Luanda – Um conflito envolvendo a posse de um terreno no município de Talatona tem gerado controvérsias e acusações de irregularidades judiciais e administrativas. No centro da disputa estão os cidadãos Segunda Frederico e Francisco António dos Santos Sequeira, que são acusados de liderar uma suposta rede organizada de apropriação de terrenos, e o cidadão Leonel Casimiro, que reivindica ser o legítimo proprietário do espaço em litígio.
Fonte: Club-k.net
O caso teve início em 3 de junho de 2021, quando o caseiro de um terreno localizado em Belas foi notificado por um inspetor do Serviço de Investigação Criminal (SIC), identificado como Alfredo Salvador. Segundo Leonel Casimiro, proprietário do terreno, a notificação ocorreu sem que houvesse indícios prévios de litígio sobre a propriedade. Casimiro afirma ter comparecido em 7 de julho de 2021 ao SIC, munido de documentação comprovativa da sua titularidade, mas não obteve acolhimento institucional.
De acordo com o relato, indivíduos não identificados, supostamente sob orientação do referido inspetor, retiraram à força as grades de proteção do terreno, ameaçando o funcionário presente no local. Posteriormente, Segunda Frederico e Francisco dos Santos Sequeira iniciaram um processo cautelar contra um terceiro cidadão, Óscar Casimiro, que segundo documentos disponíveis, não possui relação com o terreno em questão.
O Tribunal da Comarca de Belas, através da juíza Berta Kagira Cahongo, determinou a restituição do terreno em favor de Segunda Frederico, ordenando a entrega do espaço a partir de uma providência cautelar contra Óscar Casimiro. Este último interpôs recurso e submeteu sete reclamações judiciais, todas pendentes até a data, enquanto os requerimentos apresentados por Segunda Frederico teriam sido atendidos de forma célere.
Segundo documentos e depoimentos recolhidos, a decisão judicial foi tomada sem que o proprietário legal, Leonel Casimiro, fosse ouvido e sem verificação da titularidade do lote. Após a sentença, Segunda Frederico e Francisco Sequeira tomaram posse do terreno e deram início à construção de uma estrutura de grande porte, sem licenciamento da administração local.
A Administração de Talatona tentou embargar a obra e emitiu ordem de demolição. Contudo, durante uma tentativa de execução da medida, Francisco Sequeira teria ameaçado, com arma em punho, agentes da polícia e técnicos administrativos. A ação resultou na retirada dos funcionários do local sem cumprimento da ordem.
Na sequência, Francisco Sequeira intentou uma ação judicial contra a administração de Talatona no Tribunal de Contencioso Administrativo, Fiscal e Aduaneiro da Comarca de Luanda. Nesta nova iniciativa, Sequeira alega pela primeira vez ser o legítimo possuidor do terreno e solicita a extinção das medidas administrativas que embargaram a construção.
Documentos apresentados por Sequeira incluem um contrato promessa de compra e venda datado de 2013, alegadamente assinado pelo então administrador municipal da Samba, Adão António Malungo, e uma procuração irrevogável emitida por Isabel Luís de Sousa Neto Lúcio, notária. Há registros públicos de alegações de falsificação documental no consulado de Adão Malungo, o que levanta dúvidas sobre a autenticidade dos documentos.
Uma investigação conduzida pelo Club-K junto ao Governo Provincial de Luanda e à Administração de Talatona resultou na obtenção de documentos que comprovam sua titularidade sobre o terreno:
O terreno foi anteriormente confiscado à empresa Gomes e Irmão, Lda. pelo Estado;
Foi então redistribuído ao Dr. Américo Boa-Vida como parte de um programa de apoio a antigos combatentes;
O lote, identificado como C-029/2001, foi posteriormente transferido para José de Arimateia Félix Bagorro;
Em 2013, José de Arimateia escriturou os direitos de superfície com o Governo Provincial;
Em 2014, Leonel Casimiro adquiriu legalmente os direitos por meio de uma procuração irrevogável;
A escritura definitiva em seu nome foi lavrada em 3 de março de 2021.
Estes documentos encontram-se disponíveis para consulta junto ao Governo Provincial de Luanda e à Administração de Talatona, e confirmam, segundo a versão apresentada por Leonel Casimiro, a legitimidade da sua posse.
O caso levanta diversas interrogações sobre o funcionamento das instituições judiciais e administrativas em Angola, principalmente no que se refere à resolução de disputas fundiárias. Observadores e juristas ouvidos de forma informal destacam a necessidade de maior rigor na verificação documental por parte dos tribunais, bem como o fortalecimento dos mecanismos de fiscalização e resposta por parte das administrações municipais.
O desfecho do caso permanece indefinido, e continua a gerar preocupação entre moradores e cidadãos afetados por disputas semelhantes, muitas vezes marcadas por conflitos entre títulos legítimos e ações judiciais controversas.