Holanda - No verão europeu deste ano, pela primeira vez na minha vida, fui passar minhas férias em Portugal. Quando era criança, certamente pela ligação histórica entre os nossos países, conhecer Brasil e Portugal era para mim um sonho. O Brasil tive a oportunidade de conhecer nos finais dos anos 90. Ou seja, este ano (2010) pude finalmente satisfazer o desejo daquele menino dos anos 80 que a partir do fundo do meu coração de adulto me dizia que era uma obrigação pisar os meus pés nas Terras de Camões.


Fonte: Club-k.net

Eu era o ‘dono’ de Lisboa

Antes de conhecer Portugal, paradoxalmente, confesso que os portugueses eram o povo que eu mais odiava neste mundo. Odiava a sua selecção de futebol, detestava vé-los em Angola ou saber que muitos deles emigram actualmente em massa para Angola. Sempre que eu ouvisse o nome ‘Portugal’ ou ‘portugueses’, a desconfiança e a raiva tomavam conta de mim. 
 

Mas se eu não gostava de Portugal e dos portugueses, porque razão então tinha eu o desejo de conhecer a terra deles? Para ser sincero, nem mesmo eu conseguia encontrar uma resposta para esta pegunta.


A partir da Holanda preparei cuidadosamente a minha viagem. Reservei um quarto numa pensão bem no centro da cidade de Lisboa, contactei alguns amigos em Portugal para avisá-los que no dia ‘x’ chegaria ao aeroporto da Portela, assim como outros preparativos necessários, de forma a que não faltasse o essencial nessa aventura. A minha preparação não foi apenas material. Ela foi também psicológia, pois eu tinha um grande medo, o medo de ter um ataque de ódio ao chegar na terra dos ‘gajos’, ‘racistas’, ‘colonialistas’ ou ao manter o primeiro contacto com ‘Tuga’ em Portugal. Por isso, conversei com os meus habituais conselheiros, abri-me sinceramente com eles, e eles souberam ajudar-me a criar métodos para controlar-me.


Em julho cheguei a Portugal, onde ficaria 1 semana. Cheguei a Portugal com algo na minha cabeça a me dizer: “Pedro, procure observar o máximo possível e não tirar conclusões apressadas”. Este pensamento levei comigo já desde o momento em que, apartir de Amsterdão, subi no avião da KLM. No aeroporto da Portela fui recebido por um primo, que me conduziu à pensão e me deu as primeiras orientações na linda cidade de Lisboa (verdade seja dita).


Sem que eu notasse, tal como algo que vai automaticamente, não demorou muito para que eu começasse a sentir-me em casa. É que para quem conheceu Luanda no início dos anos 80, ainda mais ou menos organizada, nota ao estar em Lisboa muitas semelhanças entre ambas as cidades. Daí perguntei-me: “se os portugueses nos odiavam tanto assim, porque é então que eles criariam em Angola e com todo o carinho uma cidade tão linda que chegou mesmo a ser conhecida como París em África?”


Já apartir do segundo dia, eu era o ‘dono’ de Lisboa. Naquela cidade eu sentia a simpatia das pessoas, perguntava as coisas como se eu vivesse naquele país há muito tempo e já sabia todas as maneiras daquela cultura. No decorrer dos dias já brincava com as pessoas, e muitas das vezes sem conhecé-las. Mas o que é que se passa? A minha integração no Brasil não foi tão rápida assim. Como é que em Portugal tudo vai tão facil assim?


Fazendo-me todas as perguntas possíveis e impossíveis, descobri que no fundo, no fundo, no fundo, a minha relação com Portugal e portugueses sempre foi de amor e ódio (50% - 50%). Descobri também que o facto de eu ter pisado os meus pés no país daqueles irmãos, simplesmente humanos imperfeitos como eu, o meu amor começava a suplantar o meu ódio. Antes eu odiava-os mais do que os amava, mas hoje amo-os muito, muito, muito mais do que os odeio. Tudo isso porque no fundo, apesar dos nossos bons e maus, temos algo muito, muito, muito forte e indissolúvel que nos une. Os mais de 7.000 Kilómetros de distância física que nos separam são insignificantes perante a espessura do laço que nos une há pouco mais de 500 anos.