Luanda  - A sucessão do presidente José Eduardo dos Santos nas eleições gerais de 2012 é inevitável, politicamente acertada, necessária para permitir a continuidade e a renovação do regime e um passo determinante para a consolidação da jovem democracia angolana. Será mais uma contribuição ao legado que ele deixará, sem sombra de dúvidas, para a afirmação de Angola como um país independente, íntegro, reconciliado, estabilizado e com voz própria no cenário regional, continental e internacional.

 
Fonte: NJ


Ainda há quem, dentro do MPLA, esteja com medo dessa mudança “anunciada”. Trata-se,  sobretudo, de dirigentes e militantes históricos, ligados à luta de libertação nacional, logo, “companheiros de estrada” do presidente, o que torna esse receio perfeitamente compreensível. Entretanto, e mau grado o reconhecimento que nunca será de mais fazer em relação ao papel daqueles que ousaram pegar em armas para combater o colonialismo português, impõe-se lembrar que Angola já tem mais anos de vida como estado independente do que os dezasseis anos de luta de libertação nacional.

 


É preciso entender que o que está em jogo é o regime, o qual, mais do que indivíduos, famílias ou grupos, é um sistema de instituições e de cidadãos mobilizados e organizados em torno de um projecto de nação e de país determinado, com princípios e objectivos pré-definidos. Para resumir com uma expressão, o regime defendido pelo MPLA visa uma nação unida na sua diversidade, reconhecendo e aceitando as diferenças étnicas, raciais, culturais e outras existentes, e um país moderno, próspero e socialmente equilibrado, capaz de afirmar-se externamente de maneira autónoma e soberana. Esse projecto, no qual acreditam milhões de angolanos, está em plena construção.

 


Embora sujeito a erros, como qualquer mortal, José Eduardo dos Santos contribuiu decisivamente para a afirmação e a consolidação do actual regime angolano. Depois de ter participado na luta pela independência, assumiu a presidência em 1979, aos 37 anos de idade, em condições dramáticas. A sua nomeação coincidiu com o período em que uma poderosa conspiração internacional, liderada pela administração Reagan, apostou todas as fichas, inclusive a militar, na destruição do MPLA e na transformação de Angola num satélite do apartheid sul-africano.


Após várias vicissitudes, que seria fastidioso recordar neste espaço, Angola sobreviveu, conquistando a paz e preservando a sua integridade territorial, deu início a uma política de reconciliação quase perfeita e, além disso, começou rapidamente a crescer e a reconstruir-se. Em todas essas etapas, o presidente sempre foi o líder que a situação exigia.

 

Entretanto, nem o relógio biológico de cada um deixa de funcionar nem a História pára. José Eduardo dos Santos fará 70 anos em 2012, altura em que completará 33 anos de poder. Assim, é justo, por um lado, que ele tenha ainda tempo de descansar e de gozar um mais do que merecido “repouso do guerreiro”. Por outro lado, ninguém minimamente atento pode ignorar o actual cenário internacional, que não é, em absoluto, propício ao excessivo prolongamento no poder das lideranças políticas.

 

Em 2012, terão passado dez anos depois do fim da guerra em Angola. O país tem uma nova constituição, que, sendo bastante avançada em matéria de carta de direitos dos cidadãos, é, em termos de sistema de governo, mais adaptada à “maioria sociológica”da nação, o que assegura à partida maior estabilidade institucional. O MPLA é um partido experimentado, com grande capacidade de adaptação e cuja “máquina” não deve ter paralelo em mais parte alguma do mundo. Tudo isso torna correcta, necessária e perfeitamente viável a sucessão do presidente no próximo ano.

 


É mister recordar (sobretudo aos que pensam que o mundo começou depois das “revoluções” no mundo árabe) que José Eduardo dos Santos já tinha anunciado em 2001 que não seria mais candidato do MPLA. Na altura, fui talvez o único “opinion maker” que, em artigo publicado no semanário “Agora”, manifestei a minha confiança nas palavras do presidente, o que estava na contra-corrente das análises dominantes. Hoje, na posse de novas informações, reitero mais uma vez essa confiança.

 


Segundo sei, há duas fórmulas em discussão para levar a cabo a sucessão presidencial. Uma delas, que corresponde às inquietações daqueles que temem os efeitos da saída de José Eduardo dos Santos, prevê que este seja o candidato do MPLA em 2012, devendo, em princípio, renunciar ao cargo dois anos depois, altura em que seria substituído, como reza a constituição, pelo vice-presidente. A outra prevê que, em 2012, o MPLA submeta aos eleitores duas figuras completamente novas para os cargos de presidente e vice-presidente. Em ambos os cenários, José Eduardo dos Santos continuaria à frente do MPLA até 2014.
 


Na minha opinião, a candidatura de José Eduardo dos Santos em 2012 (mesmo, ou sobretudo, “sabendo-se” que dois anos mais tarde ele seria substituído) levanta, desde logo, um risco concreto: o desgaste da sua autoridade administrativa e política. Por outro lado, atrairia inevitavelmente críticas, ataques e até conspirações (principalmente urdidas no exterior). Ou seja, trata-se, segundo acredito firmemente, da solução menos recomendável seja para preservar o legado e a imagem política do presidente seja para permitir a renovação do regime.

 

Como militante e deputado do MPLA, mas também como cidadão, defendo o outro cenário, que implica a saída de José Eduardo dos Santos da chefia do Estado em 2012, continuando como o presidente do MPLA até 2014.