Luanda - Afirma Ernesto Joaquim Mulato, antigo companheiro de Jonas Savimbi hoje vice-presidente da UNITA, em entrevista a unitaangola.


Fonte: UNITA


Pergunta: Senhor Vice-presidente, nove anos depois da morte do Dr. Jonas Savimbi, que referências há a fazer sobre essa figura da história de Angola?

 

Em primeiro lugar agradeço esta oportunidade para tecer algumas considerações sobre o passamento físico de Dr. Jonas Savimbi, que conheci na UPA e com ele deixamos a UPA, para uma nova experiência que hoje posso dizer que valeu a pena. Valeu a pena porque o projecto de sociedade que começou a forjar, a partir da UPA, quando conversava com a juventude e continuou numa alternativa própria que encontrou, através da UNITA, esse projecto está ainda por se concretizar, quando vemos a evolução da situação do nosso país desde 2002, quando foi conquistada a paz até hoje.

 

Hoje já podemos afirmar que Brigland o jornalista britânico que escreveu o livro Savimbi A Chave da África ele tinha muita razão no seu titulo. Hoje está provado que o Dr. Jonas Malheiro Savimbi era uma chave  para África, tinha convicções e posições claras sobre o que devia ser Angola, o que devia ser a África, em relação ao mundo.

 

Como é que a África deve comportar-se na constelação das nações. E quando vemos o que se está a passar hoje em muitos país africanos, afinal de contas o Dr. Jonas Malheiro Savimbi faz muita falta.

 

Era um homem que tinha amigo, mas não tinha amigos, porque para o Dr. Savimbi o seu maior amigo era o povo. Se estivesse em Kinshasa onde tinha o presidente Mobuto como amigo, mas tecia contra o presidente Mobuto criticas, em relação a forma como dirigia o seu próprio país.

 

Eu lembro-me que um dia o presidente Mobuto pediu ao Dr. Savimbi para que fosse falar com os estudantes da Universidade sobre a democracia, quando ele não aplicava a democracia. Era uma armadilha, queria saber alguma coisa, ou o que é que o presidente Mobuto queria?

 

O Dr. Savimbi foi e falou com os estudantes de uma maneira tal que não feria o amigo, mas dizer a realidade do que significava a democracia, o que significava a nossa luta em Angola para a democracia, o que podia ser também para outros país. Quando alguns estudantes (naquele tempo tinham medo) levantaram-se  e disseram: muito bem senhor Dr. Savimbi nós escutamos o que disse sobre democracia mas para nós no nosso país e com o presidente fundador a nossa democracia é essa que vivemos. O Dr Savimbi entendeu.

 

Quando regressou ele passou a palavra de como correu a palestra e quais eram os comentários de alguns estudantes e o presidente disse, bem é como você vê a democracia, aquela tua é outra aqui nós estamos a fazer a nossa. Não são todos os dirigentes que têm essa capacidade. O Dr. Savimbi conversava como velho Boinghy, com o presidente Senghor, todos eles, a pedir conselhos, mas também a dar o seu ponto de vista. Eram amigos, mas lá onde fosse possível a critica ele fazia.

 

É aí que mesmo quando as pessoas falam do Dr. Savimbi, em relação ao seu relacionamento ou relacionamento do nosso partido a UNITA com a África do Sul na época do apartheid que era circunstancial. Estávamos numa situação que era preciso decidir entre aceitarmos a nova colonização em Angola e hoje o marxismo estaria mais ferrenho aqui. Estamos a ver as dificuldades de mudança de mentalidade, até nos grandes dirigentes. Há muito bom discurso, mas o povo vive miseravelmente.

 

Quando estamos a comemorar o passamento físico do Dr. Savimbi (…).Questão de saber quando é que alguém vai morrer só Deus sabe quando, onde e como a pessoa vai morrer, mas há pessoas como o Dr. Savimbi que a um dado momento sabia que no exílio não vou, vou viver a lutar até que se encontre uma solução para o país. Essa solução encontrada ainda em vida ou não é uma solução. No exílio eu não vou. Ai ele dizia como é a mim que eles querem, então vocês preparem-se para fazer a paz. Ele dizia assim, como é a mim que os ocidentais, os israelitas, o regime, o presidente da república toda essa gente, é mim que eles querem, mas eu vou resistir.


Então nós devíamos tê-lo como um salvador, trouxe a paz. Quer queiramos quer não ele sacrificou-se para que Angola vivesse em paz. É para dizer que Jonas Savimbi faz falta a Angola e a África.

 

Pergunta: Sei que antes da morte do Dr. Savimbi, o senhor esteve fora do país, durante esse tempo terá recebido, por exemplo, uma mensagem em que podia ler-se que ele estava certo do destino fatídico que teve no dia 22 de Fevereiro?

Bom, nós recebemos uma mensagem em Dezembro ou Janeiro de 2002, onde o Dr. Savimbi dizia que houve a 16ª conferencia, onde tentou reestruturar o partido, as forças armadas e que nós deveríamos manter o contacto com o vice-presidente Dembo, nos aspectos que tinha delegado e que tudo o que ele estava a presenciar, nos bombardeamentos, nos aparelhos colocados no terrenos, pelos israelitas para o seu rasteamento apontava que o ocidente estava determinado a não vê-lo vivo, mas que todas aquelas nossas mensagens umas que sugeriam a sua saída da área onde estava mais para o norte ou outras mensagens deste ou aquele que sugeriam que o Dr. Savimbi saísse ainda para o exterior, dizia ele que estava preparado para ir até as últimas consequências no interior e juntos das populações.

 


Ele dizia que nunca iria abandonar as populações, mas havia esteio de propostas nossas que se o governo estivesse determinado a fazer a paz (umas vinham do clero angolano e do clero italiano) da Comunidade Santo Egidio e que possivelmente poderíamos encontrar uma saída para o nosso processo de Angola.


O Dr. Savimbi também sentia que o regime não estava preparado para fazer uma paz com Savimbi vivo. Foi nesses termos e dizia que estava0 a resistir e fazia alusão a bombardeamentos piores que aqueles bombardeamentos presenciados na guerra colonial (também os portugueses usavam bombas que destruíam tudo) também estava se passar nas zonas do leste do país, onde as populações já não tinham nada para comer, porque estava-se a destruir tudo. Tudo que era vivo e que podia dar alguma força às pessoas era destruído. Logo que recebemos essa mensagem para nós criou-nos uma preocupação da situação em si e da sua própria segurança no país, porque quer queiramos quer não em todas as instituições a cabeça é cabeça. Quando a cabeça desaparece há sempre uma desarticulação e nós vimos no nosso partido a UNITA, felizmente conseguimos não esquecer mas honrar a sua memória, trabalhando afincadamente com todas as dificuldades e rasteira que temos vindo a ser alvo. Mas continuamos.

 

Pergunta: Senhor Vice-presidente disse a pouco que foi companheiro de longa data do Dr. Savimbi. De onde é que provinham as motivações para a luta contra os portugueses, primeiro e depois contra os russos e cubanos?

Bom eu conheci o Dr. Savimbi em 1961, na UPA. Éramos jovens, quando veio pela primeira vez com o presidente Holden em Kinshasa, nos apresentou, falou para nós numa palestra e nos impressionou. A partir daquela altura nós começamos a manter o contacto, mesmo quando regressa para Suiça tínhamos contactos. Contactos com os estudantes é eu que fazia e continuamos. Daquilo que eu fui entendendo, eu pessoalmente não posso dizer que conheci bem o Dr. Savimbi. O Dr. Savimbi era um animal político, mas tentei compreende-lo é o que faz com que durante o tempo todo tive uma afecção para com ele e ele também para comigo. É para dizer que naquilo que pude entender o Dr. Savimbi era homem de grandes convicções. O seu amigo era o povo. Penso que aquilo que se passou em Angola a quando do colonialismo, quando era jovem e estudante, quando andou com o pai no caminho de ferro de Benguela, marcou-lhe muito. O velho Loth Malheiro foi um grande homem e inspirou o Dr. Savimbi em muitos aspectos políticos.

 


Para dizer que o que lhe motivou sempre é o sofrimento do seu povo, é ver que o povo sofredor e naquela altura ele tinha referências daquelas populações que vinham do centro de Angola em camiões para as plantações de café no norte, outras populações que saiam e iam a São Tomé, Cabo Verde, etc. essas memórias todas estavam com ele. É assim que de médico migrou para política, ele percebeu que como médico não faria que gostaria de fazer para o seu povo de Angola. Para ele, para melhor combater os colonialistas tinha que ser político e combatente e compreender o povo.

 


Em áreas onde passou, a forma como lidava e tratava as pessoas fez com que as populações nutrissem simpatia por ele e pela UNITA até hoje. A UNITA ganha muito só pelo trato que o Dr. Savimbi dava às populações. Ele olhava mais nas populações que as elites e quadros, ele sabia que estes já tinham alguma ascensão e capacidade de andar por si, mas o povo não, precisa de alguém para o conduzir.

 

Nas mensagens que nos enviava ele dizia: se a UNITA não se guindar a latitude de Angola a nossa população não terá absolutamente nada e hoje, por aquilo que eu vejo, ele tinha muita razão. O que significa, para o Dr. Savimbi a independência só teria sentido se aquelas populações com dificuldades, que não tinham nada, estivesse a usufruir dos benefícios desta independência e para o efeito tinha que haver mudanças profundas. Não é só mudar a bandeira, não é colocar um angolano no lugar onde estava um português. Mudanças profundas, até mesmo no comportamento que se molda através da liderança.

 


O Dr. Savimbi dizia que se a UNITA não se guindar a altura de Angola o povo não terá nada, porque a tendência das elites é subjugar. Está ali, forma a seu grupo e vão dando migalhas aos outros. Esta é a tendência das elites. Quando não houver alguém que olha para o povo lá na aldeia a coisa fica assim. A prova está que uma casa feita para um popular e uma casa feita para uma elite, as condições são diferentes, porquê se todas são casas para habitar?


 

O Dr. Savimbi acreditava que uma vez Angola independente nós tínhamos que ter relações com todo mundo, não precisávamos de ter só um amigo preferencial, mas que esse amigo tinha que nos respeitar. Para o Dr. Savimbi a primazia devia ser dada aos angolanos, na criação de condições de escolaridade para os seus filhos, de saúde e dizia que o dinheiro que temos faça tudo para que o filho do pobre amanhã seja alguém. Jonas pensava assim! Pensava para o conjunto, colectividade, tinha amor à família, naturalmente. Mas dizia que a minha família é o povo sofredor.