária nº 48, Andrade Corvo, também no município do Andulo. Mais tarde, seguiu para a Escola Preparatória Justino Mendes de Almeida, em 1974, também no Andulo, onde concluiu o ensino preparatório.
Fonte: Club-k.net
A busca por melhores horizontes levou-o a Luanda, onde, ao contrário da maioria, não foi para estudar ou encontrar trabalho assalariado, mas para iniciar um caminho mais autônomo e árduo: a venda de jornais. Foi, contudo, o incentivo do seu primo falecido, Salomão Katombela, que o levou a inscrever-se no curso de Enfermagem na Escola Técnica de Enfermagem de Luanda, numa época em que as dificuldades eram muitas, mas as suas ambições estavam em crescendo.
O Despertar para a Luta Política e Militar
Após o golpe de Estado de 25 de abril de 1974, em Portugal, e a subsequente entrada dos Movimentos de Libertação nas cidades angolanas, Lucas Kanangui Soares sentiu-se chamado a participar ativamente na luta pela liberdade e pela autodeterminação do povo angolano. Foi entre os meses de agosto e setembro de 1974 que, já em Luanda, se filiou à UNITA, um passo que, na época, não era apenas uma adesão política, mas um compromisso profundo com uma causa maior. No entanto, o seu envolvimento na luta política e clandestina começou ainda antes, com a sua adesão à célula clandestina organizada pelos falecidos Jacob Hossi Inácio e Eliseu Sapitango Chimbili.
A sua militância levou-o até à Base Central da UNITA, em Massivi, na província do Moxico, onde se submeteu aos primeiros treinamentos militares. Foi ali que se iniciou numa vida de luta armada, sendo instruído pelo falecido General Antonino Chiyulo. Após o treino, foi transferido para a base de Samussengue, onde teve a oportunidade de trabalhar com o Comandante-Chefe das FALA, José Samuel Chiwale. A sua ascensão nas fileiras da UNITA foi rápida, desempenhando funções de liderança nas bases de Kasapa, Volonguelo, Kwete, Lunhonde, Kuemba e Munhango.
A Guerra e o Envolvimento com a Logística Militar
Em 1979, Lucas foi convocado para a região militar 17, na então província do Kuando Kubango, de onde foi selecionado para integrar um grupo de cadetes que seguiram para a Academia Real Marroquina. Lá, especializou-se em Inter-Armas e Comando Paraquedista. O regresso à Jamba, em 1981, marcou o início de uma nova fase na sua vida militar. Foi nomeado pelo Alto Comandante, Dr. Jonas Malheiro Savimbi, para as funções de chefe de Logística nas regiões militares 29 e 41.
A sua carreira na UNITA continuou a evoluir, com Lucas a assumir, em diferentes momentos, responsabilidades como chefe de Logística na Frente Estratégica "Estamos a Voltar", chefe dos Transportes da Direção Geral de Logística (DGLOG) e comandante de Logística em várias bases, incluindo Mavinga e Menongue. De 1995 a 1996, desempenhou a função de comandante de Logística da Frente Sul do CFB e foi membro do Núcleo de Logística para a Guerra Convencional.
O Recuo e o Compromisso com a População Civil
Após a queda do Andulo em 1999, Lucas Kanangui Soares recebeu uma missão do Alto Comandante, Dr. Jonas Savimbi, para organizar a retirada da base do Kwame Nkrumah para a zona do Chanji. Ao chegar ao Mulundu, foi responsável por organizar a ajuda humanitária e direcionar as populações deslocadas. Em 2000, foi promovido ao posto de Brigadeiro e recebeu uma missão de vital importância: levar o primeiro grupo de idosos para a República da Zâmbia, missão que cumpriu com o mesmo empenho e dedicação de sempre.
Vida Familiar e Religiosa
Casado com Belmira Rita Chitumba Soares, com quem teve nove filhos (dos quais oito sobreviveram), Lucas Kanangui Soares sempre priorizou a família. Ao longo da sua vida, ele destacou-se como um pai rigoroso, mas afetuoso, que acreditava na importância da educação para os seus filhos e para a sociedade. Para ele, a maior riqueza que poderia deixar para os seus filhos era o conhecimento, e por isso, fez questão de garantir que todos tivessem uma educação sólida, além de estar sempre disposto a acolher outros filhos espirituais, aqueles que precisavam de orientação paternal.
Lucas também teve uma vida religiosa firme. Proveniente de uma família profundamente ligada à Igreja, com a sua mãe sendo diaconisa, Lucas sempre manteve a sua fé em Cristo, mesmo durante os tempos mais difíceis. Após o fim do conflito armado, ele continuou a ser ativo na Igreja e, em 2014, contraiu matrimónio religioso com a sua esposa Belmira, na congregação Derbe, Pastorado de Emaús.
Últimos Anos e Falecimento
Em setembro de 2023, após a perda do seu neto Vanilson, Lucas começou a manifestar sinais de doença. As complicações de saúde pioraram após a morte do seu irmão Samuel, e, em abril de 2024, a biologia revelou a presença de um câncer da laringe. Durante o tratamento, Lucas enfrentou muitas dificuldades, incluindo a necessidade de quimioterapia e outros tratamentos, mas sempre com uma enorme coragem e resiliência. No dia 23 de abril de 2025, a sua saúde deteriorou-se rapidamente, e Lucas faleceu no Hospital Municipal de Viana, a 15h00, deixando para trás uma história de luta, amor e devoção.
Legado
Lucas Kanangui Soares, conhecido pelo seu nome de guerra "Kaimi", deixa um legado incomparável. A sua vida foi marcada por uma devoção profunda à sua família, à causa da UNITA, à educação e à fé. Os seus filhos, hoje adultos, o descrevem como um pai que soube desempenhar o seu papel com rigor, mas também com muito amor. Para eles, Lucas foi mais do que um pai, foi um modelo de disciplina, um amigo e um verdadeiro guia.
A sua trajetória militar, humana e religiosa deixa um legado de compromisso, sacrifício e amor ao próximo. Ao longo da sua vida, ele construiu uma rede de amizades sólidas, não apenas entre os seus camaradas de luta, mas também com a população civil, que guarda com carinho as boas memórias do trabalho e dedicação de Lucas. As mensagens de solidariedade que chegaram de várias partes do país, após a sua morte, são um reflexo do impacto que teve na vida de todos que o conheceram.
Lucas Kanangui Soares partiu, mas o seu legado de fé, luta e compromisso continuará a inspirar aqueles que o conheceram e o admiraram. Que a sua memória seja uma luz, sempre presente, guiando os que ficam para construir um futuro melhor, tal como ele fez durante toda a sua vida.