Luanda - Um grupo de jovens anunciou a realização de uma manifestação pacifica, marcada para o próximo dia 24 de Setembro, em Luanda, para exigir a libertação incondicional das vitimas da violência policial do passado dia 3. O acto ira  reunir amigos,  familiares e figuras solidárias com os estudantes detidos.

 

Fonte: Club-k.net

Em solidariedade com as vitimas da repressão policial

O direito a manifestação é previsto na lei constitucional angolana, porem, as autoridades reagem com timidez as mesmas. No inicio do mês, as autoridades deram anuência a uma  manifestação que teve lugar no  dia 3 de Setembro mas que teria ficado manchada com actos de agressão. Alegados agentes infiltrados da segurança angolana, violentaram os manifestantes  e agrediram jornalistas partindo as suas camaradas de filmarr. Em simultâneo circulou que as autoridades pretendiam matar dois manifestantes  no sentido de causar medo.

 

As autoridades foram acusadas de terem forjado um julgamento em que apresentaram os policias como vitima e os agredidos como agressores. Varias organizações dos direitos humanos em Angola e no  exterior  levantaram a voz para criticar o governo.

 

O comportamento das autoridades em  reprimir os jovens foi visto como estratégia para desencorajar possíveis actos de manifestação. No sentido de mostrar que os jovens não se manifestam devido aos problemas sócias, o regime pois a circular informações acusando os jovens de terem sido atiçados pela UNITA, o maior partido da oposição.

 

Para todos os que se interessam pela questão das manifestações espontâneas e relâmpagos, eis o parecer do jurista Rui Ferreira, actual Juiz Presidente do Tribunal Constitucional da República de Angola, emitido em 1996 e publicado no Número 1 da Revista da Ordem dos Advogados de Angola:


«IV

Finalmente, é-me solicitado um parecer sobre se o exercício de manifestação «sem autorização» constitui crime previsto na Lei n.º 16/91 de 11 de Maio.

 

A questão posta nestes termos, está defeituosamente formulada porque, ao contrário do antes demonstrado (cfr. supra, parte III) admite que as manifestações estão sujeitas a prévia autorização. O que está errado.


Mais correcto é assim perguntar se a falta ao aludido «dever legal de informação» constitui crime previsto e punido na Lei 16/91 de 11 de Maio.


Intencionalmente o legislador entendeu por bem não penalizar a falha ao cumprimento daquele dever.


Os comportamentos que aquela lei criminaliza e pune são, tão só:


- O porte de armas em qualquer reunião e manifestação (cfr. art.º 14, n.º 1);


- Os actos que impeçam, tentem impedir e interfiram no livre exercício do direito de reunião e manifestação (cfr. art.º 14.º, n.º 2), ainda que praticados por autoridades públicas e à revelia das disposições e limitações da Lei (cfr. art.º 14.º, n.º 4);


- A realização de manifestações interditas (cfr. art.º 14.º, n.º 3) sendo que como tal só é possível entender: aquelas em que haja participação de indivíduos considerados por interditos de realizarem tais actos, a saber, militares, forças militares e militarizadas (cfr. art.º 1.º, n.º 2);

 

- A nosso ver também aquelas manifestações cuja realização tenha sido proibida (de forma escrita e fundamentada) pela competente autoridade pública nas situações excepcionais previstas na lei (cfr. art.º 7.º, n.º 1).

 

Só estes comportamentos constituem crime previsto e punido na Lei 16/91. A omissão (propositada ou despropositada) ao cumprimento do dever de comunicação da realização de manifestação não é de per se criminalizada e punida pela letra da lei.


Dissemos atrás que essa foi intencionalmente a escolha do legislador. Essa omissão (ela em si) não foi criminalizada sobretudo por três ordens de factores:

 

- Em primeiro lugar porque, em abstracto, dessa omissão não pareceu resultar a afectação teorética de outros direitos ou bens constitucionais de igual ou mais valia;

 

- Em segundo lugar, porque tal comunicação não é elemento constitutivo do direito constitucional à liberdade de manifestação;


- Em terceiro, porque o exercício desse direito não depende, não está vinculado, a prévia autorização de autoridades estaduais.

 

Admitir tanto a exigência de prévia autorização como criminalização da falta de comunicação seria um contrasenso dogmático e jurídico face às opções de fundo do nosso legislador constituinte em matéria de alcance, regime e garantias dos direitos fundamentais individuais plasmados na Lei Constitucional.

 

Assim e por força do princípio nullum crimen sine lege não é de ter-se como crime a falta ao c[u]mprimento do dever de comunicação da realização da manifestação.


Essa falha constitui de facto uma omissão que viola a lei. Porém para o nosso legislador não decorrem daí consequências penais. A não ser assim não teriam cobertura legal formas típicas de exercício do direito de manifestação, nomeadamente as manifestações públicas espontâneas e relâmpagos tão usuais entre nós.


A única sanção penal que é possível fazer decorrer das manifestações que não tenham sido previamente comunicadas resulta do art. 14.º, n.º 5: os seus organizadores e participantes responderem pelos «abusos» que sejam cometidos durante ou por causa da manifestação, desde que tais abusos configurem autonomamente elementos constitutivos de tipos legais de crimes ou, nos termos gerais, façam incorrer em responsabilidade civil.


Porém, a punição civil e criminal destes ditos «abusos» não é específica das manifestações sem prévia comunicação. Ela é extensível aos abusos cometidos em toda a sorte de reuniões e manifestações (cfr. art.º 14.º, n.º 5).

 

Concluindo: não é necessária autorização prévia para o exercício do direito de manifestação; é necessária «prévia comunicação» para a realização de manifestações; a lei 16/94 [lei 16/91] não criminaliza a falta ao cumprimento desse dever pelo que ela não pode ser tida como crime à luz dos padrões de valores que informam o nosso ordenamento jurídico-constitucional e penal. […]». Reproduzimos apenas a parte atinente às manifestações espontâneas e relâmpagos, contida nas pp. 234-236.