Chegou a DG da Sonangol em 1989, deixando para trás o cargo de chefe da Divisão de Produção da companhia. É corrente em meios do sector que ascendeu ao cargo de DG por que tinha atributos que o fim da guerra fria valorizou na gestão da indústria petrolífera angolana: competente, reservado e irradiando um ar tecnocrático – tudo coisas indiciadoras de ausência de ambições políticas. Além disso passava por ter (ainda tem) uma boa capacidade de diálogo com norte-americanos, franceses, ingleses e “tutti quanti” do que conta no mundo do petróleo.

Antes de Quim David o “patrão” da Sonangol era Hermínio Escórcio (entre ambos houve ainda um breve hiato em que pontificou Desidério Costa). Mas quem mandava no sector, mas mandava mesmo, como ministro dos Petróleos, era Pedro Van Dunem “Loy”. Hermínio Escórcio e Pedro van Dunem “Loy”, até por via da sua condição de “apparatchiks” e de realidades políticas muito diversas das que vieram a seguir com a queda do muro de Berlim, tinham de facto poder próprio e exerciam-no plenamente. A José Eduardo dos Santos limitavam-se a prestar contas, como “tinha de ser”, dado que era o chefe do Governo.

A partir de 1989, quando em Angola começaram a manifestar-se realidades novas como a abertura política, a liberalização económica e o fim da “vaca sagrada” do partido único, o chamado MPLA-PT, muito dado a fervores revolucionários, pelo menos “no papel”,  a máxima segundo a qual quem controlasse os petróleos controlaria o poder tornou-se ainda mais ponderosa. O regime do MPLA, até por ter saído muito frouxo do fim da guerra fria, dependeria muito de uma gestão petrolífera, praticamente a única riqueza do país em exploração, que conseguisse servir interesses políticos e desse aoi mesmo tempo para alimentar um farcto “saco azul”.  O fio de segredos de Estado e de coisas sensíveis a que isto obrigaria tornou inevitáveis medidas destinadas a fechar e a blindar o sector.

José Eduardo dos Santos chamou a si o papel de “dono” e “guardião” dos petróleos. Precisava, porém, de um “testa-de-ferro” e o eleito foi desde logo Quim David. Começou por aparecer no centro de um “complot” que levou ao afastamento de Hermínio Escórcio. E não tardou tornar-se ele próprio o DG da companhia – como era o cargo era designado. Tinha os atributos convenientes: dominava os assuntos e percebia-se que sabia do que tratava; tinha ligações internacionais sólidas e diversificadas; era discreto e sabia ajustar-se ao papel que José Eduardo dos Santos reservara a si próprio, que era o de decidir com base em estudos que o DG lhe preparasse.

Ainda hoje, agora na pele de ministro da Indústria, Quim David é assim. Serve-lhe ser rico, respeitado e viver bem; não lhe interessa a política. E por isso ninguém é tão discreto como ele. À frente da Sonangol, sucedendo-lhe, ficou Manuel Vicente, seu antigo adjunto, de cuja maneira de ser fazem parte muitas tendências e tiques de Quim David.

(Adaptado de um esboço biográfico publicado em África Focus, 10.Out.89)
Fonte Africa Monitor