Brasil - A  maneira como se enaltece e   se elogia este personagem, por alguns militantes do partido no poder, chega a ser patética, reacionária e, dependendo, constrangedora para quem faz do bom senso uma característica para continuar a ser considerado um ser racional.  Os tempos mudaram, é claro que não mudaram a maneira como se devem respeitar as pessoas e principalmente os mais velhos, desde  que estes mereçam.


Fonte: Nelo de Carvalho


A Democracia, um mal menor entre uma ditadura de direita e uma de esquerda, entre todas as suas vantagens, a melhor delas é a de não  tornar a política uma religião, evitando que seres humanos, políticos- por excelentes que sejam-,  possam ser endeusados. Nos meus debates consigo entender a consideração e o respeito que um Dino Cassulo e muitos militantes têm para com o Presidente de Angola e  do MPLA. Ninguém, mesmo sendo militante do MPLA, tem obrigação moral e cívica de morrer por amores por este, só porque é militante do MPLA. A consideração que se tem pelo mesmo  não tornam o mesmo um sujeito insubstituível, longe de defeitos e erros que qualquer homem no poder pode cometer. Também entendo que o MPLA tenha profundas raízes no meio da população angolana. Raízes que foram fincadas com a ajuda de toda a militância de Cabinda ao Cunene, custando o sangue e  o suor de milhões de angolanos que acreditaram nesse partido e hoje  continuam acreditando; e não só com ajuda daqueles que estão no mais alto escalão do poder.

 

Assim, estas raízes fincadas ao longo dos trinta e cinco anos devem ser usadas para se construir um país melhor em todos os aspetos, elas não podem ser usadas como patrimônio de um homem, de uma família, ou até de um grupo de camaradas que saíram das matas depois do ano de 1974 com a promessa de tornar  Angola num país para todos, seja num regime Socialista ou num regime Capitalista.


É de conhecimento de todos que o a intenção de se construir uma sociedade socialista em Angola foi um fracasso; vivemos agora em tempos de construção de um regime democrático; para muitos dos antigos camaradas adaptar-se as novas regras democráticas  em que só o mérito, a competência e o seguimento das leis devem fazer sentido é uma chatice  que não convém aos seus planos. É como ceder a um bando de intrusos, gente inoportuna, a um bando de infantes ou adolescentes pleiteando prazeres, desejos e a satisfação que só deve corresponder aos adultos. O MPLA, no seu seio, enfrenta essa crise: o enfrentamento entre o Velho, que não cede, e o Novo, que vive em desespero por algo que o tempo lhe prometeu, prosperidade numa nação de todos.


A Luta entre o Velho e o Novo não pode ser vista como uma luta mesquinha que não merece atenção de análise de especialistas. Dir-se-ia até que a democracia existe para sanar a sociedade desta crise.  Assim,  nas sociedades modernas e civilizadas, não se pode fazer do direito dos Mais  Velhos um direito absoluto, onde erros e falhas são omitidos e contornados de tal forma como se o novo não tivesse nenhuma perspectiva de amadurecimento.

 

Se existir egocentrismo dos Mais Velhos em se manter no poder, minimamente, que deva ser camuflado com competência  e sabedoria  e não por um ato de apelação romântica  em que  a camaradagem é usada para fazer prevalecer ambições do passado. É inadmissível pensar que seremos capazes de construir um estado forte onde a camaradagem prevaleça acima dos princípios que devem nortear um Estado Democrático de Direito.

 

Tenho sido tratado como um sujeito contraditório e ambíguo; e até supostamente de destruir a imagem boa que alguns  “camaradas” construíram sobre a minha pessoa. Tudo isso, confesso – que deve ser-, porque ao longo do tempo que estive entre uma ditadura de esquerda ( Cuba) e o conhecimento que tenho das ditaduras de direita, assim como por viver  em uma “autêntica” democracia, a brasileira ( ainda sendo de direita), aprendi, honestamente, a separar a  “camaradagem” dos preceitos da lei.  Sei que  entre os angolanos pode até soar como uma espécie de traição, abandonar um camarada  em nome da lei, ou pela lei: ou seja, trocar a camaradagem pela lei ou simplesmente pelas regras que a democracia exige. Mas isto acontece comigo, sim. Não que eu seja um legalista ou um extremista. É que a Democracia de verdade não foi concebida para “camaradas”, ela foi criada para manter o equilíbrio das relações entre todos os cidadãos, todos com ambições iguais ou diferentes, mas expostos sobre as mesmas leis.

 

Quando nego José Eduardo dos Santos  nos meus artigos e  trato ele como um político incompetente para continuar enfrente da nação, seguindo as regras da democracia que tanto ele tem violado, não é por ódio, por inveja, por ingratidão e muito menos por traição, ou até a suposta contradição ou, ainda, ambigüidade. É porque chegou mesmo a hora de confiarmos nas instituições e fazer com que o país progrida dependendo das instituições e não simplesmente de um homem, supostamente clarividente, que tudo pode e sabe, e sem falhas que se lhe pode imputar.

 

Camaradas do MPLA, angolanos e compatriotas, é ridículo acreditar que exista um homem assim. E está mais do que provado que personalizar a governança e a governabilidade de um país, pôr tudo nas mãos de um só homem, tem condenado nações inteiras ao atraso, ainda que tal sujeito seja um gênio da política e da economia. O que não é o caso de José Eduardo dos Santos, de gênio ele não tem nada, de clarividente só quem dorme  na mesma cama que ele todos os dias pode notar isso.

 


Não estamos aqui para desfazer o homem que merecidamente, há mais de trinta anos, com todos os erros e dificuldades, esteve enfrente do país. Também não estamos aqui para pedir que o mesmo não continue a dar sua contribuição ao país. Estamos aqui para pedir que as instituições em Angola se abram diante das regras da democracia e que elas mesmas sejam a força propulsora deste regime que todos desejamos construir, em vez de depositarmos tudo só nos ombros de um homem.

 

E quando falamos de instituições nos referimos, principalmente, ao MPLA partido no poder. O MPLA é a instituição mais forte que existe em Angola, o MPLA chega a ser o próprio Estado, é a Assembléia Legislativa, o Judiciário, o Tribunal de Contas, é o Exército Nacional ( as FAAs), é a Polícia; enfim, o MPLA é uma Cultura, é a própria nação angolana. Se for a assim, a pergunta que ninguém resiste a invocar é: será que tudo isso deve depender de um só homem? 


Se o MPLA é tudo isso, então o mesmo tem condições de governar por mais 30 anos de maneira ininterrupta,  processo que este articulista defende  e  muitos por aí com certeza apóiam também. Isso nos leva a uma “batalha” inegável e  irrenunciável: o combate a corrupção.  Este combate não pode ser visto como um  gesto de contradição e ambigüidade e muito menos de suposta traição, como se habituaram a qualificar a militância mais antiga e conservadora deste partido. Alguns chegam a me acusar de traição. Não sou traidor de nada e nem de ninguém. Eu amo tanto o meu país como qualquer um de vocês que diz que enfrentou grandes batalhas ao longo dos 35 anos ou mesmo 54 anos de MPLA, o que não posso aceitar é fazer da corrupção uma cultura para se lidar com a tal “camaradagem”.


A lógica que fica fácil de entender já que por circunstâncias e destinos políticos nós angolanos não teremos opção ao longo dos 30 anos ou mais que vem por aí: isso não dá direito a aceitar qualquer tipo de desmando na forma de se governar e administrar aquilo que é de todos. O convite que fazemos  a todos é  o combate sem trégua  contra a corrupção. “Bater” nos corruptos, condená-los, persegui-los, assustá-los é preciso! É nesse contesto que o MPLA, como partido soberano, que sempre mostrou estar mais próximo de todos angolanos, poderia fazer da luta do Velho contra o Novo uma luta onde só o mérito e  a competência fossem valorizados. É preciso saber conjugar e pôr  frente a frente a experiência dos Mais Velhos  com o dinamismo dos  mais jovens. Isto consiste em desmistificar  os  personagens de ambos lados, tanto política como ideologicamente, e transformá-los, além de políticos, em gestores e administradores que a qualquer momento possam prestar contas a sociedade. E quando falamos de personagens nos referimos, também, ao mais alto escalão.


E por isso digo, todo aquele que ama esse país, sendo ou não do MPLA, deveria ter dois grandes objetivos: 1° Evitar que a UNITA jamais ganhe as eleições; e 2° Combater e atacar os corruptos em todos os níveis e esferas da função pública não importa que ideologia os mesmos professem.


E para conseguirmos esses dois objetivos não se faz com profissionais  ou líderes que estejam na pele de santos, deuses ou divindades que jamais poderão ser intocáveis.


Nelo de Carvalho
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