Luanda  -  Tenho tido, de quando em vez, privadamente ou nas redes sociais, alguns debates interessantes com alguns amigos pertencentes ao MPLA, que talvez fosse útil, um dia, reproduzir, em especial diante dos angolanos mais jovens, abertamente e sem quaisquer compromissos partidários de parte a parte.


Fonte: Facebook


Alguns desses amigos queixam-se por, supostamente, eu insistir em criticar o MPLA “pelo seu passado” e não por aquilo que ele representa hoje. Acontece que, independentemente da boa vontade de alguns membros do (ainda) maior partido da situação, a verdade é que o MPLA não se consegue libertar do seu passado e do seu presidente e reproduz todos os dias, no presente. É por isso que ele não tem capacidade para governar Angola.

 

A atitude do MPLA na última secção plenária da Assembleia Nacional no momento em que ia começar o debate sobre um conjunto de leis eleitorais, demonstra mais uma vez a incapacidade a que me referi no parágrafo anterior. Insistindo na estratégia de violar sistemática a CRA, o MPLA está não apenas a banalizar a CRA, mas também a confirmar que não tem condições para ser uma governação credível para o país.


O argumento do MPLA para justificar a suposta legalidade, em relação à nomeação pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) da presidente da Comissão Nacional Eleitoral Independente (CNEI) - não passa de um pretexto. Se não fosse esse, seria outro. Se não, vejamos.


Caso o MPLA estivesse de facto interessada na legalidade, tinha duas vias: requerer ao Tribunal Supremo que verificasse a legalidade do acto do Conselho Superior da Magistratura, intentando, pois, uma acção principal; ou então pedir ao plenário da Assembleia Nacional que procedesse à interpretação da alínea a) do número 1 do artigo 143º da Lei Orgânica das Eleições Gerais (composição da CNEI).


Na verdade, e ao contrário do que juram até jornalistas reputados da nossa praça (eles terão lido mal a lei?), aquele dispositivo a afirma (repito: afirma) expressamente que só pode presidir à CNEI um magistrado judicial “em efectividade de funções”. Por isso, alguns juristas alegam que, por exemplo, um magistrado jubilado não pode ser nomeado para esse cargo, enquanto outros afirmam que não pode sê-lo alguém que já tenha exercido as funções de juiz no passado, como é o caso de Suzana Inglês.


Acrescente-se ainda que, no momento do concurso para presidente da CNEI, Suzana Inglês não estava a exercer funções de juiz, mas estava a exercer advocacia, contrariamente ao que insiste o MPLA radical: ela era presidente cessante da antiga Comissão Nacional Eleitoral. Segundo sei, inclusive, ela terá solicitado ao CSMG a sua reintegração no quadro de juízes, precisamente para poder concorrer para dirigir a CNEI.


Como vimos acima, o sistema democrático angolano prevê instituições e formas para resolver esse tipo de dúvidas jurídicas (o Supremo ou o plenário da Assembleia Estudantes Angolanos Na Diasporacional), mas o MPLA recusou-se a usá-las. Ao invés disso, tenta suspender todos os actos preparatórios das eleições. Com isso, pretendeu atingir um interesse público fundamental, neste momento: a realização de eleições nas datas previstas.


A conclusão é só uma: o MPLA não quer eleições em Setembro deste ano. Naturalmente, só esse partido sabe das suas motivações, mas permito-me deixar no ar duas perguntas: será que a estratégia do MPLA visa apenas obter certas vantagens (leia-se: materiais)? Terá ele receio de ver a sua bancada reduzir-se em Setembro deste ano?


Mais uma vez, o MPLA está a cometer um erro de avaliação que lhe pode ser fatal, pensando ter uma força que não tem. Se em 1993, o MPLA ficaram reféns da estratégia do presidente (tomar o poder pela força), não será agora, em 2012, que hão-de ficar. Se o MPLA quiser fraudulentar as eleições, corre o risco de se fragmentar ainda mais internamente e de perder o estatuto de maior força política do país.


Não será nenhum drama se isso acontecer. O país pode, inclusive, ficar melhor. Há muito que eu digo que o nosso país, como qualquer outro, precisa de um governos forte, credível e moderno, mas, na minha opinião, o MPLA não tem nem perfil nem capacidade para representar esse papel. Angola carece de um governo à altura da maturidade, do espírito de abertura, da generosidade, da independência e do anseio de modernização do seu povo e não de um MPLA que repita monocordicamente as mesmas críticas de sempre, que veja fantasmas onde eles não existem e que seja incapaz de ultrapassar os traumas e os ressentimentos do passado.


Aos que ainda têm dúvidas de que o MPLA não merece, peço que reflictam no significado da tentativa de branqueamento da imagem de José Eduardo dos Santos por parte desse partido. O projecto político do MPLA é esse. Se, hipoteticamente, ele fosse implantado, Angola recuaria até aos anos 50 do século passado ou mais atrás ainda.