Lisboa - 1 . As autoridades angolanas excluem e/ou minimizam, em declarações públicas, a hipótese da ocorrência no país de manifestações de protesto equivalentes a outras registadas no N de África e Médio Oriente. A convicção que sobre o assunto transmitem é, em geral, a seguinte:

 

Fonte: AM

Propósito de impedir a ocorrência de manifestações

- Não há razões sociais ou políticas susceptíveis de predispor/impelir a população para manifestações de tal natureza; a realidade de Angola é diferente.


- Se porventura se viessem a verificar, constituiriam sempre um fenómeno passageiro, por ausência de condições práticas para vingarem.


Em ambientes não públicos ou recatados vêm sendo referenciadas entre personalidades do regime sentimentos ligeiramente diferentes – estes considerados mais genuínos, tendo em conta as circunstâncias em que são exteriorizados: certeza ou confiança de que não haverá manifestações públicas; temor de que, apesar disso, possa haver.

 

2 . As políticas ditas de contingência do regime tendentes a fazer face a eventuais riscos de contágio a Angola de manifestações populares de protesto ocorridas em países com ambientes de descontentamento social em certos aspectos comparáveis, consistem essencialmente num esforço de prevenção ou dissuasão de tal cenário.

 

A par de um clima de descontentamento popular alimentado por condições de vida cuja penosidade e injustiça são realçadas pelo seu flagrante contraste com a opulência do estilo de vida de uma minoria do regime identificada como corrupta, os aspectos mais comparáveis são os seguintes:

 

- A longevidade de 32 anos de José Eduardo dos Santos (JES) no poder, acrescida de particularidades como a de nunca ter sido eleito, ter promovido um modelo de concentração do poder na sua pessoa e haver cíclicos rumores de que tem em mente fazer-se substituir por um filho.

 

- A propensão observada em vastas camadas da população, em especial nas cidades, Luanda inclusive, relativamente a expectativas de mudança e renovação – fenómeno acicatado pela longevidade do regime e sua linha autoritária.

 

É sobre JES, como figura principal do regime, há mais tempo e de forma constante no exercício do cargo presidencial, que recai parte considerável do ónus do descontentamento interno e da fadiga. O MPLA é considerado mais popular, até por se conjecturar que está submetido a interesses de poder de JES.

 

3 . Desde há c uma semana circulam na internet sucessivas mensagens, apócrifas, anunciando a realização em todo o país, 7.Mar, de manifestações de protesto com o fim expresso, apresentado em termos de ostensivo menosprezo e agressividade em relação ao próprio, de derrubar JES e o regime que ele corporiza.

 

Em meios conhecedores do método de acção e análise do regime e do seu modus operandi face a previsíveis vicissitudes, o carácter apócrifo das mensagens tem dado azo a conjecturas contraditórias: uma medida de precaução dos seus promotores; uma “maquinação” do próprio regime visando, por reflexo condicionado, criar um clima de tensão capaz de comprometer eventuais manifestações.


A política do regime destinada a prevenir e/ou dissuadir manifestações de protesto consiste em “medidas activas e psicológicas”. A saber:

 

- Reforço de acções de vigilância e controlo do aparelho de segurança tendo por alvo pessoas e/ou grupos tidos como politicamente adversos ou com inclinação para actos de “contestação”.

 

- Instruções estritas às autoridades competentes para não darem permissão a manifestações públicas, invocando para tal a lei ou procedendo administrativamente.

 

- Desmotivação e amedrontamento de potenciais manifestantes por indução nos mesmos de sugestões de firmeza das autoridades; de que a Polícia não hesitará em empregar todos os meios julgados necessários à manutenção da ordem; ou que se pode estar perante um regresso à instabilidade e restrições que caracterizaram o período da guerra civil (de que persiste memória negativa).


O propósito de impedir a ocorrência de manifestações, incluindo as espontâneas, baseia-se em considerações como o de que a Polícia empregaria a força, instruída que está para as reprimir; as repercussões das consequências nefastas disso originariam condenações externas susceptíveis de desmobilizar a Polícia/galvanizar manifestantes.

 

Nas duas últimas semanas aparatosos contingentes de unidades especiais da Polícia foram reunidos no Huambo e Cabinda com o fim simples de desencorajar manifestações que se previa pudessem vir a ocorrer – efeito julgado possível através da sua aparência marcial.

 

4 . O esforço do regime visando esvaziar riscos de contágio da crise manifestada noutras partes do mundo, está também patente nos grandes orgãos de comunicação social (ocs). Desta feita as manifestações de protesto não são ignoradas, como se verificou em relação a Moçambique (AM 508), mas a informação sobre as mesmas é manipulada.

 

A presente linha de orientação, comparada com a desatenção a que foi votada a revolta popular em Moçambique (AM 498), visou também evitar efeitos que se concluiu terem sido perversos – demonstração de que os grandes ocs são submissos ao regime; surgimento de novas apetências pelo recurso à imprensa internacional.

 

Subtilezas sistematicamente notadas no tratamento dado pelos grandes ocs, em especial TPA, ao tema das manifestações de protesto e subsequentes derrubes de regimes noutros países:

 

- Exibição enfática de imagens aparentemente destinadas a induzir a ideia de que as manifestações são causadoras de danos pessoais como desordem, sofrimento e morte.

 

- Omissão de particularidades como as de que as referidas manifestações visaram ou visam, como os seus promotores proclamam, o derrube de ditadores que por muito tempo conservaram o poder.