“É uma questão de sobrevivência, de melhores oportunidades e, afinal, de angolanidade”, dizem, em síntese, os que mudam de barricada.

Oficialmente, a Direcção da UNITA ou está calada ou cala-se sobre a acelerada perda de importância junto de uma comunidade que no estrangeiro, sobretudo em Portugal, lhe foi favorável durante os anos mais difíceis da sua subsistência política.

De forma oficiosa, o partido de Isaías Samakuva afirma que o Poder (leia-se o MPLA) está a comprar os seus militantes ou simpatizantes, não assumindo sequer a sua quota parte de responsabilidade.

Ao NL, um oficial superior do Galo Negro que mudou de partido conjuntamente com outros apoiantes de relevo dispersos pela diáspora, garante que o seu ex-partido “foi comido” e que, “para além de se esquecer dos seus quadros que estão no interior, já não tem a capacidade de mobilização de outros tempos, limitando-se a ver passar a caravana”.

Além disso, acrescenta, “o MPLA oferece-nos o que a UNITA nunca nos deu depois da rendição: comida e trabalho”.

O argumento para os muitos cidadãos que em Portugal labutam, mas que têm Angola no coração e a UNITA na alma, é diferente. Quase todos acusam o Galo Negro de se ter esquecido do muito que deram ao partido.

Carlos Sommer, um médico nascido no Huambo mas formado em Lisboa onde se encontra desde 1977, e que recentemente aderiu ao MPLA, afirmou ao NL que a sua filiação reflecte “de facto de um acto de compra e um acto consciente venda”. Pergunta, contudo, “mas o que é que isso interessa”?

“Por um lado a Direcção da UNITA mantém-se alheia aos problemas dos homens que durante décadas deram tudo, muitos a própria vida, por uma causa que entendiam justa. Por outro, o MPLA bloqueia-nos todas as saídas, aponta-nos a dedo e encosta-nos à parede utilizando todos os métodos possíveis e imaginários”, diz um ex-militar da UNITA, Paulo Santos, hoje empresário internacional de sucesso, acrescentando que “por uma questão de sobrevivência, de futuro, de expansão negocial, é imperioso passar para o outro lado, deixando o idealismo à sombra da mangueira”.

Aristides Lopes, engenheiro, salienta que “não se trata de esquecer os princípios ensinados pelo Mais Velho (Jonas Savimbi) mas, apenas, ter a consciência de que a filiação no MPLA abre muitas portas e de que a permanência na UNITA não leva a lugar nenhum”.

“A minha filha, que é licenciada, concorreu para um banco português com fortes ligações a Angola. Foi-lhe dito que teria meio caminho andado para integrar o banco se eu abandonasse as críticas que faço ao MPLA”, recorda Aristides Lopes, acrescentando que “não cedeu” porque, “ao contrário de muto boa gente, tem meios de subsistência que lhe dão a independência para dizer não”.

Quanto ao povo afecto à UNITA, o jornalista Ricardo Cunha corrobora o que diz ser um ensinamento de Jonas Savimbi: “quando se tem a barriga vazia aceita-se qualquer coisa, pouco importando quem a dá”. Isso significa, acrescenta, que “o MPLA tem consciência que é pela barriga que vai conquistar muitos votos, mesmo daqueles que não estão filiados”.

“A UNITA sabe o que se passa, mas nada faz para inverter a situação, até porque os seus principais dirigentes o que querem é continuar a viver à grande e à francesa”, opina Adelino Rodrigues, empresário que trabalha com Angola há uns largos anos.

Por alguma razão, em Setembro de 2004, um ex-oficial da UNITA dizia ao NL que, “ao contrário do que alguns ainda temem, está fora de questão o regresso às armas, mesmo que seja para roubar comida”. E porquê? “Porque para ter o estritamente essencial já não é preciso puxar o gatilho... basta assinar a filiação no MPLA”.

* Norberto Hossi / Lourdes Nascimento
Fonte: NL