Brasil - As denúncias contra  o Comandante da Polícia Quim Ribeiro, publicadas pelo semanário Carta Capital, rompem  uma tradição que há muitos anos se instalou  e existe  entre o funcionalismo público angolano. A de que o silêncio entre os membros de uma determinada corporação ou instituição é necessário. Objetivo? Não atrapalhar a vida de parceiros e colegas num  meio social em que viver da remuneração salarial  foi sempre impossível  para o funcionalismo  e o trabalhador de escalão mais baixo.  A corrupção, em todos  os níveis, sempre foi e é visto com complacência;  um fenômeno necessário num país  em que as instituições, as relações sociais civilizadas e o simples mérito  não garantem  êxito profissional.


*Nelo de Carvalho
Fonte: blogdonelodecarvalho.blogspot.com



A cultura da corrupção ensinou ao cidadão angolano,  honesto e decente –ou não-,  de que quem não estiver envolvido no esquema além de sair perdendo o pouco que já tem  é um sujeito pusilânime.  Esse não foi  o caso de Domingos Francisco João que teve que pagar com a própria vida uma atitude não comum entre os funcionários  público angolano, que trabalha e vive numa sociedade onde a corrupção é generalizada. Esta  generalização é instrumentalizada e fomentada por duas causas. A primeira, pela péssima remuneração e condições laborais  a que estes são vítimas. Já se sabe que  os benefícios profissionais, salários altos e boas condições de trabalho,   trinta e cinco anos depois da independência, ainda não são pautados pela meritocracia,  mas pela militância partidária  e o desempenho político de agradar chefes e amigos que rodeiam o funcionário.




Segundo, si se quer chegar tão alto  é preciso estar bem com todos de preferência com a chefia mais próxima  e alta que absorva nossa simpatia  e graça. O cumprimento das leis  é uma rareza, que quando se tenta  a  mesma  cai-se na condição do sujeito idiota e estúpido, e que quando menos, como já dissemos, atrapalha a vida de todo mundo.  Esta- a lei-  na  eventualidade de ser executada  e com todos os vícios de procedimentos  só recai sobre os subordinados.  Em particular,  recai sobre uma cúpula de funcionários que não têm seu passado identificado com a trajetória do militante guerrilheiro, general e ex-combatente. E são os que hoje constituem  a elite intocável  e que dirigem os destinos da nação. Que eu saiba em Angola nunca um general foi processado e preso por corrupção ativa ou passiva. Estes só entram em desgraça ou encrenca  - exemplo do caso Miala e talvez um outro por aí que houve no passado- porque andaram  atentando contra a própria segurança do Estado, no caso mais específico do Miala contra a segurança do Presidente.



É preciso que se diga e se reconheça, os longos anos de guerra ajudaram a gerar e a sustentar a corrupção. O próprio MPLA  e muito dos seus militantes em todos os níveis fizeram do conflito militar um instrumento de causa  e conseqüência para se enriquecerem ilegalmente no poder. Assim, as fontes de riqueza no país  que quase nada até hoje  produz limitou-se a extração de petróleo em regiões distantes do conflito e dos diamantes, que, também, durante muitos anos estiveram distantes das regiões de guerra. Só caindo no meio do fogo depois que a UNITA nos dez últimos anos do conflito intensificou suas ações nas regiões das Lundas. E facilitou ainda mais que aquilo se transformasse  num faroeste. Ou, ainda, um céu aberto e estrelado para os corruptos,  e quem sonhava  enriquecer-se num ambiente onde não reinavam as leis nem a ordem.



Na verdade, existe  outra fonte de riqueza não muito descrita  e conhecida pelo cidadão comum são as instituições financeiras do país. Ou seja, o lugar ou lugares onde entram  e saem  e se guardam as  riquezas financeiras, dinheiro, ouro  e todas as outras compensações que representam valores em dinheiro   que deveram ser feitas dentro do país  ou até fora  para que aquela riqueza petróleo e diamantes possam ser usufruídas  como bens de valores. E que poderão ser usados na compra de outros produtos e serviços comum para desenvolver o país.  No caso de Angola, a instituição financeira que ajuda a converter estes valores e a cuidar dos mesmos são os Bancos Públicos, de preferência estes,  e a frente de todos eles está o BNA, tido como o Banco Central de Angola. Esta instituição, se muitos não sabem ou  não sabiam, além de cuidar de todo dinheiro nacional é onde na verdade os elementos da elite corrupta fazem as suas transações  com   transparências de legalidade, mas que no fundo muitos procedimentos são verdadeiros atos de corrupção que levariam a cadeia seus autores. O exemplo é o caso do ex- ministro da  fazenda, suspeito de roubo, desvio de recursos daquela instituição ou do seu ministério. Não recordo agora o nome dele, mas é o famoso Ministro que ganhou o prêmio do melhor ministro da fazenda do continente africano mais tarde revelou-se que ele interferiu na premiação e que, além disso, se descobriu que ele é um ladrão.



Para quem não sabe o BNA não é só vítima do funcionário(a) corrupto(a) que trabalha no balcão, o chamado bancário, ou o simples segurança corrupto daquela instituição. Os maiores  assaltantes daquela instituição são os chamados ladrões de colarinho  branco, os engravatados de ternos, que  com uma canetada e procedimentos burocráticos, quando  ultrapassados,  e bem dominados por estes desviam milhões de dólares e kwanzas das contas públicas para as suas contas. Essa é a pura e simples verdade. Que se o governo angolano tentasse desmentir de boca de algum de seus funcionários ineptos e bajuladores ( porque uma pessoa inteligente e de bom senso jamais desmentiria isso) estaria indiretamente caindo na situação ridícula de que só aqueles que pertencem a  mais alta cúpula do governo e do funcionalismo público angolano é que são  honestos e o resto é que são desonestos. Tal adjetivação teria escala mundial, já que   Angola é o país no Mundo em que nunca um corrupto daquele nível foi preso.



Para  dar continuação ao parágrafo anterior ( o penúltimo parágrafo)  a  pergunta é: por que o governo angolano  tenta  manter uma suposta transparência  na apuração do caso BNA ( caso Quim Ribeiro)?! Quando a opinião pública angolana sabe perfeitamente que o caso do Ministro ladrão, que até endereçou uma carta ao Presidente da República, justificando os seus atos, ficou pelo dito e o não dito. Há quem diz que a mulher do Ministro ameaçou pôr a boca no trombone. O que têm a dizer, o próprio Presidente da República, o Procurador Geral da República, o Estado e as autoridades angolanas  em Geral?! Diante da suposta liberdade de imprensa que existe em Angola o que têm  a  dizer o Jornal de Angola, a Rádio Nacional e a Televisão Pública de Angola aos  angolanos sobre isso?! Esperamos qualquer coisa, que se pronunciem!  Nossos governantes, com seus atos transparentes imaculados  que nunca convencem ao cidadão comum e ao povo, agora   têm a palavra. É preciso sair ao público e darem declarações, sim!



Em particular ao Procurador Geral da República na sua função de investigar e ir atrás dos fatos, ele não precisa receber ordens do Presidente da República ou de quem quer que seja para investigar certos casos, mesmo sendo boatos. E sabemos que o caso do Ministro  não é e nunca foi um boato.  A pergunta é, onde começou e onde terminou a investigação sobre o roubo  protagonizado pelo Ministro que hoje continua  se movendo entre os poderes da república, do governo e do Estado?! E na sociedade angolana como um homem livre e sem ser molestado pela justiça.



O caso Quim Ribeiro é só mais um dos casos do BNA que não compreende nem engloba  em nada os múltiplos casos de desvio de verbas que aquela instituição vem sofrendo ao longo dos anos. Os diferentes casos do BNA  se  investigados e concluídos com êxitos deveriam explicar o enriquecimento elícito de várias personalidades no poder; de suas famílias e amigos, e das empresas que surgiram de um dia para outro em que seus donos, da pobreza e da “miséria” em que estavam, de um dia para o  outro, transformaram-se  em milionários. Muitos deles sem prestarem contas  ou declararem o surgimento das imensas  riquezas que hoje dizem ter com esforço próprios. Angola é o único país do mundo em que pessoas pobres –estudantes recém formados-, que  nunca trabalharam conseguem  ser donos de Bancos, fábricas de cimentos, empresas de telecomunicações, tudo isso em pouco menos de cinco anos. Assusta e impressiona como certas pessoas com influência no poder se enriquecem  e na pior das circunstâncias sem currículos e a margem e longe de todo trabalho; o trabalho que é coisa comum para qualquer ser mortal.




O trabalho que sempre foi comum a cidadãos simples e honestos, como os dois Domingos que em conjunto deixaram mais de dezessete filhos, dez de um lado e sete de outro, pacatos cidadãos que acreditavam e confiavam no estado e que precisavam viver para sustentar suas famílias.



Definitivamente nós não engolimos e nem aceitamos que o caso  BNA termine com o julgamento de Quim Ribeiro, um assassino e policial corrupto que deve ser julgado, mas que não é o único a pagar pelos inúmeros desvios que aquela instituição nos últimos trinta anos vem sofrendo. O caso BNA deveria ser aprofundado em intensidade não só horizontal, mas, se quiserem adquirir a confiança do cidadão, em escala e na direção vertical também.