Os desequilíbrios entre as áreas urbanas e as rurais não devem também ser esquecidos, bem como entre o litoral e o interior.  O nosso País é enorme e heterogéneo, tanto em termos de necessidades e expectativas, como no que se refere às potencialidades e riquezas.  Por conseguinte, espera-se dos partidos políticos concorrentes às eleições que “pensem” Angola na sua globalidade e conheçam as especificidades da sua diversidade.

Esta relação entre o global e o específico ─ quer em termos culturais e sociais, quer  em termos de geografia, de história, e de disparidade de riqueza e desenvolvimento ─ devia ter sido discutida (como provavelmente foi), antes da finalização dos programas eleitorais, com os segmentos mais representativos da sociedade Angolana , incluindo a diáspora e os investidores.  Só assim podem os partidos políticos apresentar, em consciência, as suas prioridades ─ baseadas, portanto, nas expectativas e/ou necessidades das populações a todos os níveis ─, e o modelo de desenvolvimento socioeconómico preconizado para a Angola do futuro.  Destes dois vectores sairão os grandes desafios para a legislatura.

Para além do conteúdo das prioridades e dos desafios, o eleitorado tem o direito de saber: o porquê de cada medida e qual a alternativa; como, quando e onde vai ser implementada; quais os segmentos da população que irão beneficiar, como e porquê; a análise custo-benefício para o país e/ou região e/ou sector; e o custo total do programa eleitoral ─ para que os Angolanos acreditem que é possível alcançar os objectivos de cada proposta eleitoral.  E mesmo assim, provavelmente, todos prometerão as “mesmas coisas”.  No final, o que é, de facto, importante para os Angolanos decidirem por quem votar é a qualidade da liderança e o grau de eficácia e transparência que impõe à governação, bem como os quadros com quem irá realizar a transformação da sociedade e da economia angolanas.

Depois de tudo isto, o partido que formar governo, como resultado das eleições de 5 de Setembro, deverá ter o apoio dos Angolanos, no que diz respeito pelo menos às grandes decisões de interesse nacional, para se construir um País que passe rapidamente da erradicação da pobreza e da criação maciça de empregos para um desenvolvimento sustentado “amigo” do ambiente e intensivo em ciência, tecnologia e inovação.  Um País onde todos se possam sentir parte integrante de uma sociedade solidária e de uma economia criativa, sólida, diversificada e equilibrada.

Assim, quaisquer que sejam as prioridades do Governo eleito democraticamente, os principais desafios que se colocam futuramente a Angola não devem desviar-se muito dos vectores essenciais para a concretização da visão estratégica global para o País.  Entre eles estão:

1. A reforma abrangente e simultânea do Estado a nível central, provincial e comunitário, incluindo o desenvolvimento institucional e o infra-estrutural.

2. Manter a tendência dos fundamentais macroeconómicos, conseguindo adicionalmente equilibrar a eficiência económica com a justiça social.

3. Maior investimento na agricultura, na investigação agrícola, no acesso a novas tecnologias, no melhoramento das infra-estruturas (de saneamento, de transporte, armazenamento e comunicações) e num bom e diversificado sistema de crédito e comercialização.

4. Investir maciçamente no avanço contínuo e firme em direcção à concretização das metas dos 8 objectivos de desenvolvimento do milénio, nomeadamente: na erradicação da pobreza extrema e da fome; na melhor qualidade e no mais fácil acesso aos sistemas de educação e saúde; no combate ao HIV/sida, à tuberculose, à malária e outras doenças endémicas; na redução da mortalidade infantil e de crianças; no melhoramento da saúde materna; e na promoção da igualdade de género e na capacitação das mulheres.

5. Redução drástica da pobreza e exclusão social e melhoria do acesso das populações aos serviços básicos; formação profissional acelerada e promoção de competências (empowerment) aos mais vulneráveis.

6. Melhorar significativamente o fornecimento de água potável e de saneamento; garantir a segurança alimentar e a energética; desenvolver fontes energéticas alternativas e as TIC (tecnologias de informação e comunicação); prevenir ─ e encontrar soluções para ─ as alterações climáticas e a globalização, e reforçar a segurança a todos os níveis.

7. Diversificar e flexibilizar a economia, desenvolvendo continuamente o sector privado, em particular os sectores não-extractivos.

8. Criar um ambiente propício (que ainda não existe de uma forma transversal) à atracção do investimento
produtivo nacional, africano e estrangeiro ─ em sectores fora das áreas dos hidrocarbonetos e diamantes.

9. Criação acelerada de emprego através: do apoio ao fortalecimento do empreendedorismo; da promoção de micro, pequenas e médias empresas; do acesso  mais  fácil  e  generalizado   ao   crédito, micro-crédito e a outros activos-chave; da maior clarificação no que se refere à posse da terra e ao direito de propriedade; da reintegração social e económica; da reciclagem e alfabetização contínua dos desempregados estruturais; de investimentos públicos em infra-estruturas intensivas em mão-de-obra de rápida qualificação; e de programas efectivos de privatizações e de descentralização (em particular, do poder e dos recursos).

10. Dotar a economia e a sociedade de regras (códigos) claras e atraentes, e com objectivos inclusivos e viáveis ─ que possam premiar o trabalho, a ética, a determinação, o risco e a inovação.

11. Criar mecanismos e instituições que fomentem não só uma distribuição mais equilibrada dos rendimentos e das oportunidades, mas também que as riquezas derivadas da exploração dos enormes recursos beneficiem directamente as populações e as regiões.  Promover centros de excelência (fomentando a sociedade de conhecimento) em várias áreas, segundo a nossa vantagem comparativa.

12. Definir os desígnios de Angola como Nação, incluindo o papel do nosso País nas várias instituições africanas e internacionais e o relacionamento com os parceiros (novos e antigos) comerciais e para o desenvolvimento.

Parafraseando um escritor brasileiro “o mundo está nas mãos daqueles que possuem a coragem de sonhar e de correr o risco de viver os seus sonhos”.  Vamos ter a coragem de viver em 5 de Setembro o nosso sonho de uma Angola mais justa, mais livre, mais respeitadora dos direitos humanos, mais solidária, mais inclusiva e mais próspera.  Tenhamos a coragem de decidir como termina o nosso sonho.
Que Deus proteja Angola e os Angolanos.

*Fátima Moura Roque,Angolana, Professora de Economia
Doutorada em Econometria e em Economia Internacional
Fonte: F8/Club-k.net