Luanda - Em Angola, autoridade é sinónimo de abuso. A lei é humilhada pelas próprias mãos que a deviam proteger. Vamos aos factos, com base na memória de uma notícia publicada pelo Novo Jornal. A estória é longa. Mas conta-se de um só fôlego: Mário Tavares é advogado há muitos anos. Há dias, esteve na Secretaria-Geral da PGR, junto ao Serviço de Investigação Criminal (SIC), em Luanda. Já no local, recebeu uma chamada. Saiu do compartimento onde se encontrava para atender o telefone no recinto do SIC, em obediência às normas internas vigentes. Ao fazê-lo, foi agrestemente destratado e escorraçado por mais de dez agentes do SIC.

Fonte: Club-k.net

O causídico foi corrido, insultado e ameaçado por oficiais do SIC. Menos mal. Foi leve. Sei de casos de advogados que, no exercício das suas funções, já foram humilhados, espancados e escalavrados por agentes da extinta Direcção Nacional de Investigação Criminal (DNIC), à entrada da Senador da Câmara.

 

Quando um agente do SIC ou da Polícia Nacional destrata — ou ousa, alegre e impunemente, “plantar um parecer facial com cinco dedos” no rosto de um advogado — estamos perante uma violação grave do Estado de Direito e do próprio sistema de Justiça. Tal atitude desrespeita a dignidade dos advogados, atenta contra os Direitos Fundamentais e impele o cidadão à tentação de fazer justiça pelas próprias mãos. É que, para alguns agentes da Polícia Nacional e do SIC, o advogado é uma peça irrelevante na defesa dos direitos e garantias dos cidadãos.

 

Advogar em Angola é um acto de coragem e resistência. Coragem para enfrentar uma cultura autoritária enraizada nas esquadras policiais e nas instalações do SIC, onde o uniforme e as armas de fogo pesam mais do que a Constituição vigente. Onde a única coisa que se faz de forma competentemente irrepreensível é a distribuição de chocolates e rebuçados. Quando agentes da Polícia Nacional ou do SIC destratam ou agridem (verbal ou fisicamente) advogados, o recado é claro como a luz do luar: Em Angola, quem devia fazer cumprir a Lei é, muitas vezes, o seu primeiro violador.

 

A guisa de remate final, um recado para o ministro do Interior: É urgente reformar a cultura policial. É premente reforçar a protecção institucional aos advogados. É imperioso lembrar que não há autoridade legítima onde não há respeito pela legalidade. Quando um advogado é ameaçado, a sociedade inteira está a ser intimidada. E silenciada. Estamos a criar um país onde pensar alto passou a ser delito, e discordar, um risco de vida. Angola está no caminho (in)certo. Está numa era em que o bruto manda e a lei obedece. Cegamente!