Luanda - Está a circular entre os membros da família Pinto de Andrade uma extensa e algo emotiva carta assinada pelo Rui Falcão e endereçada «aos meus queridos Tios Justino e Vicente».


Fonte: SA


Essa carta, terá surgido na sequência das declarações de Vicente Pinto de Andrade segundo as quais «lamentava que um membro da sua família (Pinto de Andrade) fosse o mensageiro da desgraça» implicando que o Rui estaria à margem dos valores desta ilustre família. «Optei por dirigir-vos estas linhas, em detrimento de inúmeras possibilidades que tenho de o fazer publicamente, por profundo respeito à família e à defesa do nosso bom nome» lê-se no início da carta.

 

Pelo inexcedível contributo que esta família tem prestado ao país, desde os primórdios da luta anti-colonial, e pelo exemplo de pluralidade, coerência e elevação moral que os seus membros, sem excepção vêm dando à nossa Sociedade, é caso para dizer o clã Pinto de Andrade é um dos patrimónios mais valiosos da nossa Nação. Não é por acaso que esta família tem actualmente um candidato a Presidente da República, um Presidente de um Partido Político, um membro do Secretariado do BP do partido no poder e um outro no seu Comité Central. E isso sem contar que estes quatro são docentes universitários, incluindo um Reitor de uma Universidade – a Lusíada no caso – e outro Director da Faculdade de Economia de uma das mais prestigiadas Universidades do País, a UCAN. Outros prestam um grande contributo na liderança de organismos de referência no combate à pobreza, como é o caso da Henda Ducados no FAS, com algumas «perninhas» na Cultura e Letras, na preservação do património histórico do país, etc. Enfim, pode-se dizer que os Pinto de Andrade não são referência neste país pelo amassamento de riquezas ou quaisquer outros bens materiais. São-no pelos princípios que defendem e pela generosidade com que se doam à Nação.

 

Um dos valores que esta família tem patenteado e que tem suscitado a admiração dos angolanos e não só, é precisamente a tolerância e respeito pelas opções dos outros por mais diferentes que sejam das deles. O Vicente afirma-se militante do MPLA, mas é candidato independente às presidenciais, o Justino é presidente de um partido da oposição, enquanto o Rui e o Mário são dirigentes do MPLA, e a Henda defende causas cívicas para citar apenas estes. Num país marcado pela intolerância política e não só, e em que pessoas de referência acham que os seus parentes devem ser necessariamente da sua cor política, era edificante ver esta família manter as suas diferenças políticas e a unidade familiar ao mesmo tempo. Isto é, até à afirmação do Vicente Pinto de Andrade que, da mesma maneira como aconteceu há alguns anos com aquela da «lebre», chocou a sociedade, sobretudo pela idade e estatura do Vicente, que exigia mais contenção. Razão terá pois o Rui quando diz, a dado passo da sua carta «não seguirei (…) o vosso exemplo e manter-me-ei sempre fiel ao princípio que a opinião política não deve ser transportada para o interior da família, sob pena de dividi-la ainda mais».

 

Este é realmente um princípio em relação ao qual a família Pinto de Andrade ganhou por mérito próprio o direito de afirmar-se paladina. Por isso não ficou bem na fotografia um defensor de valores democráticos da estatura de Vicente Pinto de Andrade enveredar para o ataque pessoal e, de um parente seu ainda por cima. Ficaria mais elegante se se dirigisse ao porta-voz do MPLA, ou que criticasse a estratégia que esse partido elegeu para travar uma situação que, em sua opinião adivinhava-se no futuro. Todos nós sabemos que o porta-voz de uma instituição muitas vezes tem que defender posições que nem sequer são suas. Dali que a análise do que ele diz deve ser feita no plano institucional, não individual. Por isso não se compreende que o Vicente afirme que o Rui está, com a sua conduta política a desgraçar a família…

 

Em relação aos factos que causaram toda essa celeuma, sou dos que acreditam que havia possibilidades reais sim que os acontecimentos ocorridos na África do Sul e em Moçambique acontecessem também aqui em Luanda. Sou dos que acreditam também que a Rádio Despertar e a UNITA estiveram por trás desse processo – que aliás apenas beneficiaria precisamente os políticos da oposição, Vicente e Justino Pinto de Andrade incluídos. Sou também dos que acreditam que a acontecer aqui em Angola, poderíamos ter um autêntico banho de sangue, igual ou pior que o 27 de Maio ou os confrontos pós-eleitorais de 1992 de má memória. Sou, em resumo, daqueles que estavam a ficar quase aterrados com o evoluir dos acontecimentos, razão pela qual ouvia a Rádio Despertar mais frequentemente que o habitual.

 

Sou por isso daqueles que achavam e acham que o Governo deveria encontrar formas de contornar a situação perigosa para a qual nos estávamos a encaminhar. Independentemente dos erros cometidos que tornavam o nosso contexto quase semelhante aos da África do Sul e de Moçambique, era imperativo não deixar o país chegar àquele extremo. A conferência de imprensa do Rui parece ter sido o meio encontrado pelo MPLA para cumprir esse desiderato. Concordando ou não com o método, parece ter funcionado. O País desviou a sua atenção da África do Sul e Moçambique e os níveis de tensão social baixaram. A Rádio Despertar e a UNITA baixaram o nível de provocação. E as pessoas respiraram de alívio.

 

Tudo isso fez parte do jogo político: a UNITA enquanto oposição inteligentemente jogou com as similitudes do contexto (fez uma jogada perigosíssima, em minha opinião) e o MPLA reagiu enquanto Governo ao qual um contexto de desobediência civil não convinha de maneira nenhuma. Parte da Oposição, Vicente e Justino incluídos foram ao reboque da UNITA, saindo em sua defesa quando esta passou a vitimizar-se. Dali a apodar os seus actores com epítetos menos simpáticos por estarem a fazer o que se espera deles – exageros aparte! – como diz o Rui no jeito de gozo que lhe é característico «não fica bem e é muito feio».

 

Eu e todos os angolanos e não são poucos – que temos na família Pinto de Andrade um exemplo que apontamos aos nossos filhos em como se deve (com)viver em família – eles lembram um vitral que só é lindo porque tem muitas cores diferentes – desejamos que ultrapassem esse pequeno-grande desaguisado. Vocês são preciosos demais para a Nação, para que ela permita que se conspurquem, gente Pinto de Andrade… e bem hajam!