Luanda - A base constitucional para a organização de eleições democráticas em Angola, está consagrada fundamentalmente nos artigos 1º, 2º, 3º, 6º e 107º da Constituição. O artigo primeiro consagra o princípio republicano; os artigos segundo e terceiro, consagram o princípio do estado de direito, o princípio democrático e os princípios da soberania popular, da liberdade eleitoral e da igualdade eleitoral como princípios concretizadores do princípio democrático. O artigo sexto consagra o princípio da supremacia da Constituição e da legalidade; e o artigo centésimo sétimo, estabelece que os processos eleitorais são organizados não por órgãos participados pelo poder Executivo, mas por órgãos de administração eleitoral independentes. 


Fonte: JURA
 
O projecto de lei eleitoral submetido pela UNITA à Assembleia Nacional respeita todos estes princípios. Os projectos apresentados pelo MPLA não respeitam nenhum destes princípios constitucionais.
Administração eleitoral independente.


O artigo 107º estabelece o seguinte: “Os processos eleitorais são organizados por órgãos de administração eleitoral independentes, cuja estrutura, funcionamento, composição e competências são definidos por lei.” O que envolve a expressão “processos eleitorais? O projecto da UNITA densifica este artigo definindo o conteúdo e as fases dos processos eleitorais do seguinte modo: “A organização dos processos eleitorais, incluindo a produção e gestão da cartografia eleitoral, a produção, certificação e distribuição dos cadernos eleitorais, a administração dos actos eleitorais e a apreciação judicial das reclamações e recursos, compete a órgãos de Administração eleitoral independentes do poder Executivo, nos termos do artigo 107º da Constituição.”


O projecto da UNITA estabelece que os órgãos de administração eleitoral independentes do poder Executivo, são o Tribunal Constitucional e a Comissão Nacional Eleitoral e distribui as respectivas competências: “O Tribunal Constitucional aprecia a capacidade eleitoral passiva dos candidatos e a legitimidade das candidaturas, divulga as candidaturas legítimas e conhece os recursos das decisões da Comissão Nacional Eleitoral, nos termos da Constituição e da lei. A Comissão Nacional Eleitoral garante a integridade da cartografia eleitoral, administra a educação cívica e democrática dos eleitores, organiza as eleições, superintende o registo eleitoral e garante a imparcialidade, a transparência e a competitividade dos processos eleitorais, nos termos da Constituição e da presente lei.”


 O MPLA, no seu projecto, consagra a Comissão Nacional Eleitoral, mas retira-lhe competências. Ou seja, as competências eleitorais que determinam o controlo material do processo ficam com o Executivo e aquelas que são mera formalidade é que ficam com a CNE. Por exemplo, o controlo do Ficheiro com o nome e os dados de todos os 8,500,000 de angolanos registados, fica com o Executivo. O controlo da logística eleitoral, fica com o Executivo.


A definição dos locais onde as pessoas irão votar e a selecção das pessoas que irão controlar as mesas de voto, a transmissão dos resultados e as salas do escrutínio, para apurar quem ganhou, fica com o Executivo, assim como fizeram em 2008. A CNE fica só a ver! Isto significa que a proposta do MPLA é transformar em lei a sua conduta eleitoral de 2008, que constituíu violação da lei eleitoral então vigente. Como devem estar recordados, em 2008, as estruturas do Executivo substituiram as estruturas da CNE e controlaram o processo. O MPLA quer legalizar agora os procedimentos que lhe permitiram fazer a fraude de 2008! Se ele conseguir isso, ninguém mais lhe poderá acusar de fazer fraude, porque ele dirá que cumpriu a lei.


A proposta da UNITA atribui à CNE todas as competências inerentes aos processos eleitorais. A proposta do MPLA distribui estas competências entre a CNE e o Executivo. Segundo a proposta da UNITA, quem controla o processo eleitoral é a CNE. Segundo a proposta do MPLA, quem vai controlar o pocesso eleitoral é o titular do poder Executivo, o Presidente José Eduardo dos Santos.

SÍNTESE COMPARATIVA DOS PROJECTOS DE LEGISLAÇÃO ELEITORAL:

  

Além de retirar a organização dos “processos eleitorais” da esfera da administração eleitoral, a proposta do MPLA afronta a Constituição por atribuir à Administração pública competências eleitorais.

 
A proposta do MPLA afronta ainda a Constituição por pretender classificar de “independente” uma administração eleitoral “participada” pelo poder Executivo, cujos membros na sua vasta maioria pertencem ou são controlados pelo Partido/Estado. 

  
Esta violação frontal e descarada do artigo 107º  da Constituição tem um efeito dominó, porque reconduz à violação dos princípios estruturantes da República de Angola, nomeadamente do princípio republicano, do princípio do estado de direito, do princípio democrático, do princípio da soberania popular, do princípio da liberdade e da igualdade eleitoral e dos princípios da supremacia da Constituição e da legalidade.


Sobre a aplicação do princípio da proporcionalidade e do princípio maioritário na composição da Comissão Nacional Eleitoral .


Muitos afirmam que o direito de o Partido MPLA propor uma Comissão Eleitoral em que a maioria dos seus membros pertençam ao Partido/Estado, resulta da observância do princípio da proporcionalidade. Ou seja, como o MPLA tem a maioria no Parlamento, então a composição de todos os órgãos eleitorais deve reflectir proporcionalmente essa maioria.
Esta afirmação não tem fundamento jurídico porque resulta de um entendimento errado do princípio da proporcionalidade.

  
Segundo a doutrina ensinada por todos os doutrinadores, o princípio da proporcionalidade, não é aritmético, é jurídico. Em direito, o princípio da proporcionalidade estabelece que deve haver uma razoável correspondência entre a intensidade da sanção que se pretende aplicar e a ação que se objetiva punir.


Neste sentido, Barbosa Moreira dá-nos a compreensão exata da importância da aplicação do princípio da proporcionalidade:
Cabe verificar se a transgressão se explicava por autêntica necessidade, suficiente para tornar escusável o comportamento da parte, e se esta se manteve nos limites determinados pela necessidade; ou se, contrário, existia a possibilidade de provar a alegação por meios regulares, ou se a infração gerou dano superior ao benefício trazido à instrução do processo. Em suma: averiguar se dos dois males, se escolheu realmente o menor.


É com este sentido que a teoria do estado o considera, já no século XVIII, como máxima suprapositiva, e que ele foi introduzido, no século XIX, no direito administrativo como princípio geral de direito de polícia. Nada tem a ver com a proporcionalidade aritmética a observar na composição de certos órgãos deliberativos. Por isso, não deve ser confundido com o princípio maioritário inerente ao princípio democrático.


Relativamente a observar-se o princípio maioritário na composição da CNE, há que realçar que as maiorias constituídas não orientam a formação dos órgãos constitutivos. A administração eleitoral é um órgão constitutivo, porque é ela que organiza e administra o processo de constituição das maiorias efémeras. Portanto, o princípio maioritário por referência aos poderes constituídos, não pode ser utilizado, porque a Constituição manda estabelecer uma administração eleitoral independende dos poderes constituídos.


A composição da administração eleitoral ou das mesas das assembleias de voto não deve, naturalmente, reflectir a composição dos órgãos electivos resultante de cada eleição. Se assim fosse, cada Partido no poder formaria sempre a sua administração eleitoral “maioritária”, o que comprometeria a sua independência.