Cabinda - Introdução - O Povo de Cabinda, habituado a comunicados enviesados sobre Cabinda do Governo, foi-lhe difícil compreender e digerir a «Nota» difundida pela imprensa estatal sobre a situação da (sua) Província de Cabinda, dia 09MAR11!  Recorda-nos aquelas do Império romano que, aliás, tinham a sua autonomia e homens sérios para as dirigir. Diz o provérbio latino  que quem se cala (parece) que consente, por isso, nós, Sociedade Civil de Cabinda, achamos pertinente  dizer da nossa justiça, diante de tantos quiproquós contidos na Nota, passíveis de induzir muitos  dos nossos conterrâneos a sonhar em esperanças que não geram futuro (E. Bloch).


1. As pegadas da Mãe-História



Ouvindo a Nota, dá-nos a impressão que o nacionalismo cabindês, com as suas lídimas aspirações à autodeterminação, surge nos fins  dos anos noventa. Este irrompe, puro e simplesmente, para subverter a ordem estabelecida pelo governo legítimo de Angola. Daí serem todos terroristas e subversivos, justificando ipso facto prisões, raptos e assassinatos.  Queríamos, porém,  trazer à memória o seguinte: A FLEC/FAC foi fundada em 3-5 de Agosto de 1963, fruto de um longo processo político nos anos quarenta. Testemunhas, ainda vivas, atestam as idas, separadamente, de cabindas e angolanos  à ONU.



2. Verbos sem Verbo




Termos, como Paz, Reconciliação e  Desenvolvimento, parecem ter, quando se fala de Cabinda, uma outra conotação e, simplesmente, esvaziados da força quer humana quer histórica que transportam consigo! A PAZ para os Cabindas é ter as povoações cercadas de militares, impedidos de livremente irem às lavras e à caça; conviverem, sem direito à indignação,  com a discriminação e permanentemente sob a mira de uma polícia com carta- branca para tudo, de um Sinfo implacável  e de uma Polícia de Investigação Criminal que primeiro prende e, posteriormente, investiga. PAZ para Cabinda é, até, impor-lhe um deus, uma igreja e um pastor à força da baioneta. RECONCILIAÇÃO para o Cabinda é desaparecer como Povo e ajoelhar-se diante um poder sempre predisposto a humilhar e a descaracterizá-lo! DESENVOLVIMENTO para Cabinda  é ter a mão estendida aos dois Congos para o frango, o feijão, o cimento e para a dor de dente!


3. Dialogar ou monologar!




A Nota tem, contudo, duas revelações surpreendentes. Primeira, que em Cabinda vive-se uma guerra, desmentindo  os Sanjares  e  os Bento Bembes. Segunda, o elemento propiciador de todos os fracassos foi  sempre confundir  o diálogo (dià (através)+ lógos (palavra, discurso) isto é, um movimento da palavra com o monólogo (mónos (um) +lógos (palavra, discurso) isto é, um único a falar, alijando completamente o OUTRO. Tem sido sempre esta permanente sobranceria  do Governo angolano, quando dialoga, monologando com o Povo de Cabinda, ao impor à FLEC as suas soluções dilutas,  integraciofobíacas e bembíacas,  amordaçando a Sociedade Civil, ao  reduzir o seu espaço e calar a sua voz. Numa palavra; o cabinda não tem direito à cidadania!



4. O inegociável



As gerações sucedem-se, mas mantém-se indelével o sentimento profundo de um Povo, que  uma  acção-política tendente simplesmente a cercear tudo o que cheira a cabinda: História (datas e momentos marcantes) e Cultura (nomes, língua e espaço vital) não logrou aniquilar. A política da palmatória não desenvolveu, até agora, no cabinda a Síndrome de Estocolmo, pelo contrário, enrijeceu a sua determinação em salvaguardar a sua especificidade. Nenhuma solução será encontrada para Cabinda: a) Se o Governo e o Mpla, porque nem todo o Povo  angolano pensa assim, continuarem a sofrer da psicose da ponte sobre-o rio Zaire. Esta  unir-se-á  com a RDC e não  com Cabinda. b) Se  o cabinda não for poder em Cabinda.


5. In memoriam rerum


A previsível independência do Sul-do Sudão, a queda de muitos Mubaraks e as grandes mudanças constitucionais levadas a cabo pelo próprio rei de Marrocos, Muhamed VI,  deviam levar as elites do poder angolano a reflectirem seriamente sobre o futuro do território de Cabinda. É um contra-senso que alguém que tenha lutado contra o colonialismo teima, agora, que um outro povo não viva a sua liberdade plena ( mestre do seu destino colectivamente consentido e das suas riquezas)  e que todos os dias lhe recordam que não é livre.  A FLEC e todos os seus líderes estiveram sempre abertos ao diálogo e a Sociedade Civil um facilitador, todavia, do lado do Governo meramente um fazer-de-contas com um monólogo insistente e ensurdecedor.


Chiôa, 11 de Março de 2011.

Pela Sociedade Civil de Cabinda
Dr. José Marcos Mavungo