Luanda - A propósito das idiossincrasias subjacentes as mudanças nas toponímias das cidades e vilas e/ou na mudança dos nomes de dezenas de ruas, avenidas, edifícios públicos e praças deste nosso belo país, que personalidades de relevo na vida das cidades e vilas são oriundas das mais diversas sensibilidades políticas?

 

* Docente Universitário
Fonte: Club-k.net

 
Numa leitura que privilegia Angola como espaço de referência, este artigo, que se conjuga na intersecção entre a cidadania e a história, procura questionar continuidades coloniais no presente, revisitando, ao espelho, os complexos debates que formatam a intervenção política a partir da nossa independência nacional em Onze de Novembro de 1975.

 

Durante décadas o debate em torno da História política de Angola tem sido um assunto tabu que urge agora inverter. Consciência da crise ou crise da consciência?

 

 Trinta e cinco anos volvidos sobre o fim do holocausto colonial português no território que se convencionou chamar Angola, é chegado o tempo de repensar e de vencer os silêncios do passado.

 

Entretanto, é necessário deixar bem claro, nesta tentativa de conceituar o mito da toponímia de Angola pós independência, que o mesmo não tem aqui a conotação usual de fábula, lenda, invenção, ficção, mas a acepção que lhe atribuíam e ainda atribuem as sociedades arcaicas, as impropriamente denominadas culturas primitivas, onde mito é o relato de um acontecimento ocorrido no tempo primordial, mediante a intervenção de entes sobrenaturais. Em outros termos, mito, é o relato de uma história verdadeira, ocorrida nos tempos dos princípios, quando com a interferência de entes sobrenaturais, uma realidade passou a existir, seja uma realidade total, o cosmo, ou tão-somente um fragmento, um monte, uma pedra, uma ilha, uma espécie animal ou vegetal, um comportamento humano. Mito é, pois, a narrativa de uma criação: conta-nos de que modo algo, que não era, começou a ser.

 

Toda a experiência revolucionária se constrói em torno de grandes ideais de mudança, transformação e renovação social. São as grandes narrativas simbólicas e mitológicas colectivas que surgem e se renovam com grau de intensidade e visibilidade muito diferentes, mas que têm como objectivo primeiro construir uma interpretação da sociedade através do tempo, não só fornecendo sentido ao passado, como iluminando os caminhos do futuro.

 

As cidades renovam-se. Abrem-se nelas novas ruas, constroem-se novos prédios, novas casas, novos espaços. E, a par deste movimento de crescimento e renovação, há também o desejo de preservar a memória da cidade, materializada em pedra, construída na alma dos seus habitantes, nas suas tradições e costumes mais arreigados.

 

Sendo que Angola é de todos, é meu propósito, aqui, recordar o assunto e reflectir sobre o (s) critério (s) e a especificidade do discurso retórico e a performatividade da linguagem política que o (s) actor (s) utiliza para a toponímia dos espaços públicos de Angola. É mero exercício de propaganda ou assunto sério? Ou é mais uma vez o não olhar à meios para alcançar os fins?

 

 As representações da história medeiam as relações sociais e os processos identitários, sendo instrumentais na criação e gestão identitária, ao determinar, de forma fundamental, que projectos e perspectivas são vistos como legítimos e validados através de actos de memória.

 

Em Angola, as lutas pelas memórias no reconstituir de sentidos e de novos espaços políticos infelizmente, continuam marcadas pelos impactos negativos da fractura abissal entre a hegemonia do MPLA por um lado e a exclusão no processo, dos outros dois movimentos e/ou partidos políticos que com estoicismo revolucionário também ajudaram a libertar o País do jugo colonial para a conquista da liberdade e independência e nos legarem esta ditosa Pátria africana: Angola.

 

Quanto às idiossincrasias, estas deveriam ser representativos e actuar segundo critérios suprapartidários. Desde logo, a sua opção deverá orientar-se no sentido de atribuir o nome de espaços públicos a personalidades já falecidos e que na sua vida tenham tido uma relação próxima e directa com a cidade. Quem foi, que deu origem aos nomes das ruas, escolas e hospitais de Luanda? Quanto à relação da cidade de Luanda com Che-Guevara, Ho-Chimin, Josina Machel, Gangula e Zeca o que dizer?

 

Poderia não haver unanimidade na indicação de tais personalidades, não importa; são regras da democracia e da boa governação. Angola é terra de Liberdade e legado de nossos antepassados, merece respeito!