Luanda - Senhor Queiroz, eu sempre acompanhei com muito interesse os seus escritos no Jornal de Angola. Mas, a partir do momento que li os Subsídios para o breve reinado de Mandumbe, publicados no Jornal de Angola do dia 18 de Maio de 2010, comecei a desconfiar que muitos temas da sua autoria carecem de veracidade, tal como os seus subsídios que resultaram ser graves ofensas contra o Rei Mandume e os kwanyamas.
Fonte: Club-k.net
Assessor de Ribeiro em problemas de tribo
O senhor começa os seus insultos, dizendo: À volta da figura de Mandume circulam lendas e estórias mais ou menos fantasiosas. Os alemães, com quem Mandume conviveu e de quem foi fiel aliado, pouco ou nada relatam sobre a sua figura. Os militares portugueses, sim, têm muitas referências ao rei do Cuanhama. Mas, curiosamente não descrevem uma única batalha travada contra ele.
Essas afirmações demonstram, claramente, que desconhece os factos históricos em volta do reinado do rei Mandume e das lutas dos ovambos contra os invasores portugueses. Os portugueses têm muita informação classificada sobre as suas guerras de ocupação. Isso pode estar na origem de tanta desinformação contida nas suas patranhas.
É notório nos seus subsídios que, para além das memórias do major Artur Moraes, não leu memória de outro oficial invasor português e muito menos consultou fonte não europeia. Se o fizesse, seguramente, teria evitado o ridículo e poupado tempo para outras coisas. Saiba que, o que leu nas memórias do invasor Moraes são mentiras dum oficial cobarde e aldrabão. Pura desinformação, diversionismo infantil e propaganda barata.
O senhor tem muito em comum com o senhor Moraes. Desconfio que chama-se Artur em honra ao invasor Artur Moraes. Além do nome Artur, têm também a facilidade de inventar lendas.
Mandume, Rei dos Kwanyamas.
O Prof. José Carlos de Oliveira, na Revista Militar Portuguesa de 22 de Setembro de 2011, falando de Mandume, diz: desde muito jovem foi iniciado pelos mais experimentados lengas nos primeiros passos para reconhecer os elementares sinais da cultura guerreira.
A tradição oral dos kwanyamas afirma que Mandume foi preparado desde tenra idade por Nekoto iaMwaeshange, irmã da sua avó materna e rainha de Onguma-Oiheke. Participaram, igualmente na sua formação o tio materno Kapa kaShikende e o grande lenga Haufiku waKasheeta. Academicamente, foi preparado pelo Dr. Adolf Wulfhorst, pastor evangélico alemão. Na biografia do general Mateus da Gama, Mandume é descrito como o um guerreiro, na verdadeira acepção da palavra, altivo e musculado, instruído nas missões protestantes alemãs, (dominava o alemão e o português), e em combate revelava-se um grande estratega militar à altura do seu adversário General Pereira d´Eça.
Batalha de Omongwa.
Nos seus subsídios, o senhor Queiroz afirma com muita verdade que os portugueses tentavam desesperadamente ocupar os vastos territórios a Sul do rio Cunene mas as sucessivas colunas militares foram derrotadas e tiveram de recuar para o Humbe, a praça-forte das tropas de ocupação.
Infelizmente, o senhor Queiroz omite o autor das derrotas das sucessivas colunas militares portuguesas.
É conhecido por todos que essas colunas foram esmagadas pelos kwanyamas. Essas humilhantes derrotas levaram a Roçadas, comandante máximo dos portugueses no baixo Cunene a fazer um informe da situação catastrófica dos portugueses no Oukwanyama. Esse informe motivou a vinda urgente de Moçambique do Pereira de Ença. Esse oficial, ao chegar a Angola foi investido como Governador-geral de Angola e chefe Supremo das forças armadas portuguesas em Angola. E, também, deram-lhe todos os recursos para combater a Mandume.
No Memorias e Raízes: Em memória a uma amizade incomum: se afirma que previa-se forte resistência dessas populações sublevadas, sobretudo a Cuanhama, a tribo mais aguerrida de quantas havia em confronto, comandada pelo grande soba Mandume.
Pereira de Ença não perdeu tempo, organizou tudo e no princípio de Agosto de 1915 as suas forças começaram a chocar contra os kwanyamas nos arredores de Omongwa.
Na História de Portugal, Guerra em Angola, os oficiais portugueses descrevem a seguinte história: Do interrogatório feito a um prisioneiro e a doze indígenas que voluntariamente se apresentaram, fomos levados a concluir que nos combates dos dias 18 e 19 fôramos apenas atacados por uma parte das forças inimigas, sob o comando do «lenga» Calola, tendo como imediatos 9 «lengas»; e no combate do dia 20, sob o comando superior do «soba» Mandume, entraram em acção os guerreiros de 33 «lengas».
Ainda afirmam que pela vivacidade do combate e precisão de tiro não dava dúvidas a ninguém que era o próprio Mandume, rei dos kwanyamas que estava a comandar. Se afirma, ainda, que no dia 19 a meio da noite deu-se o alarme. E, logo de manhã, a face da frente teve de repelir um ataque, que se estendeu para a esquerda, com tentativas improfícuas de envolvimento sobre a retaguarda. O fogo manteve-se vivo durante duas horas e, sempre que este afrouxava, ouviam-se claramente os cânticos de guerra do gentio.
Os kwanyamas afirmam que a chegada do rei a um local era sempre saudada com grandes cânticos. Os cânticos daquele dia estavam a celebrar a chegada do rei Mandume ao epicentro dos combates.
A mesma fonte agrega, ainda que o Destacamento português do Cuanhama, que sofrera perdas sensíveis, quer nos três combates da Môngua, quer durante as marchas realizadas após a transposição do Cunene, ficara sem condições de continuar o seu avanço sobre a N'Giva. A batalha de Omôngua é a maior e a mais mortífera batalha para os portugueses ao longo de toda suas aventuras de ocupação em África e talvez em toda sua história. É descrita como a Batalha das batalhas.
O comandante kwanyama dessa batalha foi Mandume ya Ndemufayo. Combates de Oihole.
Quando Mandume se retirou de Ondjiva foi instalar-se em Oihole. Dali enviava pequenos grupos de guerrilha que com grande sucesso abatiam os invasores em todo Oukwanyama.
No dia 30 de Outubro de 1916, os portugueses lançaram uma grande operação, comandada por Raul Andrade, com forças entre 5 e 7 mil homens para duma vez por todas submeter a Mandume. Essa ofensiva foi atraída por uma cilada dos kwanyamas e foi totalmente esmagada. Dali saiu um ditado ainda muito popular em Oukwanyama que reza: Quem tem dúvidas, vá a lavra de Luli. Na lavra de Luli é donde estavam estendidos os cadáveres de portugueses, Raul Andrade incluído.
Se destacaram nesse combate os destemidos comandantes: Kalola Shihetekela, Shikololo, Hamukoto Kapa, Naholo Haivinga, Hangula Kangudu, Haufiku Kasheeta e Nehova wa Walaula.
Nessa batalha o saldo para os portugueses foi pior que do Vau do Pembe.
O comandante máximo kwanyama dessa batalha foi Mandume ya Ndemufayo.
Batalha do Pembe
O senhor Queiroz, ainda afirma: Um ano antes da derrota do “Kaiser”, o último rei dos Cuanhamas pôs fim à vida. Mas ao contrário das lendas que ainda hoje circulam, ele nunca teve um grande combate com os portugueses. Essa glória cabe inteira ao rei do Cuamato Grande que infringiu às tropas portuguesas a sua maior derrota de sempre. Há quem atribua a Mandume a batalha de Pembe, mas é uma falsidade histórica. Quando aconteceu esse combate, Mandume era um menino e ainda nem sequer sonhava ser rei.
É indubitável que o rei do Kwamatui teve uma participação activa nessa batalha, mas é muito grave desconhecer que no baixo-Cunene não houve batalhas serias sem a participação dos kwanyamas.
No dia 25 de Setembro de 1904, os portugueses ao tentarem atravessar o rio Kunene, caíram numa emboscada dos ovambos (Kwamatuis e kwanyamas) donde foram totalmente esmagados. Os comandantes mais destacados dessa batalha foram Kalola kaShihetekela e Mwatilefu ya Hautoni, distintos comandantes kwanyamas sob as ordens do rei Nande ya heidimbi. Muitas armas recuperadas nesse combate foram encontradas a arderem no palácio do rei Mandume em Setembro de 1915.
Mandume, filho distinto de África, foi o único rei em África que enfrentou um general. O General que enfrentou a Mandume, Pereira de Ença, na sua biografia fez a seguinte referência: Vou terminar, como é de justiça, fazendo também o elogio do adversário, cuja bravura foi inexcedível. Atacar três dias seguidos que no último combate, que durou dez horas, a uma distância que chegou a ser de cinquenta metros, revela um moral e uma instrução de tiro e de aproveitamento de abrigos que fariam honra às melhores tropas brancas. Esse adversário teve quem o armasse e instruísse, bem o sei, mas só com uma tempera verdadeiramente guerreira, entregue a si próprio, se manteria como se manteve até à Môngua, onde a nossa ofensiva quase que só se pôde efectuar no campo estratégico, pertencendo ao inimigo a do campo táctico.
Senhor Queiroz, os dados que atestam a participação directa de Mandume nos combates pela defesa do seu território são muitos e irrefutáveis e, também, os que enfrentaram e estudaram a história de Mandume conhecem e reconhecem a bravura de Mandume. Então, quem é o senhor para dizer o contrário?
Se o texto que o senhor escreveu foi encomendado lhe recordo que há um ditado que diz: Roma paga os traidores e mercenários, mas sempre os despreza.